3 - O Principe dos Sonhos

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Sandra sentiu uma forte dor na articulação do seu antebraço, como se fosse explodir de dentro para fora em mil jatos de sangue. Ainda sentiu o gosto amargo e espesso de sangue molhando a língua, os dentes e o céu da boca, brotando do fundo de sua garganta. Tossiu, tentando por para fora, mas havia desmaiado. Tudo estava escuro.

Na escuridão, ela escuta uma melodia dedilhada em um instrumento de corda. Move a cabeça procurando o tocador. Nada, além da escuridão. Ela gritou:

- Quem está ai?

Nenhuma resposta. Sentiu-se caindo em algo mole como uma gelatina. Deixou-se cair todo o corpo. Fechou os olhos, escutando a doce melodia. Horas se passam, até que uma luz amarela e fraca ilumina aos poucos o lugar que estava. Arqueia o tronco, olhando em volta. Estava em cima de uma montanha. O chão tornou-se duro e áspero de repente. Plano, de seis por doze metros. Num canto, uma caverna sombria, onde se emitia sons estranhos e teias de aranha enfeitando o teto. O céu era cinza e no horizonte alguns trovões ressurgiam como pesadelos distantes. Ela se levantou, afastando os cabelos loiros do rosto que balançavam loucamente pela fúria do vento da montanha. Olhou para os braços. Nenhuma marca. Nenhuma marca de picada de heroína ou das cicatrizes que ela mesma fazia. Dá um giro em torno de si mesma, observando com interesse o mundo ao seu redor. Então este é o inferno da Bíblia? Depois de tudo o que fiz, só posso estar nele.

- Não. Você não está no inferno.

A voz havia surgido na mesma hora que soou o trovão lá no horizonte, iluminando de raios azuis as nuvens marrons escuras como um enxame de abelha movendo-se lentamente lá longe. Ela se virou de onde tinha vindo a voz. Um homem alto e magro, vestido com uma manta negra com detalhes tribais azuis. Seus olhos escuros eram duas fendas delgadas no rosto, como olhos de serpente. Seu cabelo era oleoso, preto e penteado para trás.

Ela se espantara. Deu passos para trás, apavorada, e tropeçou numa pedra e caiu de bunda no chão. Continuou se afastando daquela criatura que aparecera de repente, como um fantasma.

- Não tema, minha jovem. – ele sorriu, tentando parecer simpático. – meu nome é Sandman, o primeiro senhor dos sonhos.

- Senhor dos sonhos? Que conversa é essa? – disse Sandra, aparvalhada. – onde está o limbo, as almas condenadas, ou os anjos do céu com suas trombetas. Que merda de lugar é esse e que merda é você?!

Sandman sorriu, sem jeito com as palavras rápidas e duras dela. Olhou ao redor e deu alguns passos em direção a ela.

- Você não está no inferno, ou mesmo no paraíso. Não sei se essas duas coisas existem. Mas você está em você mesmo. Você está sonhando, Sandra.

- Sonhando?

- Sim. Você deixou uma vida muito tumultuada e turbulenta, estava literalmente em cima de uma montanha de revoltas e desilusões. Seu passado foi conturbado cheio de fatos que prefere deixar escondidos em poeiras de esquecimento.

Sandman se vira para a tempestade e a densa poeira lá longe. Voltou-se para ela com um jeito compreensivo no rosto. Sorriu mais uma vez, calmo e sereno.

- Do que... – Sandra estava perplexa com tudo o que o estranho homem havia falado. Mesmo por que, era tudo verdade.

- Não tema mais nada. Você está livre. Aqui, os seus medos podem ser superados e enfim, pode se livrar deles.

Ela tentou se levantar, mas estava sem forças. Ele se aproximou e a ajudou a se levantar. Sandra sentiu a mão fria do homem dos sonhos. Era lisa e muito branca.

- O que... O que houve comigo? – perguntou Sandra, temendo ouvir a resposta.

- A sua ultima dose de heroína a deixou em coma. Está assim por três dias. Só agora consegui encontra-la.

- O que tenho de fazer?

- Você pode mudar sua vida. Mudar a sua vida mudando seus sonhos. A vida pode ser boa dependendo da posição que você a observa. Venha comigo. – Sandman estendeu a mão aberta.

Sandra olhara para ele, suplicando por ajuda, e pegou em sua mão.

Sandra viu um arco-íres se formar de uma montanha até a borda da montanha que estava, como uma ponte. Do arco íris, luzes pequenas estouravam como fogos de artificio. As cores que compõem o arco-íres brilhavam fortemente, como néon. Ela não se lembrava de ter visto algo mais belo.

- Que coisa bonita. – disse Sandra, maravilhada.

Sandman olhou para ela, sorrindo.

- Você pode fazer coisas assim também, Sandra. Basta ousar em sonhar.

davifmayer
Enviado por davifmayer em 02/01/2007
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