"STARTING ON BRAZIL"

São Paulo, 2012

Laboratório da USP

– Tem certeza, professor? Perguntou Albert, cujo nome fora especialmente escolhido para tornar-se um grande cientista. Na verdade a intenção de seu pai não deu muito certo. O jovem não passava de um esmerado aluno.

– Caro Albert. Nem tudo que se lê nos quadrinhos é de jogar-se fora.

– Não entendi.

– Presumia. Mas provavelmente já deve ter lido ou visto os filmes do homem-aranha. Aconselho. São muito bons para ciência. Eles comprovam a necessidade de os próprios criadores testarem suas invenções... Para que dar poder para alguém, se podemos tê-los para nós... É certo, corremos riscos... Também devemos ser beneficiados com os bônus... Não acha?

– Não sei...

O professor Gutemberg esperava por essa resposta. Aliás, foi a cada “não sei” que Albert foi conquistando a confiança do mestre. O jovem inclusive tinha boas notas só por causa desta confiança que o transformou em auxiliar do professor nos assuntos extracurriculares.

Na prática isto não lhe ajudava muito. Não recebia salário, as notas se mantinham medianas, não lhe dava popularidade – ao contrário – e ainda lhe tomava grande parte de seu tempo. Fazia isto mesmo pela falta de qualquer coisa melhor. O professor era a única pessoa a trocar com Albert mais que meia dúzia de palavras. Quase sempre ordens.

O professor por sinal não era nada ortodoxo. Suas atitudes eram um tanto quanto suspeitas. Além de Albert ninguém mais conhecia os seus experimentos na Universidade. Tarefas que faziam em horários nada habituais, normalmente após a meia-noite. Dava aula em três períodos, e isto lhe auxiliava com o álibi para uso tão tardio do laboratório. E Albert lhe acompanhava no meio e nos finais de semana. Sempre alerta.

Passavam das duas da manhã de um sábado, em que provavelmente os colegas de Albert divertiam-se em alguma balada. Ele estava no laboratório, auxiliando o professor. Como nos demais dias dormira á tardinha para poder acompanhar o pique do homem que dormia apenas duas horas por dia. “Perder um terço de vida é desperdício.” Dizia ele.

Mas a filosofia que o levava até aquela noite era outra. “Como pode? Mesmo nossos gênios não usufruir mais que dez por cento de sua máquina encefálica!” Esta pergunta irritava-o. Instigava-o. E como tal qualquer invento da humanidade, a pergunta serviu de combustível para seu invento, assim como a necessidade da energia instigou a Thomas Jeferson, ou a relatividade fez Isaac Newton famoso.

E todo cientista é por natureza deslumbrado como a qualquer pai a admirar sua prole. Para um leigo aquela sala azulejada não parecia ser o berçário de uma invenção capaz de mudar a humanidade. Uma cadeira, muito próxima a que encontramos no consultório do dentista, uma dezena de computadores ligados, com luzes coloridas sempre a piscar e gráficos que se alteravam a cada segundo. E claro, o grande segredo, uma capacete prateado, cheio de fios e conectores, plugado via USB a um servidor central, onde estaria seu software milagroso.

– Tem certeza que quer arriscar, professor?

– Claro. Se não estaríamos aqui Albert. Você sabe, é pelo bem da ciência.

– Mas pode ser perigoso... E... Se algo der errado, e eu não souber o que fazer...

– Nesse caso, puxe o fio da tomada... Se não der certo, poderá consolar-se que ao menos tentou.

Albert revelava em seus olhos sua preocupação. Ao menos ele compreendia por quantos anos Gutemberg trabalhara em todo o projeto do Acelerador Neural, com o qual pretendia elevar a capacidade de uso do ser humano de sua capacidade cerebral. Tinha o professor que chegasse a tal feito, seria a forma elementar de responder questões existências, que não foram respondidas nem pela bíblia, pela ciência, ou pelo Guia do Mochileiro das Galáxias.

– Sente-se naquele computador, e acompanhe todos os cálculos. Disse o professor enquanto acoplava os últimos neurotransmissores em seu crânio.

A missão de Abert era simples. Em seu computador conectado a um servidor hackeado, acompanharia o upload das informações contidas no cérebro do professor que pretendia no máximo conectar-se por dez minutos ao software do acelerador neural. Apenas isso.

Já o acionamento de ignição foi feito pelo próprio dedo do cientista. E ele não estava preparado. No mesmo segundo um choque de informações estremeceu seu corpo, e sua visão difusa viajava a velocidade da luz entre dados e números que dançavam a sua frente. Códigos de DNA surgiam como mera soma de dois mais dois, e no cérebro de Gutemberg no mínimo cinco maneira diferentes de se chegar á bomba atômica tinham sido desvendadas.

Seus olhos habitavam então outro ambiente. Mais elevado. O que lhe fez esquecer o mundo físico, e a necessidade de desligar o aparelho. Diz-se que o poder gera-se pelo conhecimento, e Gutemberg era embriagado por uma sede incontrolável de poder... E cada nova descoberta para uma pergunta existencial, ele buscava por mais... Cada vez mais dados...

Aquela altura tinha-se desvendado as origens da AIDS, e a sua vacina. Quebrado os códigos de genoma que causavam o câncer, e até mesmo frivolidades como a constatação cientifica de onde exatamente ficava o ponto “G”. O professor queria ainda mais...

Albert acompanhava a tela de cristal líquida com atenção. Nos primeiro minuto inicial o primeiro servidor completou cem por cento. Automaticamente um outro servidor foi hackeado, e assim sucessivamente todos os servidores interligados foram corrompidos pela necessidade dos bilhões de terabytes produzidos através da aceleração mental do professor, que mantinha-se sereno sobre a cadeira, e com um sorriso vitorioso.

Albert não notou nenhuma anomalia. E mesmo as duas ameaças de queda de energia não lhe deram alerta que algo ia mal do lado de fora do laboratório. Logicamente com tantos servidores usurpados, algo ruim estava preste a acontecer.

E aconteceu.

“Do you confirme?” piscou em vermelho. Albert olhou para o professor e seu sorriso glorioso. Não havia nada de errado. O experimento era um sucesso.

Havia duas alternativas. Seu dedo sem titubear teclou. “Yes”.

Bombas atômicas começaram a explodir. Estados Unidos. Israel. Rússia. Iran. E pasmem, até no Brasil, num secreto laboratório na Amazônia. As cinzas cobriram em horas todo o planeta, e a última lembrança de Albert era o regozijo na face de Gutemberg. O único homem a conhecer todos os segredos da humanidade.

Douglas Eralldo
Enviado por Douglas Eralldo em 04/05/2010
Código do texto: T2236176
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