O DEUS NA CALÇADA

Um presente meu a um grande amigo e músico, e a sua banda, desejando que continuem protegidos pelos Deuses antigos, e tenham boa sorte sempre!

O DEUS NA CALÇADA

Enquanto os carros passavam agitados pela Strasse 17 Juni, na tarde de sexta feira, anunciando o final de semana prestes a chegar, Marco e seus colegas iniciavam seu trabalho, a minuciosa troca dos petit-pavê da Siegessäule, a Praça da Vitória, em Berlim. Ele, um brasileiro, era mais um dos artistas plásticos que o país perdeu para a Europa, que lhe acenou – ao menos em sua mente – com melhores chances de expressar sua arte, crescimento, além de um retorno financeiro que a Escultura no Brasil não lhe traria tão cedo, talvez jamais trouxesse.

Ele além de escultor era também cantor, uma voz maravilhosa, uma pessoa que nasceu sob a tutela de ao menos duas das Musas. Alguém com tantos talentos e tanta vontade de crescer que não poderia estar contido em uma realidade que não lhe desse chances de amadurecer e mostrar ao mundo toda sua arte. Ele precisava da Europa, o Velho Mundo era sua casa, sempre sentiu isso, e lá ele teria toda a glória que poderia encontrar em vida.

Contudo, as academias de arte pediam portfólios muito além do que um escultor auto-didata poderia apresentar, muito além na verdade de um portfólio que um aluno poderia apresentar. Alguns artistas brasileiros eram citados, conhecidos e admirados, mas ele era apenas mais um sul-americano querendo construir um nome na Alemanha. Porta após porta, marchand atrás de marchand, as suas chances eram vetadas. O dinheiro reservado para ele e a namorada ia acabando. Ela conseguiu um trabalho temporário em um pub, trabalhava a noite, e era forte e compreensiva. Também tinha deixado uma vida toda no Brasil acreditando na arte dele, e mesmo quando ele perdia a crença na possível vitória, ela o fazia retomar o fôlego e continuar.

As coisas começaram a mudar quando ele viu um anúncio da prefeitura solicitando pessoas com habilidade no manuseio de equipamentos de corte em pedras, além de algum conhecimento sobre minerais e certas rochas em especial, os assentadores de petit-pavê. Ele trabalhava no Brasil com granito e mármore, seria muito fácil adaptar-se a isso, o salário era bom, Manoela poderia parar de trabalhar e estudar, como era o previsto, e ele poderia ainda guardar um valor mensal para também aperfeiçoar-se nos cursos pagos de escultura. Era perfeito. E na verdade, as coisas mudariam muito a partir dali.

Feita a entrevista, ele muito inteligente e com boa fluência no idioma, cativou os entrevistadores. Veio a prova técnica e, bem a vontade com os materiais todos, mostrou que o trabalho era realmente para ele, e no mesmo dia conquistou a tal vaga. Rápido como era, não pensou duas vezes em levar consigo para o dia de provas uma pasta, seu portfólio, com fotos de seus trabalhos em pedra no Brasil e também as recomendações dos dois curadores de suas exposições. Ele no mesmo dia conseguiu mais, ganhou a vaga de diagramador. O direito de montar os desenhos base que comporiam a ornamentação das ruas. Ele iria novamente criar, iria expor suas obras nas calçadas de Berlim, em desenhos montados com mosaicos de pedras. Estava feliz como a muito não ficava. Comemorou com Manoela o primeiro grande feito de suas novas vidas.

No seu primeiro dia foi bem recebido pelos colegas diagramadores, interessados pela sua arte, vinda da América do Sul, muito embora alguns deles comentassem que não sabiam que o Brasil tinha produção de pedras como granito e mármore, sendo que grande parte de nosso território era “floresta inundada”. Ele brincou que seu pai tinha uma mina de granito logo abaixo das árvores onde eles moravam, e que seu cachorro de estimação era um macaco.

Os outros funcionários logo estavam cativados pelas brincadeiras e bom humor de Marco, que vocalista de uma banda de Heavy Metal em sua cidade natal, se viu obrigado a arriscar algumas letras de sambas antigos nas primeiras noites de trabalho. Ele era brasileiro, sem samba, não seria ninguém... E tudo caminhava perfeitamente bem.

Chegaram então para o trabalho, as 18 horas daquela citada sexta feira, na Praça da Vitória, com os moldes prontos de flores e guerreiros, motivos antigos, e a seleção de pedras já feita. Estas composições eram de um colega de Marco, ele o tinha auxiliado nas proporções dos corpos dos homens, e no vulto das cenas épicas, guerreiros que corriam sobre cavalos atrás de gamos, com lanças e flechas de sílex, conjuntos arrematados por flores e arcos, uma composição belíssima. Marco estava bem até chegar ao trabalho, na sede da prefeitura. Enquanto pegava os moldes e escutava a proposta de composição de seu colega, começou a sentir-se mal. Teve ânsia, alguns calafrios, e uma ausência sutil, não um desmaio, mas uma muito rápida perda da noção de espaço. Sentiu-se por alguns segundos como se não estivesse naquele local. Sentiu também cheiros estranhos nestes momentos. Creditou isso tudo as malditas Vienawuzts, as salsichas que Manoela amava e comprava aos quilos. Imaginou que não estaria assim se tivesse jantado uma feijoada, e foi trabalhar.

Um pouco melhor, foi com seu colega fazer o reconhecimento das primeiras áreas a serem decapadas para a nova colocação do piso, o calçamento estava muito danificado, mas já trazia desenhos similares aos que eles tinham produzido na prefeitura. O calçamento manteria a proposta inicial: Cenas épicas do povos primitivos da Alemanha, os Godos e Germanos. Demarcaram todo o terreno, Marco, fotografando as áreas que começariam a ser desmontadas, sentiu novamente os aromas estranhos, e mais uma ausência. Desta vez se viu diante de um touro, um poderoso touro, em verdade uma espécie de Minotauro, pois era muito maior que ele, e logo abaixo do colo, da cabeça de touro, ele mostrava um forte corpo humano. Era um touro, com chifres de gamo, e corpo de homem...

E quanto mais Marco se fixava na imagem daquele ser, tentando entender de qual capítulo de “Arquivo X” guardado em sua mente aquilo teria saído, mais ele sentia-se mal. Ouvia ao longe os colegas o chamando, sentia os cheiros agora ocres, azedos, e o touro se aproximava dele. Acordou no chão da praça, com os colegas assustados ao seu redor. Caído agarrado á câmera fotográfica, e diante do susto de todos, um pouco melhor, disparou: Calma pessoal, isso é normal no segundo mês de gravidez! Todos riram, ele muito mais, talvez para esconder de si mesmo a imagem do ser, nítida em sua mente.

A câmera se quebrou. As imagens poderiam ser recuperadas pelo chip. O retirou e, a pedidos de todos, decidiu voltar a sede e salvar as imagens, ele também não se sentia bem o suficiente para estar na rua. Os homens começariam o trabalho sem ele. Foi embora.

Já na sede, baixando os arquivos, sentia-se bem. Comeu um pedaço de pão e resolveu abolir de sua dieta “tudo o que tivesse mãe” a exceção da carne dos frangos, que segundo ele, surgiam adultos das chocadeiras nas granjas, e já traziam na pele a inscrição “nugget” . E ria de todas as bobagens que era capaz de pensar por minuto. As imagens do chip apareceram na tela. Deparou-se então com ele: O mesmo ser, fotografado, nas pedras da calçada antiga, com mulheres lhe entregando flores e frutos, e ele apontava para o alto com uma das mãos, e para a terra com a outra, o mesmo ser. Correu para os arquivos do Setor de Obras, buscando informações sobre os construtores das calçadas naquela região. Pouca coisa encontrou, nada sobre a construção original da calçada, apenas dados da década de 50 sobre sua última reforma, Joseph Weisser era o nome do condutor das obras então. Um senhor que teria falecido no início da década de 70 e que desde 1956 não trabalharia mais para a Prefeitura, tendo dedicado-se a criação de ovinos no interior da Alemanha, sendo muito bem sucedido nesta área. Faleceu de causas naturais. Nada mais. Os registros iam até a última reforma, nada que lhe interessasse de verdade. A calçada era mais velha que a década de 50 com certeza.

Buscou então informações sobre o ser. Para ele achou alguns nomes, descrições de enciclopédia sobre um Deus pré-histórico, protetor das artes e vida em comunidade, conhecido pelos povos antigos até os tempos das conversões ás grandes religiões, ora aparecendo como um bom deus, ora como o demônio católico encarnado. Praguejou por ter lido ás escondidas “O Exorcista”, roubado dos livros de seu pai, e que agora lhe fazia imaginar coisas, pegou tudo o que pôde de informação e voltou á praça.

Chegando lá dirigiu-se diretamente para o quadrante que havia fotografado. Tarde demais, os homens já o tinham decapado e escavado por completo, para o início das obras de recuperação. Ele queria ver ainda o ser, Cernnunos – o nome que mais apareceu em suas pesquisas – mais uma vez. Não sentiu nenhuma das reações que antes o acometeram, mas estava desanimado. Nada falou sobre isso aos homens. Neste ínterim, percebeu que eles o olhavam preocupados, gostavam realmente dele, e não o esperavam de volta ao trabalho na rua, já eram quase onze da noite.

Olaf, um croata que trabalhava na equipe dos assentadores de petit-pavê, e que nutria simpatia por Marco por este ser da “terra da Escrava Isaura” – ele adorava novelas – se aproximou dele, colocando a mão em seu ombro, perguntou se ele estava bem. Marco assentiu sorrindo, e Olaf lhe estendeu a mão, como quem quer entregar algo. Ele aceitou. O croata então falou. Ele tinha entregue á Marco um bracelete, grande e bem trabalhado, parecia ser em prata com pequenas pedras negras incrustadas, sorrindo ele disse que já tinham achado algumas coisas boas ali, mas que eram todas “coisas de mulher” e que sempre acabavam tendo algum valor nas penhoras ou até no Museu, mas que aquele bracelete iria ficar bonito no braço da esposa brasileira. Pediu então que Marco o levasse de presente a Manoela. Ele pensou no fato de estar com uma relíquia muito antiga em mãos, e que o bracelete deveria por certo ser entregue a algum Museu, nem que apenas para avaliação. Mas ao mesmo tempo, aquele formato e sua delicadeza pareciam ter sido feitos para o braço de Manoela. Que mal faria lhe levar um presente? Ainda mais algo assim tão importante?

Aceitou, olhando muito atento os pequenos detalhes da peça. Percebeu uma inscrição interna em letras que não conseguia compreender. O mostrou a Olaf, e este disse que tinha uma namorada que entendia dessas letras. Eram “runas” e que ela era um tanto “bruxa”, sabia ler e talvez traduzir o que as letras diziam. Pegando um pedaço dos papéis vegetais usados para os moldes e um lápis crayon, decalcou o desenho interno do bracelete, as letras, e o guardou cuidadosamente junto com seus materiais. Rindo, disse que agora tinha um bom motivo para voltar a casa da namorada, sem ela achar que ele estava apaixonado, sabe como é não? E voltou ao trabalho.

Marco chegou em casa a uma da manhã, Manoela estava acordada lendo, ele nada falou sobre todas as coisas estranhas acontecidas na noite. Perguntou se ela queria ir a um pub, sair para comer, ver um filme... Ela disse que não, queria conversar e dormir, estava cansada. Ele então, fazendo várias expressões cômicas diante dela entregou o bracelete, falando que era o presente de um antigo rei para a sua rainha, e que eles o tinham encontrado nas escavações. Manoela riu, e falou que por certo ele o teria comprado na feira noturna, de algum neo-hippie da Inglaterra, e pago uma refeição em troca dele mas, se ele ficaria feliz com isso, que ela então acreditaria na história da rainha, e que iria polí-lo, para que fosse digno de Dona Manoela. E rindo o abraçou, Marco viu que ela realmente gostou do presente, não importando sua origem. Ela o poliu, e se assombrou percebendo o quanto ele reluzia, e o quanto era verdadeiramente bonito. O abraçou novamente, e disse que era digno de uma rainha com certeza. Ele estava feliz. A imagem de Cernnunos foi substituída pelo rosto feliz da namorada, ele agora queria dormir.

Deitaram-se e ele caiu em sono profundo em instantes, tão cansado estava. Sem sonhos, se sentiu de uma hora para outra caindo, e caindo... Então acordou de sobressalto. Virou-se na cama e ficou de frente para Manoela, que dormia tranquila e profundamente ao seu lado, com a mão repousada ao lado do rosto sobre o travesseiro, o bracelete reluzindo em seu pulso.

Ele se sentiu aquecido pela presença dela, sorriu, sentindo o quanto a amava, e tocou sua mão. Neste momento o bracelete passou a reluzir mais intensamente, emitindo luz própria e ofuscante como um sol. Marco tentou levantar-se mas não conseguia se mexer, Manoela não acordava, ele tentou gritar seu nome, queria lhe arrancar a jóia do pulso mas, onde estava sua voz?? Ele estava mudo, e continuava sem poder se mexer! O brilho do bracelete aumentava mais e mais até tornar todo o quarto pura luz, cegando Marco, que fechou os olhos desesperado.

Sentiu paz. Nenhum som, nenhum movimento ao seu redor. Parecia estar em local iluminado pois sentia a claridade através das pálpebras mas tinha medo de abrir os olhos. Pensava na namorada, se algo de ruim tivesse acontecido a ela não existiria deus antigo capaz de conter sua fúria, mas ainda assim, tinha medo de abrir os olhos, contudo, ele sentia paz. Resolveu encarar o que quer que estivesse a sua frente, e resolver tudo ali. Abriu os olhos.

Ele estava em um salão circular, o chão era de terra batida, escavado de forma a criar vários degraus, onde muitos homens poderiam sentar-se como num teatro. As paredes de madeira eram ricamente entalhadas, sem ostentação, era um salão muito antigo. Deuses e Deusas esculpidos na madeira das paredes, candelabros de ferro muito bem forjado, mas simples, archotes decorados. Era uma sala de cerimônias, antiga e lindíssima, e no centro dela, Cernnunos olhava para um espelho de bronze em suas mãos, pequeno e redondo, ele o polia como se o acariciasse, e parecia entristecido. Suas costas estavam arcadas, ele parecia envelhecido e não jovem como as imagens de antes do desmaio de Marco na praça, estava sentado em um pedaço de carvalho, e parecia um idoso que vê fotos antigas e suspira. Marco teve pena dele, sentiu vontade de segurar suas mãos. Se aproximou.

O Deus não se levantou, apenas ergueu sua cabeça e olhou para Marco firmemente, com uma expressão que lembraria um sorriso. Com um gesto delicado de suas mãos enormes, acenou para sua esquerda e um pedaço de carvalho veio arrastado por encanto até Marco. Cernnunos fez um sinal para que se sentasse. O tronco estava posicionado exatamente a frente do Deus. Marco estava olhando para um dos Deuses mais antigos do mundo muito de perto. E isso o enchia de medo, e de alegria ao mesmo tempo. Sentou-se, e em reverência, agradeceu a Cernnunos, baixando sua cabeça. O Deus estendeu novamente sua mão, tocando a nuca de Marco, e sibilou palavras antigas. Marco sentiu uma energia doce, eletricidade, percorrendo todo seu corpo, e sentiu-se abençoado. Ergueu sua cabeça para continuar olhando o ser.

Ele então mostrou á Marco o que tinha em suas mãos. Era realmente um espelho de bronze polido, muito bonito, e com um sinal pediu para que Marco se aproximasse dele e o olhasse. Ele assim o fez.

Nele, Marco viu a imagem de um homem grisalho, com roupas antigas e óculos pequenos, franzino, limpando uma peça... Esta peça era muito parecida com o bracelete de Manoela e sim! Era um bracelete igual ao dela! Então ele viu este homem em um prédio, como que trabalhando, cercado de outros homens, em uma prancheta, desenhando. Ele percebeu em um canto os moldes antigos das pedras da prefeitura, e o homem entregava um projeto a outro, e na lateral dele o nome: Joseph Weisser... Sim! O último mestre de obras de reparação da praça! Ele viu então detalhes dos projetos dos moldes, e viu a imagem de Cernnunos como a fotografou, mas ainda no papel, e veio a sua mente uma imagem ainda mais antiga, a da calçada naquela época, e ela já trazia outra imagem de Cernnunos...

Então sua mente foi levada em redemoinho sobre tempos e tempos, girando em torno daquele pedaço de calçada. Ele via os prédios sumindo, as casas caindo, árvores crescendo, queimando, sol, neve, dia, noite, e a calçada sob seus pés... Até que a grande roda do tempo parou. Ele estava no meio de uma clareira em uma vasta floresta, uma noite de Lua, não havia mais calçada sob seus pés, mas ele estava no mesmo lugar. Então ele ouviu a música vinda do meio das árvores, e viu as tochas carregadas por homens vestidos com peles, e viu mulheres nuas coroadas com flores, carregando cestos com frutas e odres de vinho, e cantando. E junto delas ele viu caminhando imponente Cernnunos.

Eles vinham para um ritual. Ele sentiu que aquele solo era sagrado, aquela clareira era de Cernnunos e seus seguidores e eles estavam em paz. Marco ainda presenciou o início das rodas dos ritos e os cânticos, até que sua mente foi novamente sequestrada dali para outro tempo, onde ele voltou a ver Weisser, comandando as obras na praça, e, longe dos olhos dos assentadores, ele enterrava o bracelete na terra novamente. Ele pode ver o bracelete de perto e percebeu que compreendia o que as letras runicas diziam... Em sua escrita mística, quando Weisser o enterrou novamente elas traziam gravado “WEISSER” e neste instante enquanto Marco observava tudo as runas modificaram-se para o código que ele viu em suas mãos, o código que o croata Olaf decalcou, e este agora dizia “BÜHRER”... o seu sobrenome, Marco Bührer!

Ele voltou de seu transe rápido como um susto, e viu que Cernnunos o olhava com carinho. Ele agora entendia: De tempos em tempos, quando alguém decidia mexer no território que um dia foi consagrado a Cernnunos, ele aparecia e pedia para que fosse lembrado, para que seu local de rito continuasse sagrado. Assim sendo, a única coisa que este deus queria, este deus, que já havia sido tão importante para tantas tribos no mundo antigo, era não ser esquecido, e seu local de ritos, não ser profanado. Marco deveria, portanto, criar uma nova imagem para ele em seus moldes, marcá-la no chão no mesmo local, e antes de iniciar as obras enterrar cuidadosamente o bracelete no mesmo lugar, para que no tempo certo ele pudesse ser encontrado por outro artista, e a imagem de Cerunnos seria assim preservada através dos tempos. Marco ajoelhou-se, o Deus fraco o ergueu, passou a mão calejada sobre seu rosto e então Marco acordou ao lado de Manoela novamente.

Ele contou a ela sobre tudo, desde as ausências até o encontro com Cernnunos e disse que não importaria se ela acreditaria nele ou não, que ele enterraria o bracelete e lhe daria outra jóia tão logo fosse possível. Ela, até então calada, apenas lhe mostrou o livro que andava lendo, sobre “danças circulares das tradições pagãs”. Ela lhe contou que a muito sonhava com um ritual pagão muito belo e sexual, e que tinha vergonha de lhe contar pelo seu conteúdo, e principalmente pela aberração que conduzia o rito: Um homem com cabeça de touro e cornos de gamo... E eles voltaram juntos de madrugada á Siegessäule, para enterrar com muito cuidado o bracelete na praça.

Olaf nunca mais apareceu, nem para o trabalho, tampouco com a tradução das escritas rúnicas. Mas Marco vez ou outra o vê, como se estivesse tomando conta dele, e percebeu que a cada vez que ele vê Olaf de relance, algo de bom lhe acontece. Na última vez, Marco achou várias peças vikings enterradas em um jarro. O valor do achado, dividido entre ele e todos os assentadores de petit-pavê que trabalhavam na ocasião, rendeu a ele e a Manoela a tão sonhada chácara próxima a fronteira da Austria. Ali eles criam ovelhas e Manoela fez um pequeno altar no bosque, onde tem entalhada em madeira escura uma imagem de Cernnunos. Eles costumam ir lhe levar flores e frutas todos os dias.

Marco abandonou a escultura e se dedica a música, está indo bem com sua banda no Brasil, para onde vem sempre que possível, e a banda, Beltane, está com seu segundo cd lançado. Se eles são bons? Bem, são apadrinhados por um Deus, que mais poderiam ser se não bons, eu diria. Os procure no orkut ou no my-space e tire suas próprias conclusões. Eu sinceramente os recomendo. E como só eu soube de toda esta história? Por que eu sempre sei, apenas isso.

Carla Umbria
Enviado por Carla Umbria em 09/08/2007
Reeditado em 07/01/2012
Código do texto: T600037
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