O amor de 100 anos - Parte I

A praça daquela cidade estava bem movimentada à noite. Pais com seus filhos passeiam tranquilamente e a única movimentação a mais são os próprios filhos que se divertem nos brinquedos localizados mais ao centro da praça. Contudo, em um canto isolado e um pouco menos iluminado que o restante do local está um casal sentado, ela em uma ponta do banco e ele na outra. A garota parece estar com os olhos inchados e o tempo todo enxuga para novamente chorar mais.

- Parece que não vai ter jeito mesmo. Tentamos... Mas parece que depois de tanto tempo não conseguimos nem mais conversar.

Ele apoiando a cabeça sobre o cotovelo e o cotovelo sobre o braço do banco olha para a igreja ao fundo e apenas ouve, e por várias vezes tentou resolver para não ter que ouvir mais.

- O que você quer que eu faça? Ou melhor... Eu fiz! E fiz muito. Pelo menos tentei fazer. Pelo jeito é melhor cada um seguir seu rumo, seu tempo e sua vida.

Ela olhou e em silêncio ouviu mais uma vez aquilo que ele já dissera outras tantas vezes. Levantou-se e ficou de frente para o não por muito tempo namorado.

- Bom... Então acho que é um adeus, né? Pode pelo menos me dar um último abraço?

Levantou-se também e ficou encarando-a em silêncio. Estendeu os braços, mas vacilou. Ela olhando apreensiva não fez movimento algum. Novamente levantou os braços e trêmulo abraçou, agora, a antiga namorada.

- Adeus, Jéssica!

- Adeus, Carlos. Não queria dizer isto... Desejo tudo de bom para você! Independente do que vier acontecer conosco, você sempre estará comigo.

A garota muda e triste cruzou a praça e atravessou por entre crianças alegres e barulhentas, e virou a esquina à esquerda.

- Não é justo! Mas acho que foi o melhor. Tanto eu quanto ela estávamos nos machucando muito.

Cruzou a praça também e virou a esquina à direita. O rapaz caminhou até chegar à sua casa que tinha comprado há pouco tempo. Abriu a porta e acendeu a luz da sala jogando a chave sobre uma mesinha ao lado da porta. Dirigiu-se até o sofá e sentou pesadamente fechando os olhos.

- Por quê? Comigo as coisas funcionam assim mesmo!?

Olhou em cima da estante à sua frente e viu a foto de ambos, a primeira vez que se encontraram, em um porta-retratos. De pé olhou fixamente de longe esfregando os olhos vermelhos de cansaço. Carlos foi até o quarto pegar a coberta e travesseiro e voltou para a sala.

- Hoje vou dormir aqui! Aquele quarto está vazio demais. É... Mas vou ter que acostumar com a ausência dela, que pelo visto vai ser para sempre.

Deitou, ajeitou o travesseiro no braço do sofá e se cobriu. A coberta também tinha que acostumar com a ausência de um corpo. Era pano demais para pouca gente. Carlos ligou a TV e deixou o som baixinho. Seus olhos começaram a piscar e logo estavam fechados. A briga com a mente foi perdida, e não tinham motivos para ficarem abertos. Jéssica com seu sorriso meigo não estava mais à mostra.

- Olá! Você demorou muito! Faz tempo que tento falar contigo,

mas quando acho que vou conseguir você some...

Carlos olhou o que parecia ser Jéssica de longe. Aproximou e seu rosto começou a ficar mais visível. Ela estava com um vestido de espumite rosa evidenciando seus contornos perfeitamente.

- Jéssica?! Por que está vestida assim? E que lugar é este?

- Seu bobo... Não reconhece esta praça? É a mesma que você está acostumado passar todos os dias.

Contudo, a voz da garota soava diferente. Uma áurea de matéria branca a contornava. A praça era a mesma, mas não a mesma que Carlos conhecia. Havia prédios altos em seu entorno e o céu era fatiado por fileiras de objetos ovalados de cor metálica reluzente que iam para todos os lados.

- Jéssica, não estou entendendo... O que é isto? Em que ano estamos?

Carlos olhava apreensivo para a jovem e dentro de seu próprio sonho pedia para seu subconsciente acordá-lo daquele cenário amedrontador.

- Oras! Estamos em 15 de outubro de 2113.

Ela sorriu com os braços para trás e desapareceu em seguida. Carlos em um engasgo de ar acordou suado e ofegante.

- Meu Deus! Como se não bastasse tudo o que ocorreu hoje, até nos sonhos eu me ferro...

Aquela noite não seria fácil dormir. O corpo dizia: Durma! Eu preciso descansar... Não sou robô! A mente respondia: Claro! Fique à vontade, mas não quero ter que ver aquelas cenas novamente. No relógio da parede lateral esquerda da sala, o ponteiro andava mais lento que o normal.

Chronus
Enviado por Chronus em 11/05/2013
Reeditado em 14/08/2013
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