DIVINDADES SELADAS

Minha avó sempre contava que há muitos anos, quando o mundo era jovem, os deuses andavam no meio do povo. Eles eram presentes nas árvores, nas águas, no ar e no meio de todas as criaturas. Sempre que o povo passava por alguma dificuldade, eles vinham prontamente ajudar quem necessitava.

A maior entre eles era a Grande Mãe, que era chamada pelo povo da floresta de Mãe Luna. Minha avó contava que Mãe Luna possuía a pele alva e o cabelo prateado. Seus olhos cintilavam bondade por cada um de seus filhos, fossem eles deuses ou criaturas da terra. No entanto, num dia ela não apareceu entre os homens. Na realidade, Mãe Luna havia desaparecido por vários meses até ser encontrada por caçadores no centro da Grande Floresta. Seu brilho havia se reduzido, embora sua face mostrasse uma expressão feliz. Os caçadores acharam estranho uma escuridão ao lado da deusa, mesmo com o sol a pino. Quando se aproximaram, viram que ela possuía um bebê deitado numa cama de folhas ao seu lado. Aquele era mais um deus que viveria entre os homens.

Minha avó sempre ria quando ficava intrigado com um deus-bebê. Ela me explicava que essa forma era temporária, pois, diferente dos humanos, em poucas semanas Torvus já era um deus como o povo estava acostumado a ver. Coincidentemente, à medida que ele crescia, as pessoas foram notando que as cidades foram ficando diferentes. Os moradores ficavam irritados sem motivos, criações morriam e crianças desapareciam.

De repente, Torvus desapareceu. Mãe Luna ficou aflita, pois ele ainda não conhecia nada do mundo. O deus Yanitar mandou seus pássaros procurarem Torvus por todos os lugares, mas ele simplesmente desaparecera. E ficou assim até que a guerra começou...

Do extremo oeste vieram hordas de seres malignos, que carregavam a escuridão dentro de si. Eles destruíam os vilarejos, contaminavam as águas e espalhavam doenças por todos os lugares em que passavam. À frente de tudo isso estava Torvus. Ao ver aquilo, Mãe Luna começou a entender que todo o sofrimento que passou na criação do deus era sinal de que ele seria diferente de tudo o que já havia criado.

- Saudades de mim, mamãe? – disse ele, desdenhoso.

- Por que você destrói tudo o que criei? Você é meu filho, te amo mais que tudo, mas não deixarei que maltrate o mundo.

- Fazer isso é tão divertido. – Torvus começou a rir. – Mas isso acaba hoje mãe, o mundo será finalmente meu. Olhe o que aprendi com as feiticeiras que você baniu.

Torvus pegou sete crianças e com seus poderes cortou a garganta de cada uma. Enquanto o sangue caía no solo, ele recitava palavras num idioma estranho e, por fim, disse:

- A vida de cada uma dessas crianças sela a vida de todos os deuses. A essência de vocês desaparecerá desse mundo!

Ao dizer isso, os espíritos divinos começaram a possuir o corpo daquelas crianças e, um a um, os poderes do mundo foram selados em corpos mortais. No entanto, para o espanto de Torvus, ele também foi selado. Afinal, ele era filho de Mãe Luna e compartilhavam a mesma essência.

A era dos deuses chegava ao fim e todos os seres do mundo deveriam conviver com as atrocidades que Torvus havia criado. Minha avó diz que tudo isso irá mudar novamente, quando chegar o dia em que o encantamento enfraquecerá e Mãe Luna irá curar as feridas que seu filho provocou no mundo.

Túlio Lima Botelho
Enviado por Túlio Lima Botelho em 08/07/2015
Código do texto: T5304510
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