[Noturno]

O dia se vai e a noite vem. Morre tudo o que de bom havia e restam apenas a neve e a escuridão. Sigo com passos claudicantes pela rua e a minha respiração é ofegante, carregando comigo apenas a roupa do corpo e a minha doce e amada Solidão. Ela está sorridente, andando muito rapidamente, indo de um lado para o outro, dançando, cantando. Eu apenas a observo, tão graciosa e pálida, pálida como a neve que a cerca. Ela vem até mim e me beija, tão fria quanto a noite, e, no final, diz-me “Eu te amo muito!’, e eu apenas respondo com um sorriso. Abraçamo-nos e seguimos em frente.

A noite chega e reina soberana. As estrelas fracas iluminam o caminho, junto à luz dos postes, ainda mais fraca que a das primeiras. A Solidão me diz coisas que eu não compreendo, mas isto não me importa: a suavidade do seu toque, o seu tom de voz melífluo, a sua respiração serena me acalmam. Meu coração dispara e se enche de desejo de possuí-la não só nesta noite, nem na seguinte também, mas em todas as outras. Quero dizer isto a ela; quero dizer o quanto eu a amo; quero dizer o quanto eu suplico por seu amor. Mas nada digo: apenas sorrio enquanto eu a admiro, e isto é mais do que o suficiente para dizer o que por ela sinto.

A noite reina e jamais abdica. Tudo permanece calmo e sereno; tudo permanece monótono e entediante, mas só para aqueles que não amam; tudo permanece maravilhoso e belo para aqueles que desfrutam da companhia da amada. Sigo o meu caminho enquanto o tempo voa para lugares distantes e desconhecidos. Eis que, porém, uma velha conhecida minha aparece, com seu sorriso encantador e uma beleza incomparável e invencível. “É esta noite, querido?”, diz-me ela, olhando de soslaio para a minha namorada, que me abraça pelas costas, escondendo-se do perigo. “Hoje não, Morte. Hoje estou feliz. Quem sabe amanhã?”, respondo com um sorriso amigável, que não me é típico. “Que seja amanhã então, querido.”, responde-me ela, desaparecendo diante de mim. Decido seguir o meu caminho, enquanto a Solidão me abraça, assustada. “Vai partir amanhã?”, ela me pergunta, não podendo conter uma lágrima rebelde de escorrer pela sua linda face. “Acho que não. Eu te amo muito.”, respondo, beijando-a. Seguimos o nosso caminho, felizes, satisfeitos, com a certeza de que esta noite, prenhe que está, não tardará em dar à luz um novo dia.

Marcos Paulo Barbosa da Silva
Enviado por Marcos Paulo Barbosa da Silva em 21/01/2017
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