O alvorecer de um Sol antes já visto

O céu ainda permanecia amarelado naquele cotidiano dia de Marte.

Uma leve e sutil batida na porta, deu fim aos pensamentos egocêntricos de Marcelo Slaparta. Como homem de bons modos solicitou que o enviado se sentisse na permissão de adentrar a sala. A porta foi aberta e por ela veio um corpo celeste jovem com aparência de seus 25 talvez 28 anos, embora sua idade aparente não se assemelhasse ao real. Era óbvio que pelo modo seguro e sério com que se portava deveria ser um Anjo com mais de 200 anos, no mínimo; afinal nenhum jovem seria corajoso o suficiente para dar entrada naquele castelo. Momentos passaram e logo, quando Marcelo soube que o mesmo trazia uma mensagem do Conselho viu então que era hora de se portar com mais subserviência.

- Ilustríssimo Magistrati, qual o motivo de sua tão honrosa visita ao meu Castelo? Indagou Marcelo com medo do objetivo da mensagem ser uma reclamação de suas jogadas de xadrez celestial com os anjos mais jovens.

- Meu caro Bispae, Marcelo Slaparta. Trouxe-lhe uma encomenda em nome do Conselho o qual solicita sua intervenção nas atividades do Pater Maurício Castro responsável por uma vila dentro de sua paróquia. Maurício está guiando um grupo de corpos celestes de modo errôneo de acordo com os olhos do Conselho. O grupo de cinco jovens os quais estão a quinze anos sendo treinados desde seu último recall deverão ir o mais rápido possível a Terra para sua primeira missão de busca. Busca a um item da Cidade de Prata.

- E como posso ajudar o Conselho, Ilustríssimo? Recitava suas palavras como uma gilete em sua garganta, ao saber que mais uma vez iria ter que se encontrar pessoalmente com criaturas que a pouco passavam seus dias dormindo e se alimentando.

- Irá levá-los ao Centro de Invólucros de Santa Maria, aonde irá orientá-los dos procedimentos padrões no estado do Rio Grande do Norte sob domínio do Principado Mário Villa Nova.

Escutando essas palavras como apenas mais um motivo de desviar suas atividades de praxe Marcelo acena com a cabeça indagando um sim enquanto um não ronda pela ponta de sua língua afiada e perigosa. Infelizmente e graças a Deus, as palavras não chegaram a ferir nem o ego do anjo a sua frente. Terminado o assunto, movimentos e símbolos corteses fazem à saída do Magistrati que com a mesma seriedade do início bate a porta como se esse fosse apenas o primeiro das centenas de avisos que ele deveria informar aos outros 101 bispaes que estavam sobre sua orientação e jurisdição. Vendo que não havia modo de desviar as ordens do conselho e temente as suas últimas ações Marcelo chega à conclusão que não há nada melhor do que uma boa ação para amansar olhos que a tempos estão a procura de pequenas falhas em seus minúsculos passos calculistas. Em um mundo onde poucos falecem, os cargos são visados por todos que anseiam um modo de possuí-los. Com certeza conquistar 101 paters para se eleger a Bispae foi uma tarefa difícil para Marcelo. Porém mais difícil ainda, seria conseguir novamente sua amizade após parte deles descobrirem que não são nada mais do que peões nos jogos de Marcelo Slaparta.

Retirando-se do seu Castelo ele se dirigiu a vila por onde encontrou um homem velho, talvez tenha falecido aos seus 45, 50 anos, haja vista seus cabelos brancos e barba falha. Era Maurício Castro passou por sua cabeça, uma vez que já fazia dois ou três anos que os mesmos não precisavam de seus nomes ou mesmo reconhecer faces para encaminhar documentos.

- Maurício, creio eu. Indagou irônico, Marcelo.

- Grande irmão, Marcelo Slaparta, meu Bispae mais querido, com tom de bajulação. Estilo de Maurício Castro, o típico anjo bonzinho que faz de tudo, até se humilhar para conseguir algo que faça os outros chamarem-no por outra nomenclatura diferente de seu nome.

- Como vai à correria cotidiana de um Bispae ocupado? Continuou Maurício.

- Pena por pena, meu Irmão. Escapando um suspiro de cansaço após essas breves palavras.

- Venho aqui a pedido do Conselho, parar intervir na tutela de cinco jovens meu amigo. Os respectivos nomes confesso que fogem de minha mente nesse momento, mas o próprio Magistrati Carlos de Florença, informou-me que era de vosso conhecimento. Jovens que há quinze anos estão treinando para uma missão na Terra em busca de um item da Cidade de Prata.

- E para os olhos do Conselho, não tenho realizado um trabalho bem feito? Não acho justo tomar minha tutela meu senhor. Falava Maurício, com ar de revolta, vendo que estaria jogando fora os quinze anos de treinamento para que outro tivesse o nome de tutor daqueles jovens repletos de potencial.

- Infelizmente meu irmão, não há modo de contornar as ordens do Conselho. Leve os cinco agora ao meu Castelo e não quero atrasos. Desloquei-me até aqui para poder dar-lhe a notícia e não irei tolerar comentários em relação às atitudes do Conselho.

Marcelo precisava se impor. Desse modo estaria colocando a culpa no Conselho e continuaria sendo o Bispae bonzinho que ajuda todos assim que pode. Após alguns segundos, um suspiro, um olhar cabisbaixo e algumas palavras em tom baixo saíram da boca entreaberta de Maurício.

- Sim meu senhor. Os encaminharei o mais rápido possível, não se preocupe. Perdão pela minha má ação, talvez o pecado do egoísmo ou o fato de ter todos os olhos voltados para mim tenha subido a minha cabeça. Retorne ao teu esplêndido Castelo e em pouco tempo os jovens estarão lá.

Cerca de duas horas depois os cinco jovens chegaram ao Castelo de Marcelo Slaparta, onde foram recepcionados por um dos anjos que ali estavam. Foram levados ao Centro de Invólucros de Santa Maria, onde se encontraram com Marcelo. Ele já estava com toda documentação pronta aos Corpores locais. Era preciso dados importantes como momento exato de ida e volta para que o Centro de Invólucros permitissem a viagem para outro plano por um anjo da Cidade de Prata. Mesmo ordens do próprio Conselho mal estruturadas terminavam em passagens canceladas. O próprio Conselho era severo com qualquer atividade ilegal dentro da Cidade de Prata, mesmo que de início fosse arquitetada por um próprio membro do Conselho. Pouco tempo após foi possível ver a entrada dos cinco jovens em cinco caixotes, semelhantes aos sarcófagos Egípcios, com a diferença dos desenhos malucos os quais não existiam. Sentindo-se livre da preocupação, Marcelo Slaparta comunicou-se com Maurício Villa Nova, Principado no estado do Rio Grande do Norte para orientar os jovens. Realmente o limite de sua tolerância com jovens estava no limite e agora Marcelo precisava dar uma desopilada. Estava exausto apesar do pouco esforço, mas para ele o fato de se comunicar por pouco tempo com criaturas juvenis era o suficiente para deixá-lo irritadíssimo ou mesmo nervoso perante membros mais antigos.