Dançar era proibido

Dançar era proibido. Não por lei, mas por decoro: que vergonha um boneco de pau se meter a dançar.

A vergonha vinha dos rangidos e estalos, daquelas articulações que só faziam ser retas, duras e secas. Não, um boneco não era feito para dançar.

'Dançar!? Que vergonha!'

Portanto, não espanta que tenha sido entre piadas e escárnio que aquele boneco, depois de escutar a batida oca no seu peito, ousou escutar também a música e, absurdo!, se pôs a dançar.

Se o perguntassem por que fez isso, de onde vinha essa ousadia, ele não saberia dizer, não sabia falar dessas coisas: além da dança, também o desassossego era proibido ('Que vergonha!').

Mas ele dançou mesmo assim. Tosco, ridículo, limitado. Como se bêbado, como se louco. Dançou como quem não sabe dançar, sem elegância nem harmonia.

E quando a estupidez da plateia se avolumou em deboches, rancores e ofensas, e ecoou ordens e gritos, ele, para súbito silêncio de todos, riu. Não qualquer riso, mas um riso tranquilo.

E se o perguntassem por que ria assim, ele não saberia responder, falar dessas coisas não era hábito: também a leveza era proibida ('Vergonha!').

Então ele continuou a dançar, e a dançar rindo, deliciado com seu próprio desalinho desajeitado, o respiro de um bailarino que passou tempo demais roendo as unhas sentado atrás de uma mesa.

'Que vergonha!', finalmente a plateia voltou a se manifestar.

Contudo, agora as vozes foram poucas.

A maioria dos bonecos permanecia em silêncio. A maioria ocultava, vítima da própria vergonha, a tentativa tímida de escutar a batida oca dentro do próprio peito. Talvez também pudessem escutar a música, talvez também eles pudessem ser ridículos entre risos tranquilos.

E dançando aquele boneco de pau se afastou, mergulhou no palco que era o mundo. A cada pirueta dada - piruetas sem jeito, destrambelhadas e risonhas - rachaduras profundas sulcavam o chão.