MIRABELA- O amargo sabor do destino-continuação.

Santiago permanecia estático observando aquele ser tão angelical de uma pureza quase divina. Que quando conversava fazia gestos e trejeitos que pareciam flutuarem suas mãos. E todas as vezes em que pronunciava o nome de Deus ela olhava para o céu tão calorosamente. E em seu íntimo ele perguntara a sí mesmo:- quem

seria ela? o que a fazia tão diferente das outras pessoas? a voz? os gestos? ou toda a sua doçura?

Enquanto isso dona Lázara a avó de Mirabela chega em casa sem a neta. Dona Albertina a filha de dona Lázara e mãe de Mirabela logo percebe a ausência da filha.

- Mamãe, onde está Mirabela?

- Conversando com aquele rapaz lá da padaria.

- Muito me admira a senhora; tão religiosa e seguidora da moral e dos bons costumes permitir tamanha audácia.

- Não sei onde está a audácia nisso. Nossa menina já está bastante crescida e não há nada mal em conversar com rapazes.

- Mamãe você esqueceu o que aquela familia disse sobre Mirabela?

- Não importa Albertina, este rapaz parece ser um homem de bem.Os seus pais são apenas um casal de portugueses que não sabem o que dizem.

Dona Albertina esfrega as mãos num gesto de desprezo ao assunto. Enquanto que volta a mexer a panela do fogão dizendo: - Faço como pilatos; lavo minhas mãos.

Á noite contra a vontade da avó, Fabricia está no quarto de Mirabela. Deitada na cama da própria com os pés por sobre a parede, enquanto que Mirabela diante do espelho penteava seus belos cabelos e ouvia calmamente os lamentos de Fabricia: - Sabe Mirabela você é muito boba. Um príncipe como o Santiago lindo e rico se oferece de bandeja para você e você fica aí pensando em honestidade e respeito.

- Penso em honestidade e respeito sim por que minha avó me ensinou que a gente tem que amar a pessoa pelo que ela é e não pelo que ela tem .

Fabricia dá de ombros e num tom meio que irônico rebate a amiga:

- E qual é o problema Mirabela? Santiago é um rapaz maravilhoso, também é rico. Acho que ele é do tipo 'vale brinde'. Você compra a honestidade e a riqueza vem de brinde. Isso não é o máximo?

Mirabela levanta-se do banco em que estava e depositando a escova por sobre a penteadeira a repreende de maneira fria: -Nossa Fabricia! que forma triste de ver os outros.

Fabricia levanta-se rápido e senta-se na cama fitando Mirabela com um olhar assustado como se acabasse de ter uma grande idéia.

- Sabe Mirabela; eu acho que o Santiago pode ser uma forma de fugir desta cidade inútil. Acompanha o meu raciocínio: você se casa com ele ,vai embora desta droga de cidade e me leva junto.

Mirabela fita-lhe um olhar de compaixão e esboçando um leve sorriso acaricia-lhe os cabelos dizendo-lhe: - para com isso Fabricia, você não sabe o que diz.

- Você é uma idiota Mirabela! Eu odeio esta cidade e esta gente pobre e ignorante. Se tivesse uma oportunidade, nem pensaria duas vezes, sumia daqui. Eu gosto de coisas bonitas, pessoas chiques e grã-finas,conhecer novos ares.Enfim, o que eu queria mesmo era sumir daqui.

Ouvindo aquilo Mirabela apenas dirige-lhe um olhar reprovador, depois sai, deixando-a sozinha no quarto.

Fabricia era o tipo de garota revoltada com tudo. Seus pais eram muito simples, tinham um pequeno bar que muitas vezes deixavam-a tomando conta. Ela odiava aqueles homens bêbados e aquelas pessoas da redondeza. Assim como toda a cidade. As pessoas que a conheciam não a suportavam, achavam-a muito pedante e nociva. não tinha amigos, a única que ainda a suportava era Mirabela. Fabricia também era falsa. Quando precisava de alguma coisa tratava sua vítima com falsidade até conseguir o seu objetivo. Vivia se enfiltrando no meio de algumas garotas da sua idade sem ser convidada. Apenas para se exibir dizendo que tinha amigas, quando na verdade espantava as pessoas com sua presença. Fazendo com que uma a um saísse de fininho.

No dia seguinte Mirabela sai para trabalhar muito cedo, sua mãe a senhora Albertina a chama para tomar café.

- Não vai dar mãe! Tenho uma cliente me esperando. Ela vai viajar para comparecer a um noivado e levará umas flores para a noiva.

- Será mesmo verdade? por acaso você não vai se encontrar com aquele rapaz?

Ela beija a mãe carinhosamente dizendo-lhe: - A senhora sabe que eu não minto . A mentira é um dos piores pecados.

E quando ela sai, dona Albertina põe-se a pensar com os olhos rasos de lágrimas. Pensava no espôso, o senhor Ulisses que Mirabela acreditava está realmente morto. Há alguns anos o senhor Ulisses desaparecêra, sabe Deus para onde. Na época Mirabela deveria ter um pouco mais de onze anos. Ele havia saido em busca de trabalho e não mais voltado. Naquele tempo o desespero tomou conta daquela familia. A senhora Albertina e sua mãe dona Lázara anunciaram o desaparecimento do senhor Ulisses nos principais jornais da cidade. Vasculharam pelos quatro cantos da cidade, espalharam fotos por pontos de ônibus, estabelecimentos comerciais, hospitais, etc. fizeram apêlos nas emissôras de rádio mas foi tudo em vão. Nenhum indício, nem sombras do senhor Ulisses, nada.. Depois de algum tempo ela disse á filha Mirabela que o pai havia morrido no mar e ninguem havia conseguido encontrar o corpo. Havia inventado isso apenas para acabar com o sofrimento da filha que na época não fazia mais nada na vida senão ficar constantemente no portão á inútil espera do pai..

Mirabela chorava noite e dia acreditando que o pai estaria perdido em alguma floresta, ou preso em algum lugar. A mãe e a avó tiveram então que inventar isso, porque assim ela sofrería de uma vez só. Porém ela dona Albertina não havia se conformado. Durante anos conviveu com a dor da dúvida. Onde andaria seu espôso? ou será que estaria realmente vivo? mas se estivesse por quê nunca voltara para casa? E se estivesse morto por quê nunca lhe entregaram o corpo?

A senhora Albertina vivia angustiada tendo que dividir aquele sofrimento apenas com a mãe. Ela que sempre fora uma mulher calma e serena agora tornara-se rude e agressiva devido a dor da revolta e da dúvida. Amava a filha Mirabela, porém não conseguia de forma alguma demonstrar este amor, nem pela filha e nem por nada ou ninguém.

A mãe dona Lázara acreditava que aquele comportamento mudaria no dia em que a filha encontrasse alguma resposta concreta para o súbito desaparecimento do esposo. Como era costureira, tentava muitas vezes buscar refúgio no trabalho, o que nem sempre conseguia. E enquanto encontrava-se debruçada por sobre a janela com o olhar perdido em direção a longa estrada de barro vermelho sempre na expectativa de ver o espôso um dia chegar de repente; ela não percebe a presença da mãe que se aproxima devagar.

- Pensando na vida Albertina?

- Sabe muito bem em quem estou pensando!

Aquela situação sempre incomodou a senhora Lázara que sente-se constrangida todas as vezes em que encontra a filha naquela situação. Pensativa e triste. E numa tentativa de consolar a filha ela dá voltas com sua cadeira e lhe diz: - Albertina, já está mais do que na hora de dar este caso por encerrado. Há anos o Ulisses sumiu. Se houvesse algum sinal de ele está vivo há muito tempo que estariamos sabendo. A policia tomou conta do caso na época.Os jornais , os meios de comunicação, todos divulgaram as fotos dele. É evidente que alguma resposta nós teriamos se ele estivesse vivo.

- Tudo bem mamãe! e se ele morreu, onde está o corpo? por que nunca apareceu?

- Não se sabe filha. Eu sei o quanto é dificil conviver com a dor da dúvida, mas o que não tem remédio remediado está. Todo o seu sofrimento de nada vai adiantar. Você vai acabar despertando a atenção de Mirabela.

Ouvindo aquilo a mulher é tomada por uma revolta incontrolável e impaciente anda de um lado a outro com as mãos por sobre a cabeça.

E com um olhar de ira para a mãe ela se descontrola:

- Mirabela, Mirabela! por quê eu tenho que pensar sempre nela? e quem pensa em mim? quem vê o meu sofrimento? A Mirabela já está crescidinha para saber das coisas. Qualquer dia eu conto a ela que ninguem sabe nada sobre o paradeiro do seu pai. Que ele pode está vivo.

A senhora Lázara se desespera ao ouvir aquilo e empurrando a cadeira para bem em frente a filha a adverte irritada: - Não faça isso Albertina. Sequer pense em fazer isso!

- Sabe mamãe: de vez em quando a senhora me surpreende.Como pode uma pessoa que se diz tão religiosa como a senhora aceitar a mentira?

- Albertina entenda: não é questão de aceitar ou deixar de aceitar a mentira. É mexer com o que está quieto. Esta menina sofreu muito na época e você fazendo isso vai começar tudo outra vez. Entenda: a Mirabela já está conformada com a suposta morte do pai. Deixe tudo como está e procure esquecer isso você também. Tudo isso só te faz mal minha filha. Quantos casos existem por este mundo afora? quantas pessoas não estão desaparecidas? inclusive crianças. Mas as pessoas têm que tocarem suas vidas em frente. A vida tem que continuar.

A senhora Albertina balança a cabeça negativamente e enquanto esfrega o rosto com as duas mãos num gesto desesperado se dirige á mãe ironicamente: - Muito obrigada mamãe! que belo consôlo.

Mais tarde Santiago aproxima-se de Mirabela e puxando uma de suas flores beija-a e a entrega:

- Uma rosa para uma rosa.

- Oi Santiago.

- Mirabela vim lhe fazer um convite.

- Um convite?

- Amanhã será o aniversário do filho de um amigo do meu pai. Ele vai dar uma festinha e eu gostaria que você fôsse comigo.

Ela porém balança a cabeça e sorri olhando para o alto:

-Meu Deus! você deve está louco. O que eu iria fazer no meio de tanta gente rica? já pensou o vexame? eu não vou saber o que fazer, o que dizer e... eu nunca me sentiria bem...

...- Mirabela eu estou convidando. O aniversariante é praticamente um irmão para mim. Ele me tem muita consideração e não irá se importar com a sua presença. Muito pelo contrário até ficará feliz por ter uma moça tão linda em sua festa.

greice
Enviado por greice em 29/01/2010
Reeditado em 07/02/2011
Código do texto: T2058426