23:30
- O que está lendo?
- Cartas antigas. Respondeu ela.
- De quando?
- Não tem data, a única coisa marcada são as horas. 23h:30min.
- Mas de quem são?
- Eu não posso falar. É segredo. Respondeu rapidamente franzindo a testa.
Fiquei muito instigado, pois queria saber do que se tratava.
- Elizabeth, o que falam as cartas?
- Conta à história de dois jovens que saíram para mudar o mundo. Carlito e André, ambos morreram em vão. Não mudaram absolutamente nada. E por ironia do destino eles teriam a minha idade hoje. Estas cartas caíram na minha mão por acaso, mas lembro-me perfeitamente do dia em que ambos bateram na minha porta querendo mostrar suas ideias, mas eu toda tímida, quieta, opaca, tola, burra, ingênua, e cheia de ignorância ri deles e os deixei. Talvez se tivesse os ouvido o mundo seria um lugar diferente hoje. Poderia eu fazer toda a diferença?
E uma lágrima escorreu pelo seu rosto.
Nunca havia visto Elizabeth daquele jeito, mas eu pedi que ela continuasse a contar toda aquela história.
- 23h30min era a hora sagrada. André, Carlito e eu nascemos no dia 23 de janeiro de 1977 às 23h30min. Tínhamos uma conexão, mas eu estraguei tudo e hoje eu me pergunto: - Quem eu sou?! Minha vida nunca foi das melhores, porém eu sabia de todos os passos que dava. Estou completamente perdida Lúcio.
- Eu entendo Elizabeth, eu entendo! Já me encontrei nesta ocasião.
- E então o que você fez?
- Eu me matei. Coloquei fim em todo o meu sofrimento, me atirei de um penhasco, até hoje não encontram o meu corpo.
- O que? Você? Morto?! Então quer dizer que estou morta?!!!!
- Eu não posso te afirmar nada, só posso falar por mim. Mas posso te dizer uma coisa?
- Claro que sim! Respondeu ela assustadíssima.
- As cartas...
- O que é que tem?
- Não existem... Você acabou de escrevê-las.
- Mas se você não existe como pode julgar a existência delas?
- Elizabeth, talvez eu seja fruto da sua imaginação, mas também existe a possibilidade de você ser fruto da minha. Vai ver você é apenas uma personagem que criei. Quem não existe aqui é você!
- Então ambos não existimos Lúcio, nem as cartas, nem André, Carlito.
- Elizabeth, a verdade é que ninguém existe completamente nos dias de hoje, então vamos nos permitir ser um para o outro para que haja momentos felizes. Não importa se existimos fisicamente. A nossa consciência nos permite ser.