Chovia e não chovia, chuviscava durante a inerte tarde de outono. Antunes estava sentado em frente à janela de sua quase sempre movimentada sala gélida tomando seu café e saboreando seu fumo enquanto se lembrava da longínqua e quase esquecida vida à beira mar que vivera em um sonho que realizara e que dele desistira pelos pesados pesadelos que tivera.
O fechado mar azul, a estreita e longa faixa de areia encascalhada, as pedreiras, a bica d’água doce que escorria, os encantados que a habitavam, o céu quase sempre límpido mas nem sempre sereno, o ar, às vezes um tanto esfumaçado, as ruas calmas mas nem sempre serenas, os pássaros cantores... O cheiro da vida era perfumado, era embriagado. Passos leves e constantes que a lugar algum iam, mas que a alma impressionavam em saltos.
Sentado à beira do mar, dentro de um ancorado barquinho, Antunes refletia junto às tensas e baixas ondas de seu mar. Olhava as ondas como se olhasse a si próprio. Olhava a si próprio por suas mãos ainda jovens, mas cansadas de lutar contra o que nem se sabia o quê. Ondas do mar avançavam, quase que brincando com Antunes de entra e não entra barco adentro, de leva e não leva o pequeno barco, fazia Antunes perceber que sua vida estava por se transformar. Uma quase transparência em suas mãos fizera-lhe ver sua vida indo e vindo, saltando por dentro das ondas movidas pelo vento, nem iam e nem vinham, nem levantavam o barco, nem o guiavam e nem o deixavam estático.
Antunes olhava o horizonte. Via do outro lado do mar que se revoltara, um clarão que quase o cegara. Antunes, por um instante, pensara que sonhava, mas se sentia lúcido mais do que nunca. O clarão vindo do céu causara uma forte onda imensa que avançava ligeiramente em sua direção, a forte onda removera o ancorado barquinho e o levara por seu estreito e longo mar. Antunes sentia e não sentia temores, esperanças e calmas.
A noite caira, Antunes enxergava sua vida de sonho. Paz, sossego, peixes, frutas e legumes sempre frescos, estradas perfumadas da mata que as cercava, pássaros sempre voando e seus cantos sonorizando sua vida. Num estalo, o ambiente de paz se transformara em um ambiente similar ao de uma guerra, a mata que cercava as estradas fora substituída por campos secos e sem vida, o perfume fora substituído por carnificínero odor. Seus pássaros se transformaram em urubus que voavam sobre a terra seca em busca de carniça.
Antunes sentira seu peito se asfixiar, suas pernas endurecerem e sua mente se deslocar. Surgira a sua frente seus amigos de fé, seus amigos quase irmãos. De todos os dias, eram os seus dois amigos, eram todos e muitos para si, e estavam em campanha para lhe fechar a vida, sugar-lhe mais do que já o havia sugado. Ele vira-se alvo dos seus amigos de hoje, mas que eram seus inimigos agora. Percebera seus dons, suas propriedades, sua vitalidade toda sugada, seu corpo à beira do mar entre as pedras lançado e corroído pelos urubus. Olhou à volta e tudo se perdera. A pequena população se transformara em pó, os amigos inimigos dos inimigos estavam todos em campanha para se destruírem. O céu de antes que era quase límpido, agora era uma vermelhidão tenebrosa.
Uma nova onda forte e veloz avançou sobre Antunes. Num estalo, Antunes perdera toda aquela terrível visão, e voltara a enxergar o mar, agora em revolta a sua frente. O pequeno barco estava agora em mareado movimento e um forte vento frio cortava-lhe a face.
Por instantes, Antunes desacreditava no que vivera. Levantara-se, e partira para sua casa. Uma tempestade chegara à beira mar. Muitos raios caiam a sua frente.
Tocara o telefone, era sua amiga Samira. Estava chegando naquele momento a sua casa, vinha de sua viagem ao Peru, intencionava passar uma semana com Antunes. Chegaria em meia hora. Antunes preparara o chá que Samira adorava, frutas e chá preto, para esperá-la.
Samira chegara, trocara suas roupas molhadas e, enquanto saboreavam o chá, Samira contou a Antunes um sonho que teve no avião enquanto voltava para o Brasil.
Antunes estava acompanhado de duas pessoas, em lugar de seus rostos havia um nada escuro, suas mãos eram garras e seus suores eram sangue. Antunes era envolto num vento escuro que o impedia de enxergar os arredores, enxergava apenas o que aquelas criaturas permitiam. As criaturas mantinham-se vivas com a energia de Antunes... Samira o enxergou com sua vida terminando, sua energia vital se extinguindo, sua casa em ruínas...
Antunes ouvira o relato de sua amiga sentindo seu peito asfixiar-se como outrora. Samira era uma amiga de muitos anos de Antunes, ela sempre lhe trazia revelações, fosse por suas vidências, por suas cartas ou por sua pura chegada repentina em sua casa. A ela foi relatada sua experiência da beira mar.
Samira, motivada pelas revelações, partira às confirmações concretas, abrira suas cartas e mostrara a Antunes por meio das imagens que sua vida estava sofrendo naquele momento uma espécie de resgate, um resgate que ele invocara na noite da Rainha do Mar, quando os pescadores rendiam suas homenagens e partilhavam o peixe com os moradores presentes. Antunes, mesmo quase sempre crédulo na amiga, rendeu-se a ela neste momento. Da noite da Rainha dos Mares, nem seus amigos inimigos sabiam.
Samira que nunca tinha tido um paradeiro certo, desta vez o tinha. Estava indo para o sul. Decidira que era hora de empreender-se em algo mais estável. Antunes era necessário nisso! Era o seu amigo de confiança. Esse era o real motivo de sua visita, convidá-lo a ir viver no sul para gerenciar a loja que iria abrir.
Antunes, motivado e confiante, começou a preparar sua mudança.
O fechado mar azul, a estreita e longa faixa de areia encascalhada, as pedreiras, a bica d’água doce que escorria, os encantados que a habitavam, o céu quase sempre límpido mas nem sempre sereno, o ar, às vezes um tanto esfumaçado, as ruas calmas mas nem sempre serenas, os pássaros cantores... O cheiro da vida era perfumado, era embriagado. Passos leves e constantes que a lugar algum iam, mas que a alma impressionavam em saltos.
Sentado à beira do mar, dentro de um ancorado barquinho, Antunes refletia junto às tensas e baixas ondas de seu mar. Olhava as ondas como se olhasse a si próprio. Olhava a si próprio por suas mãos ainda jovens, mas cansadas de lutar contra o que nem se sabia o quê. Ondas do mar avançavam, quase que brincando com Antunes de entra e não entra barco adentro, de leva e não leva o pequeno barco, fazia Antunes perceber que sua vida estava por se transformar. Uma quase transparência em suas mãos fizera-lhe ver sua vida indo e vindo, saltando por dentro das ondas movidas pelo vento, nem iam e nem vinham, nem levantavam o barco, nem o guiavam e nem o deixavam estático.
Antunes olhava o horizonte. Via do outro lado do mar que se revoltara, um clarão que quase o cegara. Antunes, por um instante, pensara que sonhava, mas se sentia lúcido mais do que nunca. O clarão vindo do céu causara uma forte onda imensa que avançava ligeiramente em sua direção, a forte onda removera o ancorado barquinho e o levara por seu estreito e longo mar. Antunes sentia e não sentia temores, esperanças e calmas.
A noite caira, Antunes enxergava sua vida de sonho. Paz, sossego, peixes, frutas e legumes sempre frescos, estradas perfumadas da mata que as cercava, pássaros sempre voando e seus cantos sonorizando sua vida. Num estalo, o ambiente de paz se transformara em um ambiente similar ao de uma guerra, a mata que cercava as estradas fora substituída por campos secos e sem vida, o perfume fora substituído por carnificínero odor. Seus pássaros se transformaram em urubus que voavam sobre a terra seca em busca de carniça.
Antunes sentira seu peito se asfixiar, suas pernas endurecerem e sua mente se deslocar. Surgira a sua frente seus amigos de fé, seus amigos quase irmãos. De todos os dias, eram os seus dois amigos, eram todos e muitos para si, e estavam em campanha para lhe fechar a vida, sugar-lhe mais do que já o havia sugado. Ele vira-se alvo dos seus amigos de hoje, mas que eram seus inimigos agora. Percebera seus dons, suas propriedades, sua vitalidade toda sugada, seu corpo à beira do mar entre as pedras lançado e corroído pelos urubus. Olhou à volta e tudo se perdera. A pequena população se transformara em pó, os amigos inimigos dos inimigos estavam todos em campanha para se destruírem. O céu de antes que era quase límpido, agora era uma vermelhidão tenebrosa.
Uma nova onda forte e veloz avançou sobre Antunes. Num estalo, Antunes perdera toda aquela terrível visão, e voltara a enxergar o mar, agora em revolta a sua frente. O pequeno barco estava agora em mareado movimento e um forte vento frio cortava-lhe a face.
Por instantes, Antunes desacreditava no que vivera. Levantara-se, e partira para sua casa. Uma tempestade chegara à beira mar. Muitos raios caiam a sua frente.
Tocara o telefone, era sua amiga Samira. Estava chegando naquele momento a sua casa, vinha de sua viagem ao Peru, intencionava passar uma semana com Antunes. Chegaria em meia hora. Antunes preparara o chá que Samira adorava, frutas e chá preto, para esperá-la.
Samira chegara, trocara suas roupas molhadas e, enquanto saboreavam o chá, Samira contou a Antunes um sonho que teve no avião enquanto voltava para o Brasil.
Antunes estava acompanhado de duas pessoas, em lugar de seus rostos havia um nada escuro, suas mãos eram garras e seus suores eram sangue. Antunes era envolto num vento escuro que o impedia de enxergar os arredores, enxergava apenas o que aquelas criaturas permitiam. As criaturas mantinham-se vivas com a energia de Antunes... Samira o enxergou com sua vida terminando, sua energia vital se extinguindo, sua casa em ruínas...
Antunes ouvira o relato de sua amiga sentindo seu peito asfixiar-se como outrora. Samira era uma amiga de muitos anos de Antunes, ela sempre lhe trazia revelações, fosse por suas vidências, por suas cartas ou por sua pura chegada repentina em sua casa. A ela foi relatada sua experiência da beira mar.
Samira, motivada pelas revelações, partira às confirmações concretas, abrira suas cartas e mostrara a Antunes por meio das imagens que sua vida estava sofrendo naquele momento uma espécie de resgate, um resgate que ele invocara na noite da Rainha do Mar, quando os pescadores rendiam suas homenagens e partilhavam o peixe com os moradores presentes. Antunes, mesmo quase sempre crédulo na amiga, rendeu-se a ela neste momento. Da noite da Rainha dos Mares, nem seus amigos inimigos sabiam.
Samira que nunca tinha tido um paradeiro certo, desta vez o tinha. Estava indo para o sul. Decidira que era hora de empreender-se em algo mais estável. Antunes era necessário nisso! Era o seu amigo de confiança. Esse era o real motivo de sua visita, convidá-lo a ir viver no sul para gerenciar a loja que iria abrir.
Antunes, motivado e confiante, começou a preparar sua mudança.