Legado de Maltz

Nosso módulo de escape descreveu curvas sinuosas enquanto rumava descontrolado em direção ao planeta Nakvo.
Chamo-me Rodriguez e até dez minutos atrás era capitão da nave “The Shepherd”, da qual acabamos de escapar eu e a tenente Cameron, após nossa nave ter sido tomada de assalto por forças inimigas. Eu ativei os explosivos e detonei a nave com Maltz e sua superiora Diane à bordo. Finalmente fiquei livre daquela prostituta maldita. Anos de perseguição finalmente se extinguiram. Recostei-me no estofado e suspirei aliviado, não tivesse sido do jeito que fora e eu poderia até sorrir. Ganhei minha vida de volta, mas perdi muitos homens nessa emboscada. Só Cameron restou da tripulação.
Ela deu um gemido enquanto pressionava a ferida onde fora alvejada. Talvez nem ela sobrevivesse, se caíssem em algum dos muitos desertos descivilizados seria a morte para ela. Se o pouso fosse muito distante de Ne’eVa, a capital do planeta, não sei se poderia encontrar os recursos necessários para fazê-la sobreviver. O atirador não conseguira alvejá-la em um ponto vital, mas a verdade é que Cameron precisava de cuidados médicos urgentes.
Eu estava com esta sorte de pensamentos quando o módulo de escape começou a ranger como um velho galeão. Isso só poderia significar uma coisa, um conflito gravitacional. Estávamos na trajetória de Nakvo, mas alguma outra força gravitacional começou a nos puxar em sua direção.
Olhei pela pequena escotilha e a silhueta da nave de Diane se desenhou contra o vácuo. Mesmo depois da morte os ecos de seu último grito ainda me perseguiam.
— Prepare-se, seremos acostados contra a nave inimiga.
Cameron assentiu. Eu já imaginei os soldados com suas armas apontadas para nós, nos escoltando para o fundo de sua prisão sem gravidade onde os prisioneiros são mantidos com racionamento de oxigênio, para evitar fugas. Poderiam eles imaginar que Diane pudesse estar dentro daquele módulo? Cameron sacou sua arma:
— Vamos mandar o máximo desses malditos pro inferno e acabar de uma vez por todas com isso...
Eu também não queria viver pra sempre, menos ainda ser torturado por aquela corja. Ajudei Cameron a colocar o capacete de seu bio-traje e coloquei o meu, recarreguei a arma e fiquei esperando pela abertura da escotilha. Com um baque surdo o módulo acostou na doca do cruzador. O computador do módulo informou que estávamos ancorados com sucesso na doca 23 do Cruzador Titã Classe 7.6 de nome Cronos. Aguardamos na expectativa de sermos abordados, mas o silêncio foi nosso companheiro por mais de quinze minutos. Algo estava errado, uma hora dessa já deveríamos estar nas mãos de algum androide torturador.
A escotilha estava voltada para o espaço, não para o lado da nave. O brilho vermelho de Nakvo irradiava em minha direção. Informei ao computador do módulo que iríamos abrir a escotilha. A mesma abriu silenciosamente e o que pude ver na doca 23 me arrepiou. A doca se parecia com um abatedouro de animais, havia sangue e pedaços de carne por toda parte. Perigo biológico detectado, informou o computador de bordo do módulo. Nossos bio-traje iriam garantir nossa sanidade. Não restava nenhuma nave na doca, o que quer que matou esses infelizes, os matou enquanto eles estavam tentando escapar. Talvez por isso queriam o módulo, precisavam de um meio de fuga. Mas o módulo teria que ser transportado até alguma plataforma de lançamento, e eu não estava vendo nenhuma naquela doca, talvez em outra doca houvesse, mas o computador tenha nos encaminhado para a doca errada. Meu Deus! Que maldição poderia ter se abatido sobre essa gente! Diane era uma vaca maldita e o doutor Maltz um sádico pior ainda, o que o maldito aprontou dentro dessa nave? E quem teria nos encaminhado até aqui?
Olhei para Cameron, o seu ferimento não vazava mais sangue. Nesse momento me dei conta que ela ficara exposta ao agente biológico enquanto eu tentava descobrir o que acontecera nesta nave.
— Cameron? — eu chamei, mas ela não respondeu, parecia alheia, girando a cabeça em movimentos desordenados e lentos. Soltei o cinto que me prendia ao módulo e desci para a doca, os olhos atentos em Cameron, que ainda estava presa ao cinto.
Havia uma porta em uma das extremidades da doca, e um corredor no centro da peça. Ao lado da porta do corredor um painel piscava intermitentemente. O silêncio do vácuo reinava absoluto sob o assoalho sujo de sangue. Caminhei para a porta onde piscava o painel. O som de meus passos ecoou pela doca. Havia mais alguém naquela lata velha, o maldito que me trouxera até aqui, ele queria se comunicar comigo através daquele painel. Sua mensagem dizia:
Aviso: perigo biológico! Agente viral inicializado. A infecção é feita pelo ar, após infectado o paciente perde o controle dos membros, o segundo estágio é a demência e agressividade, apenas as zonas mais básicas do cérebro se mantém ativas, regressão ao estado de fera. Em alguns pacientes pode haver mutações genéticas após algum tempo. Não tire o bio-traje. Compareça à ponte de comando seguindo os painéis que irei lhe acender no caminho.
Olhei para aquela mensagem puto da vida. Cameron, minha última tripulante, parece que estava infectada com aquele vírus, eu precisava chegar até a ponte pra quê? O único motivo que vinha à minha mente era dar um fim naquele verme que me tirara da rota para Nakvo.
Quem é você?
O comunicador piscou por alguns segundos:
Saia daí pelo corredor em direção Norte e pegue um elevador até o deck 59. Eles estão vindo atrás de você.
Fitei o módulo de escape uma última vez, pensei em voltar por Cameron, poderia acreditar no que aquele cara dizia? Mas os corpos espalhados pareciam confirmar meus temores. A tela me chamou a atenção novamente:
FUJA IDIOTA
Nesse momento uma turba ensandecida entrou pelo outro lado da doca, pela outra porta que eu acabara de avistar. A porta do corredor se abriu à minha frente e entrei por ela correndo. — Fechar módulo! — gritei, na esperança de que caso Cameron ainda não esteja perdida para sempre, permaneça a salvo da multidão alucinada. O computador de bordo me ouviu, pois pude ouvir o fechar da porta atrás de mim em meio dos gritos. Olhei para trás e estavam bem perto de mim, os olhos injetados, babando e gritando sons desconexos, mostrando os dentes e rosnando. Alguns apresentavam tumores expostos no pescoço e na face. Á minha frente um extenso corredor dava acesso a várias câmaras. Em algum lugar à frente deveria estar o elevador. Peguei uma granada de luz e modulei o visor, esperava cegá-los e desorientá-los por alguns segundos, o que me daria uma vantagem. Joguei o artefato para trás e ouvi o som da explosão, então um urro sinistro em uníssono demonstrou que aparentemente os infectados foram retardados. À minha frente um cara surgiu, ele olhou para mim e ergueu as mãos, então se jogou em minha direção com toda sua fúria. Apontei a arma para frente enquanto corria e disparei uma rajada que o despedaçou e furou a parede de metal.
Uma luz piscando ao meu lado me alertou para o elevador. Entrei nele de chofre e apertei o botão 59. Respirei fundo e me preparei para a abertura da porta no respectivo andar. Quando a porta se abriu me vi na entrada de um corredor em formato hexagonal, onde muita sujeira e fumaça atestavam que sérios danos foram feitos ao cruzador. Uma porta estava selada a alguns metros à frente, e entre mim e a porta os restos de uma criatura nos tons salmão jazia despedaçada. Voltei ao elevador e travei-o naquele andar. Não gostava do que estava fazendo, mas não via outra alternativa: precisava chegar até a ponte de comando, nem que fosse para tentar descobrir uma plataforma de lançamento do módulo para dar o fora daquela lata velha contaminada. Se a notícia do perigo biológico vazasse, esse cruzador seria colocado em quarentena, e provavelmente todos à bordo seriam mortos. Eu precisava tirar minha velha bunda dali antes disso acontecer.
Com uma granada gravitacional em uma mão e minha pistola na outra, dei o comando para abertura da porta selada. Quando ela se abriu pude ver que o corredor se projetava por mais uns quinhentos metros até a porta da Ponte de Comando, assinalada com o símbolo do baronato de Diane, uma colmeia. Mas entre mim e a ponte me aguardavam cerca de trinta infectados, utilizavam as roupas da tripulação que comandava a nave. Sem pensar eu apertei o botão e lancei a granada gravitacional, me virei para o controle da grossa e pesada porta que acabara de abrir e apertei o botão para fechá-la novamente. Corri de volta para o elevador e me preparei para apertar algum andar caso o mini buraco negro chegasse até mim. A forte porta selada abafava o som dos monstros sendo engolidos pela bomba gravitacional. De repente a grande porta selada foi tragada de uma vez, desaparecendo para sempre. Eu contava mentalmente até dez, o tempo que o buraco negro levaria para forçar uma dobra espacial e desaparecer dali num flash. Nove... Tentei apertar o botão de algum andar, mas o vórtice me sugou de uma vez, eu bati contra a parede do elevador e me vi projetado no ar como se caísse de um prédio, mas me deslocava na horizontal e não na vertical. Fixei os olhos no vórtice onde desapareciam carenagem, sujeira, poeira, e qualquer coisa num raio de duzentos metros. Vi um cara sendo sugado por ele, os olhos fixos em mim, as mãos crispadas em minha direção. Dez. O buraco negro desapareceu, e quando eu vi que começaria a queda retirei o lançador de minhas costas e disparei um gancho atado à uma corda de vibralite. O gancho passou rápido pelo ar rarefeito e penetrou na carenagem da nave a uns cinquenta metros acima. Esperei o tranco e joguei meu corpo para a frente descrevendo um arco até a beirada destroçada de um deck. Agarrei um duto que percorria a carenagem e subi para o corredor. As luzes piscavam de forma intermitente, havia fumaça por todo o ambiente, e o som de metal contra metal. Comecei a andar pelo corredor em busca de um elevador, a arma em punho pronta para me defender, e foi nesse momento que a criatura apareceu saindo da escuridão. Os tumores que eu vira em outros sujeitos cresceram de tal forma nesse indivíduo que o deformaram completamente. Além disso, estruturas ósseas se desenvolveram, de maneira randômica, por toda a face, emprestando-lhe um aspecto repugnante e alienígena. Os olhos sedentos de sangue brilhavam, incrustados naquela terrível face espinhosa e deformada. As mãos estavam alteradas e um osso pontiagudo se projetava do punho, como uma garra desenvolvida pela natureza maquiavélica do vírus Maltz. A anomalia biológica se projetou em minha direção com essas garras erguidas, pronta para dar o bote. Sem minha pistola eu me desviei e corri pelo corredor até a sala mais próxima, uma sala da manutenção. No chão diversas ferramentas estavam espalhadas, tendo caído provavelmente de um dos muitos armários que estavam embutidos na parede. O ser estava a dois passos de mim, urrando sons desconexos. Eu podia sentir seu hálito podre atrás de mim. Me abaixei e agarrei uma ferramenta semelhante à uma chave inglesa e num giro de cento e oitenta graus ataquei a criatura, mas ela aparou o golpe com a garra direita e preparou a esquerda para me acertar. Com a mão livre puxei o pino da granada de luz e me joguei no chão para esquivar-me da garra ensanguentada da anomalia. Gritos em algum ponto abaixo indicava que a turba me seguia pelo cheiro. Caí e rolei tentando me manter longe de meu agressor. A granada de luz estourou com um estrondo e banhou todo o ambiente com a luminosidade de dezenas de trovões. Meu capacete protegeu meus olhos da luz cegante, e enquanto a criatura gritava e andava às cegas, eu corri até o cômodo adjacente e busquei um corredor, que me levou até uma escotilha que guardava as escadarias que o pessoal da manutenção utilizava para efetuar a limpeza dos dutos de ventilação e outros setores da nave. As escadas estavam vazias. Grandes algarismos azuis pintados na parede informavam qual era o deck. Estava no deck 51. Corri até o deck 59 e não sem alguns contratempos atingi a Ponte de Comando.
Quando entrei na Ponte havia um homem apontando uma pistola para mim:
— Capitão Rodriguez?
Assenti com a cabeça. O traje em que eu estava era a garantia de vida na Cronos, mas também me tornava incógnito. O capacete com as linhas de três espelhos verticais nos tornava a todos iguais. Perguntei como ele descobriu que era eu por trás do traje.
— Parece que o seu computador de bordo não é muito bom com segredos. Meu nome é Caim, mas pode me chamar de K. Se você é capaz de perguntar alguma coisa é por que não está infectado.
Ele abaixou a arma e eu me sentei na poltrona de comando, observando Nakvo ao longe.
— Como você não está infectado? — quis saber.
— Eu trabalhava com o doutor Maltz, consegui me inocular um antídoto a tempo. O vírus Maltz é muito poderoso, a obra-prima de seu criador.
Desconsiderei a frase final e perguntei se havia um antídoto.
— Na verdade, o vírus não seria capaz de sobreviver em uma temperatura maior do que trinta e cinco graus se estiver exposto aos raios ultravioleta de uma gigante vermelha como Stele, o astro que domina Nakvo.
— Mas você tem o antídoto? — perguntei, preocupado com Cameron, ainda presa no módulo de escape.
— Não. Só havia o suficiente para uma ampola. Mas em Ne’eVa eu seria capaz de produzir o antídoto em larga escala nos laboratórios locais.
Apreensivo eu fitava o planeta avermelhado no horizonte, conjecturando se poderia confiar em K.
— A morte de Maltz disparou o vírus?
— Sim. Não sei o que aconteceu na Shepherd, mas assim que a nave explodiu, o vírus foi liberado no sistema de ar condicionado da Cronos. Esse vírus era um projeto de arma biológica que acabou engavetado por ordem da corporação. No entanto Maltz parece que nunca desistiu dele, e o manteve secretamente nesta mesma nave até sua morte.
Ante meu silêncio ele acionou alguns controles e a holo-tela à frente exibiu a imagem captada por uma câmera dentro do módulo de escape. Cameron estava pálida como um cadáver, e parecia dormir.
— Ela está em estado criogênico. Ficará assim até receber o antídoto em Nakvo. Agora preciso que você pilote esse cruzador até Ne’eVa para que possamos salvá-la e acabar com esse vírus de uma vez por todas.
Não havia escolha. Acionei os controles de navegação e direcionei a Cronos para a região desértica de Nakvo que estivera na semana passada em uma missão de investigação. Se era raios ultravioleta e calor que era preciso para matar aquele vírus maldito, não havia lugar melhor do que Basamortu, o deserto equatorial de Nakvo. A entrada na atmosfera seguiu sem imprevistos, mas alguma coisa me dizia para não confiar em K. Fui até ele e peguei a arma de sua mão com um movimento brusco e rápido, apontando a arma em seguida para ele, que recuou e disse que era apenas um homem lutando por sua sobrevivência, assim como eu. Mas fomos interrompidos pelo som dos alto-falantes, as autoridades de Nakvo detectaram risco biológico no Cruzador Titã Classe 7.6 Cronos e não iriam permitir o pouso no planeta. Pedi permissão para pouso no deserto de Basamortu, informando que o vírus não sobreviveria no deserto mais hostil de Nakvo.
— Nossas leituras indicam apenas um tripulante não infectado — informaram. Eu olhei para K. Um de nós dois estava condenado, e com certeza não era eu. Mirei entre os olhos dele.
— Eles mentem. Só eu posso salvar sua companheira — ele informou, buscando deixar claro qual pretexto o deixaria vivo.
— Não haverá novo aviso, saiam de nossa atmosfera ou serão destruídos.
— Estamos retornando ao espaço — informei. Dei os comandos necessários para retornarmos e me virei para K.:
— Não há o que fazer, se prosseguirmos seremos aniquilados. Eu não tenho perícia o suficiente nesta classe de nave para conseguir efetuar as manobras evasivas que precisaríamos para ter uma chance com esses caras.
— Tem razão — ele concordou, com as mãos na cabeça. — Mas nosso laboratório foi completamente destruído e preciso de instalações com o mínimo de recursos necessários para ativarmos o soro.
— Talvez se conseguirmos alcançar Ilárgia, a lua exilada de Nakvo.
— Mas é uma lua inabitada.
— Não, nós temos uma base secreta em Ilárgia. É uma pequena cidade administrativa da qual gerimos esse setor.
Assim que deixamos a atmosfera de Nakvo, determinei que a Cronos estabelecesse sua rota para a pequena lua Ilárgia, chamada de lua exilada devido a força da gravidade da gigante vermelha Stele forçar sua trajetória elíptica a uma distância tão grande de Nakvo, que na prática o satélite não passava de um ponto no céu de Nakvo, como tantos outros.
Enquanto rumávamos para Ilárgia eu desativei a saída de voz do bio-traje e pedi ao seu computador que fizesse uma varredura em K. em busca de agentes biológicos perigosos. A afirmação que havia apenas um infectado na Cronos me perturbava, e eu queria tirar isso a limpo. Para minha surpresa o computador informou que K. não era um organismo biológico, mas sim um androide classe K. Nesse momento eu peguei a pistola que repousava sobre a mesa, me virei para ele e disparei contra seu peito. O estrondo fez a Ponte tremer e o androide foi arremessado contra a parede do outro lado. Caminhei até ele. Do rombo em seu peito seus fluidos vazavam pelo chão. O tiro no peito desativou suas funções motoras, ele mal podia falar e mover os olhos. Olhos que me fitavam do chão:
— Eu estava aqui para garantir que o legado de Maltz alcançasse toda a Galáxia. Em Nakvo o vírus se desenvolveria nas condições ideais e daquele buraco conquistaria os mundos.
A última coisa que queria ouvir naquele momento era a ladainha de um cara-de-lata. Num átimo mirei entre seus olhos e o disparo espalhou seus circuitos pelo chão. Voltei até a cadeira de controle e procurei pela doca 23. As imagens mostravam a mesma bagunça que eu encontrara antes, mas o módulo de escape havia desaparecido. Em busca pela gravação de vídeo vi um robô de carga se aproximar e com muita dificuldade empurrar o módulo para a borda da doca, então as escotilhas se abriram e o módulo com Cameron em criogenia foi lançado no vácuo. Um plano B para o vírus Maltz, talvez.
Estava em uma situação muito ruim. Precisava destruir o vírus e salvar minha vida, e estava difícil de descobrir um meio de fazer as duas coisas. Alterei a rota da Cronos, o Cruzador Titã Classe 7.6 passaria ao largo de Ilárgia e seguiria então para o coração de Stele, se desintegrando na gigante vermelha.
Visualizei as plantas da nave e encontrei em um deck acima, uma escotilha da manutenção, voltei para o duto de ventilação e acedi à escadaria da manutenção, por onde viera. Mas a criatura que me perseguira antes estava ali, liderando uma turba de infectados, apenas um deck abaixo. Eu comecei a subir a escada e ao chegar na escotilha que dava para o corredor, a encontrei emperrada. Olhei para trás e lá estava ele, joguei uma granada com a mão esquerda enquanto a pistola o acertava em cheio na cabeça. A granada passou sobre sua morte e explodiu contra a turba atrás de si, num estrondo ensurdecedor, levando para o inferno a escadaria e os infectados. Fiquei seguro sobre o ferro retorcido e forcei a alavanca. Com um rangido surdo a porta se abriu. Olhei para baixo, e dois decks abaixo uma massa de ferro retorcido e carne queimada gemia, exalando um odor putrefato. Passei para o corredor que conduzia à escotilha externa e travei a porta atrás de mim. Fui até a escotilha de manutenção e entrei na sala de despressurização. Meu bio-traje era capaz de me sustentar no espaço por mais vinte e seis horas. Podia ver Ilárgia se aproximando pela janelinha da escotilha. Abri a escotilha, pedi proteção à Deus, e me joguei no espaço como se pulasse de paraquedas. Corrigi minha rota soltando algum gás comprimido no reservatório da bota e contemplei as crateras negras na pele branca daquela lua. Ilárgia para muitos não era nada, mas para mim era a única coisa que me restou no Universo.
 
Mauricio R B Campos
Enviado por Mauricio R B Campos em 03/03/2015
Código do texto: T5157010
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