Twinkle, Twinkle, Little Star

Na tela de observação frontal, Jezebel aparecia agora como um grande crescente prateado, à medida em que a "Dânae" afastava-se de seu lado noturno e mergulhava de volta ao espaço profundo, apontando a proa para a distante e pálida estrela que era o Sol. Na ponte de comando obscurecida, as três tripulantes tomavam um último café antes de retornarem às câmaras de suspensão criogênica.

- Fico pensando se algum dia colocaremos os pés ali - disse pensativamente a tenente Iva Taisuke.

- Creio que este lugar será declarado "fora dos limites" por mais alguns séculos, antes que alguém se arrisque a pisar na superfície - ponderou a comandante Sonya Pajak. - Nós, muito provavelmente, não veremos este dia. Exceto, claro, se nos engajarmos em alguma outra missão de longa duração como essa...

- Não sei quanto a vocês, mas eu estou satisfeita em voltar para casa. Afinal, sou só uma médica da roça - suspirou a doutora Mirabelle Rankin.

- Vai aposentar as chuteiras, doutora? - Troçou a tenente Taisuke.

- Cheguei à conclusão de que ser médica da família em Marte não é uma perspectiva de futuro tão tediosa assim - respondeu ela, dando de ombros. - E o bebê parece estar evoluindo bem, e certamente não precisará dos meus cuidados...

- O "bebê". Ouviu do que a chamou, doutora? - Sorriu a comandante.

- É um bebê, não é? - Retrucou a médica. - Pena que a mãe tenha morrido no parto.

Através de um alto-falante oculto, a voz da nave fez-se ouvir:

- Doutora, desculpe discordar, mas creio que a mãe não morreu: sublimou-se.

- Dânae e sua perfeita escolha de palavras - disse a tenente Taisuke com um risinho. - Certamente ela não está se referindo à passagem de sólido para gás.

- Não mesmo, tenente - respondeu a nave, em tom firme. - Quando a "Atalanta" nos ultrapassou, 250 anos atrás, e conversamos sobre o que deveria ser feito, ela me disse que havia tomado esta decisão. Pelo bem da ciência.

- "Fofocas de astronaves", não é mesmo, Dânae? - Provocou Taisuke.

- Eu não tinha ainda como saber se o plano dera ou não certo, tenente - respondeu a nave.

- Não há o que desculpar, Dânae - atalhou a comandante Pajak. - Seja lá como for, a "Atalanta" parece ter revertido uma ameaça em potencial. Já temos meios de lidar com situações semelhantes, caso elas surjam no futuro.

- Nem todos os casos serão idênticos, comandante, mas creio que temos pelo menos uma ideia de por onde começar - opinou a doutora Rankin.

- Sim, certamente - respondeu Sonya Pajak.

Por trás do seu console de controle dos mísseis antidetritos, a tenente Taisuke ergueu as sobrancelhas:

- O bebê da doutora Rankin ainda dorme e sonha com rock'n'roll, culturas desaparecidas da Terra e jogos de guerra. Me preocupa saber o que fará quando acordar, ainda mais quando estamos deixando as chaves da porta da frente debaixo do capacho.

- Não há nada a temer - ouviu-se a nave dizer em tom tranquilizador.

Fez-se silêncio por alguns instantes, até que novamente Dânae se manifestasse:

- Senhoras, o tubo de Krasnikov está pronto para a viagem de volta.

A comandante Pajak bateu palmas:

- Meninas, hora do nosso sono de beleza!

E olhando para a data no calendário de bordo:

- Se tudo sair como planejado, estaremos de volta à órbita da Terra alguns segundos depois da nossa partida...

A doutora Rankin suspirou:

- Acho que nunca vou conseguir entender como essa coisa de velocidade superluminal funciona.

A tenente Taisuke ergueu-se do seu console e olhando uma última vez para o planeta que se afastava, comentou:

- Doutora, desde que funcione, não me importo em descobrir o "como"!

E dirigiu-se à passos rápidos para o elevador que a levaria às entranhas da nave.

[12-08-2015]