INSÓLITO

Ela vivia em uma cidadezinha no subúrbio, pacata, onde todos sabiam de tudo e por que não dizer, de todos.

Sua mãe gostava de ler livros, escrever poemas, músicas, cantar, dançava um pouco, mas sempre reservada, observava a pequenina que a imitava sentada no chão, com a caixa de bonecas à frente, empilhadas criando o formato do que seria uma maquina de datilografar.

Arrumava os papeis no mesmo ritmo da mãe, sorrindo, movia os dedinhos, redondos e pequenos, no mesmo compasso.

_ TAC TAC TAC, TAC ziiiip, TAC TAC TAC , TAC ziiip.

Imitando o som que ouvia a cada toque dos dedos de sua mãe no teclado.

Sorria olhando a mãe, sentada em postura elegantemente ereta, em seu vestido de seda florida azul bebe, uma sandália delicada, desenhava os pés de sua mãe, como os das deusas do Olimpo dos desenhos que assistia na televisão; a mãe por sua vez, fingia nada ver, mas olhava de canto de olho, na lateral dos óculos, percebendo toda a empolgação da pequena.

Sentia orgulho e ao mesmo tempo medo, pois sabia que assim como ela, sua pequena tinha personalidade e opinião, sabendo também o quão cruel o mundo poderia ser com alguém assim, logo esse raciocínio foi quebrado com o barulho da pequena, mexendo nas teclas mágicas da maquina.

_ Mamãe, por que parou de tocar e ficou com o olhar parado no ar?

A mãe não tinha percebido que enquanto pensava, havia parado com as mãos levemente afastadas do teclado da maquina olhando para o vácuo, imaginando o que enfrentaria a sua pequena pensante.

Sorri meio embaraçada. __ Nada minha abelhinha, mamãe estava a devanear.

Franzindo o senho, a pequena faz uma feição de indagação e logo engata.

__ Devanear... O que é devanear?

A mãe a pega no colo, sentando-a em suas pernas, acaricia seus cabelos e toca com a ponta do indicador no nariz da pequena.

__ É quando você para, por um instante, de prestar atenção no foco principal...

Dedilhando com o indicador e o dedo médio na barriga da pequena, desviando-lhe a atenção do rosto da mãe.

__ E observa outra coisa, mo-men-ta-nea-men-te...

Correndo com os dedos até o pescoço da pequenina, que se encolhia esperando a cosega e se surpreende quando ganha um beijo da mãe, em sua bochecha. Ambas sorriem, e a pequena retribui o beijo à mãe. Colocando-a no chão.

__ Agora vamos arrumar os brinquedos e tomar banho, esta quase na hora do jantar.

Após guardar os brinquedos arrumados dentro de uma caixa, reservados unicamente para isso, a pequena abelhinha, corre em direção ao guardo para pegar suas roupas e tolha para o banho, ao longe na cozinha a mãe grita.

__Tome cuidado ao subir essas escadas correndo, você pode se machucar.

Ao longe resfolegando ela responde __ Tá bom mãe!

Continua a correr, escorrega como se estivesse de patins até a porta e num salto entra no quarto, que esta uma bagunça, livros pelo chão, anotações em papeis avulsos, poemas interminados, a cama que esta desforrada com metade da colcha em tom lilás clarinho pendendo para o chão, bem encima de suas pantufas de abelhinha, próximo à janela na lateral direita do quarto esta um teclado, com algumas partituras para iniciantes, sua pequena cômoda fica bem ao lado, onde pode se encontrar também mais livros e papéis, anotações e partituras.

__Não se demore ai em cima princesa.__ Fala a mãe ao pé da escada.

A menina que havia se perdido em devaneios, ao sentar e tocar um pouco seu teclado, com a vista linda que tem a sua janela, o vento a soprar seus cabelos, como em comunhão a cada nota que ela produzia, assim como a arvore que levemente chacoalhava; só ouve ao longe o só da mãe, mas nada entende.

__Abelhinha dos favos de mel, você me ouviu? __ Pergunta a mãe ai pé da escada.

Num rompante a pequena volta à realidade e reponde.__ Sim mamãe já está indo.

Começa a sorrir sozinha, por que sabe que ficou como sua mãe há poucos instantes, e como ouviu chamar por seu nome completo, entende que ela já havia chamado mais de uma vez, o que significa perigo. Como movimentos rápidos, mas um pouco desajeitados, ela pega sua roupa na cômoda, a toalha esta sobre a cadeira que estava sentada, tropeça um pouco, se desequilibra dali e continua sorrindo, encaminhando-se para o banheiro.

A mãe ouve a pequena cantarolar no banheiro e o chuveiro ligar, solta um largo sorriso seguido de um suspiro.

__É, temos muito chão pela frente pequena...

Pensa em voz alta, começando a cantarolar uma musica que aprenderá com sua mãe, onde um trecho diz que se deve confiar e ter fé, enquanto corta algumas verduras e legumes para por na sopa, que já esta no fogo.

Abelhinha já acabou o banho e esta terminando de enxugar os cabelos um tanto desajeitada, mas desde que fez 6 anos, não quer mais que a mãe lhe banhe, pediu unicamente para que lhe ensinasse, durante um tempo a mãe supervisionou para ver se ela o faria direito, assim que percebeu a segurança da pequena, deixou que tomasse ao menos um do três banho sozinha.

__O que teremos para o jantar Mãe?

Indaga a pequena terminando de descer as escadas.

__Teremos sopa de feijão com macarrão, legumes e carne, assim como você e seu pai gostam.

Responde a mãe terminando de colocar as verduras e legumes que cortará.

__Abelhinha, você poderia arrumar a mesa do jantar para mim hoje?

Prontamente a menina começa a pegar talher, pratos, copos, para montar a mesa do jantar. Ouve-se o barulho de chaves e a porta bater. Elas se entre olham e sem esperar abelhinha se assusta como o pai a lhe fazer cosegas.

__Cheguei... Como foi o dia de vocês hoje?

Enquanto a menina se contorce com a cosegas, a mãe e o pai sorriem.

__Foi um dia produtivo, consegui escrever mais sobre o artigo que a revista pediu...

O pai beija a menina e para de fazer cosegas se dirigindo a mãe para cumprimenta-la com um abraço e beijo.

__Mas é um assunto muito delicado, mesmo nos dias de hoje, as pessoas só tentam mascarar...

Pegando o palito do marido e começando a tirar a gravata eles engatam na conversa, que a pequena esta curiosa para ouvir, mas sabe que não pode interferir.

__Penso o mesmo amor, é alarmante o quanto as pessoas tentam mascarar e esconder esse problema, principalmente nos dias atuais.

O pai senta-se a mesa, a primeira cadeira na cabeceira da mesa é dele, as duas primeiras nas laterais uma é da mãe e a outra da menina, que continua arrumando a mesa para o jantar enquanto os adultos conversam e sua mãe continua a temperar a sopa para servir.

__E você amor, como foi seu dia?

O pai não parece estar nada feliz com o assunto, para abelhinha era fácil saber, pois observava muito e sabia que quando o pai coçava a cabeça e assanhava o cabelo as coisas não estavam nada bem.

__Está cada vez mais complicado... Acho que vamos ter que levar o assunto para a justiça.

Colocando a panela de sopa sobre a proteção na mesa, a mulher o encara.

__ Por que amor?

O homem olha para a menina que escuta havida a conversa, mas agora sentadinha ao lado do Pai.

__Vamos deixar para falar sobre isso mais tarde...

Sorri olhando e acariciando o cabelo da pequena, que agora baixa o olhar, por saber que é realmente algo muito complicado, para seu Pai não aceitar falar na sua frente.

__Vem cá, conta p Pai como foi o seu dia?

Pegando a pequena e colocando-a em seu colo.

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Continua...

GK Bagoé
Enviado por GK Bagoé em 01/02/2017
Reeditado em 28/01/2020
Código do texto: T5899479
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