Carvão

E a maré, com ciúmes da Lua ampla e brilhante, decidiu transbordar. Era cheia. Tudo me parecia cheio. O céu vasto de estrelas, o vento que se esgueirava sobre as plantas, sem vergonha alguma de fazer ruídos e acordar quem dormia.

Com um pouco de carvão, ao brilho da Lua, rabisquei o que viria a ser uma menina. Uma menina que já veio ao mundo meio torta. Não torta no sentido maldizer, e sim torta, como quem já nasce com a bússola investindo oposto Norte.

Despida, inquietou-se com a maré e o vento, para logo em seguida sorrir, pousando os olhos curiosos sobre a Lua. Esticou as mãos, ainda mal rabiscada, tentando alcançar aquele imenso holofote. Percebi que algo estava mal feito, mal desenhado. Peguei outro pedaço de carvão mas hesitei ao ver que, mesmo incompleta já estava vidrada em nascer.

Puxa! Ainda lhe faltavam cores, traços mais fortes, e é claro a arte final!

Não ligou - por não saber.

Levantou-se cambaleante, aprendendo a andar sem dar de cara no chão sequer uma vez. Estava firme, e em momento algum olhou para si, ou para os rabiscos desleixados que contornavam parte de suas pernas. O que chamava mesmo sua atenção era o teto inalcançável de estrelas, como se fora desenhada para um dia se tornar uma delas.

A alma era feita de tinta, busquei juntar todas as cores possíveis da paleta, assim, preenchida de vida e luz, tornou-se indomável. Uma menina pintura e rabisco que não ligava de o ser. Enquanto a Lua estivesse no céu, seria moça e um pouco além.

Anastásia Ottoni
Enviado por Anastásia Ottoni em 22/08/2012
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