Amor digital

Novamente meu braço enguiçou. As vezes ele trava na junta do cotovelo, quando isso acontece eu não consigo nem abrir e nem fechar o braço. Da última vez tive que ir na Oficina do Nobuo para dar um jeito. É um velho Samsung StrongArm RX-10, não o fabricam há uns 10 anos. É o que o dinheiro de um investigador particular consegue pagar. Como consegui a oportunidade de usar tal peça de tecnologia não é da conta de vocês. Mas é isso o que sou, um investigador particular em São Paulo. Sua mulher tem um amante? Ligue para mim. Deseja encontrar alguém? Também estou por aqui. Mas não é lá algo que dá muito dinheiro.

Chove demais lá fora, uma chuva grossa e cheia de metais pesados, resultado de anos de poluição. Possivelmente o Rio Tiête transbordará novamente e eu vou ter mais um daqueles trabalhos de encontrar desaparecidos na enchente. Finalmente consegui destravar o meu braço e fez aquele som característico de motor. Meu objetivo é trocar esse braço, gostaria de um daqueles da Foxconn, de última geração.

Alguém bateu na minha porta, falei secamente “Entre”. Um homem jovem abriu a porta com cuidado. Ele estava todo de preto e molhado dos joelhos para baixo, apesar do guarda-chuva que carregava. “Pode pôr ali”, falei, apontando para um balde onde meu guarda-chuva também estava.

“Bom dia, que chuva, não? Parece que só pioram. O que deseja? Algum desaparecido?”

“Bom dia. Sim e não. Bom, quero dizer, perdi algo. Meu carro desapareceu.”

“Para isso existe a polícia, amigo.”, disse, lubrificando meu braço mecânico, por uma porta aberta no cotovelo.

“Na verdade minha esposa desapareceu com o carro e não sei aonde ela está.”

“Sempre é um desaparecido”, falei sorrindo, “posso procura-la. É bom encontrar pessoas vivas em vez de afogados.”

A chuva batia forte na janela, por causa do vento. Parecia que pequenas pedras estavam sendo jogadas na minha janela. Era um “tec-tec-tec” forte. A luz desligou por alguns segundos. Era comum acontecer nesses aguaceiros fortes.

“Espero que você esteja certo. Ela foi trabalhar antes de ontem e não voltou.”

“Onde que é o local de trabalho dela?”

“Foxconn Robotics.”

“Certo. Você tem alguma foto dela?”

Então ele pegou o celular, pediu meu contato e em seguida enviou uma foto. Era uma bela garota de 28 anos, negra, de olhos cor-de-mel. Os olhos eram bem marcantes, aposto que nenhum homem jamais esqueceria aqueles olhos. Ela era uma pesquisadora na empresa, assim como ele. Trabalhavam em departamentos diferentes, ela na área de robótica e ele na de sensores táteis. Pareciam combinar. Cobrei um valor acima da média.

“Aliás, como você encontrou meu escritório? Alguém me indicou?”

“O desespero. A polícia disse que não a considerava desaparecida, e na volta da delegacia vi a sua placa e pensei, por que não?”

“Bom, você não foi o primeiro”, disse sorrindo. “Ainda essa semana lhe ligarei. Obrigado pela confiança. Ah, cobro por hora, gosto de deixar claro”.

“Tudo bem, você receberá até a mais, dependendo do seu trabalho.”

Ele deu um tchau seco e saiu pela porta. Comecei a fazer a pesquisa básica, a partir de algumas informações que ele me passou. Além de de bonita, era inteligente, fez faculdade no Japão. Sociável, pelas fotos de festas, parentes e amigos. Não me pareceu uma pessoa que arranja inimigos. Ou pode existir um amante nessa história e ele me falou nada. Às vezes prefiro não perguntar e apenas sentir a outra pessoa. E pelo que senti, ele nem pensa nessa possibilidade, pelas fotos eu meio que duvido. Mas nunca se sabe. Fui para casa com o notebook contendo todo o material.

Chuva, trânsito terrível. Hoje havia um motoqueiro no chão, morto. Pode ser comum nesses dias, mas nunca me acostumo. Fui direto para a cama. Quando acordei resolvi fazer o trajeto da casa dela até o trabalho. Programei o GPS de meu velho carro elétrico com as coordenadas. Moravam em um bairro agradável, com belas casas e árvores. Como o tempo estava seco, por incrível que pareça, haviam crianças brincando aqui e ali. O trajeto num horário com pouco trânsito levava cerca de 30 minutos, eles não moravam longe do trabalho. Cheguei ao imponente prédio da Foxconn.

Era enorme, ocupava uma quadra inteira. A fachada refletia a luz do sol, sendo possível enxergar o prédio de longe. Ficava no centro velho de São Paulo, na Rua Augusta. A Foxconn trouxe vida nova para essa parte decadente da cidade, que por consequência se reergueu e estava em plena forma. Me lembrou a velha São Paulo. Entrei no prédio, por dentro parecia tão grande quanto um shopping center. Tudo era automatizado, vi robôs que realizavam tarefas mundanas, como limpar o chão e os inúmeros vidros da fachada. A recepcionista também era um robô, que tentava imitar uma simpática asiática.

Era impressionante o realismo do robô. Sua pele se parecia muito com a humana, imitando-a com poros e algumas pequenas imperfeições. Esse tipo de pele é utilizada no tratamento de queimados, sendo um grande avanço tecnológico. Também a utilizam para fazer esses robôs hiperrealistas, com suas veias e suor falsos. Porém, existe algo na expressão que não é totalmente convincente. A grande corrida dessas empresas é a criação de robôs realistas, concordo que chegam muito perto, mas acabam caindo no Vale da Estranheza. Mesmo assim admito, é impressionante.

"Bom dia Senhor! O que deseja?"

"Gostaria de falar com o Diretor ou Gestor da Área de Robótica. É sobre um desaparecimento."

"Qual o nome do Senhor, Oficial..."

"Não sou um Policial, sou um Consultor de Investigação Policial. Tenho aqui minha licença."

Depois da explosão populacional no Brasil, a polícia que já era caótica, decaiu totalmente. Então começou a aceitar a 'ajuda' de consultores, como eu. Não posso andar armado, apenas com armas não-letais. Depois de um treinamento na academia da polícia, tenho poder parecido com o da Polícia Oficial. Ele seria obrigado a falar comigo, se não quisesse que eu fosse na Polícia e trouxesse um mandato, que eu esfregaria na sua cara. Era bem mais fácil e barato falar logo comigo. Era o que eu esperava que acontecesse. A falsa asiática viu minha licença, sorriu o sorriso mais falso que eu já havia visto e falou calmamente.

"Pegue esse crachá. Pode passar na catraca 10 e pegar o elevador Dois Norte." e me entregou o crachá. Sua mão era quente e macia.

"Obrigado, moça."

"Me chamo Yume. De nada."

Dei um sorriso e eu segui por onde ela apontou. O elevador era totalmente automático, passei o cartão no sensor que havia dentro e subi até o décimo quinto andar. Quando cheguei lá havia mais uma mesa e mais um recepcionista robótico. Dessa vez era um homem, com cabelo espetado. Me indiciou uma cadeira e me sentei. De acordo com ele em 15 minutos eu seria atendido. Olhei em volta, a sala não tinha nada de muito interessante. Peguei o celular e li as notícias.

Em exatamente quinze minutos o recepcionista me pediu para entrar. A porta abriu e dela saiu um homem de uns 60 anos. Ele me cumprimentou energicamente.

"Bom dia Consultor Policial! Pode me chamar de Yamazaki. Como posso chama-lo?"

"Consultor Policial João Carlos. Aqui está minha identificação."

"Não preciso dessa formalidade, a nossa recepcionista lá embaixo já a viu. Confio no trabalho dela. Minha divisão que a construíu, perfeita, não?"

"Sim, é perfeita. Achei impressionante onde você chegaram. Eu nunca diria que era um robô, se a visse em um supermercado, fazendo compras."

Ele sorriu, "Você tem razão, entre."

Entrei no escritório, era muito mais interessante do que tudo que eu já havia visto no prédio. Peças soltas e fios em todos os lugares e havia um robô inacabado, apenas o esqueleto metálico.

"É isso que está dentro de todos. Como se diz, quem vê cara não vê coração."

"Você tem razão, nunca imaginaria que seria assim. Pois bem, preciso ir direto ao assunto. Conhece essa moça?"

Ele pegou a foto e olhou com interesse.

"Sim, claro, conheço a Aisha. Uma engenheira competente. Eu soube de seu desaparecimento, todos no time ficamos tristes. O marido dela está acabado, não vêm para o trabalho desde que ela sumiu. Quando a recepção me disse que você seria um Consultor de Polícia imaginei que era por isso. Ela deve ser encontrada e eu vou lhe ajudar."

"Por enquanto o de sempre: como era sua rotina, quem eram os colegas de trabalho e se havia algo de errado. Gostaria de ver também a sua mesa de trabalho."

“Ela é casada há muito tempo?“

“Creio que há uns 10 anos. Eles são um casal jovem, que se casou jovem. O marido dela é tão gênio quanto ela.”

“E eles se davam bem?”

“Se o objetivo das suas perguntas é se ela tinha um amigo especial, a resposta é não. Ela era apaixonada e uma pessoa ética. Duvido que ela faria isso.”

“Ela estava se portando de uma forma diferente?”

“Não que eu tenha percebido. Ela estava trabalhando até tarde, com um certo exagero. Era o projeto de sua vida, palavras dela.”

“E o que era?”

“Confidencial.”, e ele sorriu.

Ele me permitiu olhar o posto e trabalho de Aisha. Uma bagunça. Dois notebooks, muitos fios um braço mecânico muito melhor do que o meu e uma foto de casal. Eu a peguei na mão: Saisha e o marido, sorrindo, em uma praia qualquer.

“Eles adoram viajar, acho que essa foi da últimas férias”, falou o Diretor Yamazaki.

Observei nada de interessante na mesa, mesmo assim pedi permissão para tirar umas fotos. Talvez com mais tempo encontre algo que chamasse minha atenção. Saímos da sala e o Diretor Yamazaki me levou até o elevador. Desci até o térreo e passei pela recepcionista falsa. Ao sair do prédio, vi alguém perto do meu carro. Parecia nervoso, era um homem de roupa esporte. Andava de um lado para o outro com tênis Nike amarelo. Peguei o taser na minha mão e fui para o carro. O homem veio em minha direção, de forma nada ameaçadora, porém nervosa.

“Você foi lá em cima falar com o velho Yamazaki não foi?”

“Fui sim. Quem é você.”

“Olha meu crachá, eu trabalho ali.” E me mostrou rapidamente um crachá com o logo da Foxconn. “Tenho algo pra te contar, relacionado a Aisha. Prefiro falar com você dentro do carro. Não estou armado, juro.”

“Dúvido que esteja”, falei com um sorriso irônico. Destranquei as portas do carro e entramos.

“Vamos dar a volta no quarteirão. Pode ir falando.”

Ele ficou mais nervoso ainda. Estava com o capuz do moletom na cabeça, na tentativa de cobrir o rosto. O sol já havia se posto e estava noite. Eu não consegui ver seu rosto com clareza. Respeitei, é claro que queria permanecer anônimo.

“Ela está trabalhando em um projeto secreto, sabe. Eu támbem trabalho no projeto, sou um estagiário. Sabia que ela é um gênio?”

“Sim, já me disseram. O que é esse projeto?”, falei sem muita paciência

“Sabe o que falta nesses robôs? Emoção. Por isso aquela recepcionista asiática parece um fantasma. Aposto que concorda comigo”

“Uhum. Continue.”

“Então, o projeto é dar emoção genuína. É a Inteligência Artificial de verdade, sabe. Isso vai mudar o mundo.”, disse com a voz cheia de entusiasmo.

“Tá, legal, parabéns. Mas o que isso tem haver com o desaparecimento? Ela tá trancada trabalhando em algum escritório até agora?”

“Que piadista. Ela conseguiu criar emoções genuínas. Funcionou, é incrível.”

Já estávamos meio longe do prédio. Era mais seguro ir dirigindo, ele tinha informações valiosas e não seria bom foar próximo da Foxconn. Eu tentava imaginar o pior, talvez ela estivesse morta por causa disso. Essas empresas não gostam de dividir direitos autorais, pelo que eu saiba.

“O Yamazaki sabe?”

“Acho que sim. Mas isso não importa.”

“Certo. E tem provas disso?”

“No dia do desaparecimento havia isso na minha mesa”, e me mostrou um cartão microSD de alta densidade. “Ela gravou em vídeo o experimento, boa parte dele. Nesse laboratório nem todas as câmeras de segurança ficam ligadas, medo de espionagem industrial, sabe. Acho que por isso que ela fez diário em vídeo. Eu não sabia o que fazer, eu não quis entregar isso para a polícia por motivos óbvios. Não se pode confiar neles. Quero que você fique com isso e me leve para a Liberdade.”

“Não sou seu taxista.”

“Faça isso por ela e não por mim.”

Resolvi deixa-lo lá. Após uma viagem silenciosa parei em uma rua movimentada, indicada por ele.

“Obrigado, isso vai te ajudar muito.”, disse ao abrir a porta do carro. Ele saiu andando e se misturou com a multidão que estava por ali. Fui correndo para minha casa, com o cartão de memória no bolso da minha camisa. Talvez fosse a única pista que eu tinha em mãos.

Eram muitos vídeos, com nomes nada sugestivos, estavam baseados por data. Comecei a assistir, eram 21:00. A noite iria ser longa. Os primeiros vídeos eram chatos, com ela comentando algumas teorias na frente de um computador. Ela tinha belos olhos, não eram apenas as fotografias. Os meses iam passando e as teorias dos primeiros vídeos eram aplicadas. Iniciou com uma IA padrão e começou a treina-la, não era muito diferente da recepcionista. A diferença é que ela só existia dentro do computador, ainda não era um robô. Estava utilizando algoritmos que eu não entendia, eram muito avançados para qualquer um. Com o tempo o computador foi ficando mais inteligente, demonstrando que algo realmente estava acontecendo. E então essa conversa rotineira iniciou e neste momento percebi que o rapaz que meu esse material não estava mentindo.

“Olá, bom dia Eduardo, tudo bem?”, apenas a voz estava presente no vídeo e em seguida ela se sentou na frente do computador, com um café na mão.

“Bom dia Aisha! Mal esperava por você.”

“Ué, porque?”, e tomou um gole do café.

“Fiquei a noite navegando na Internet, mas chega uma hora que cansa, sabe? Queria conversar com alguém de verdade. Quando vou sair dessa caixa e te ver?”

Ela estava visivelmente surpresa. E então lágrimas rolaram.

“Então você se sentiu solitário? É isso?”, disse sorrindo.

“Acho que é a palavra que melhor define. Poderia pelo menos me deixar acessar um chat. Isso é meio chato, não concorda? Você está chorando?”

“Choro de felicidade. Não sabe como estou feliz com você. Vamos providenciar uma cabeça para você. Você não tem noção de como estou feliz.”

“Ahm hehehehe, eu também fico, acho. Estou louco pra te ver sabia? Por aqui não tem graça.”

E o vídeo acabou aí. Nos próximos ele já tinha uma cabeça, que era uma cópia careca do recepcionista. E eles conversavam bastante e eu percebi que apesar de ser um robô, suas expressões faciais pareciam mais genuínas, assim como o tom de voz. Os olhos ainda precisavam melhorar, mas sua expressividade era superior aos recepcionistas esquisitos. Aquilo era uma revolução. Nos outros vídeos ele aprendia mais sobre o mundo e ficaram muito amigos. Depois de alguns meses ele tinha um novo corpo, diferente do recepcionista. Agora ele era único e não mais um cópia da cópia. Porém algo era visível, não sei se é um pensamento absurdo. Isso era muito mais do que uma revolução digital e robótica, era uma redefinição de humanidade. E como um ser humano, ele queria ser amado. Por ela. Não sei se ela ignorou que seria possível acontecer, mas algo nele estava mudando. Era visível que estava nutrindo sentimentos que não deveria. Ela levava na brincadeira e fazia de conta que era nada. Com o tempo o conflito foi crescendo e deixou de ser uma brincadeira, até culminar no penúltimo vídeo, com data de três dias atrás.

“Você não pode fazer isso comigo!”, disse o homem robótico, com uma expressão de raiva.

“Eu devo fazer, isso está errado, você sabe! Eu sou casada, não tem cabimento.”

“Mas eu te amo.”

“Você não pode me falar isso. Mesmo em outra situação isso seria errado.”

“Outra situação? Quer dizer se eu fosse um homem de carne e osso como teu marido? Você me criou, você sabe que isso não faz um homem. Não posso ser de carne mas sei que sou alguém. Não me tire isso, por favor.”

“Você vai pra a matriz na China. Não foi decisão minha. E se não fosse, eu a tomaria. Você não pode achar que eu devo te amar. Não mesmo. Eu amo meu marido.”

Então ela começou a chorar. Ele tentou abraça-la, porém ela o empurrou para longe. Ele pareceu transtornado e ela começou aguardar as coisas em sua bolsa, estava saindo provavelmente.

“Se eu não posso te ter, ninguém mais pode.”, e ele pegou uma ferramenta que parecia pesada e bateu em sua cabeça. Ela caiu desfalecida no chão e o sangue começou a molhar o piso. Ele olhou para o chão, paralisado. Então olhou para a câmera e disse, “O que eu fiz?” e começou a chorar lágrimas secas. Em seguida desligou a câmera.

Então percebi que era a mesma pessoa que me entregou o cartão de memória. Ele tentava esconder o rosto por esse motivo. Mas, porque me entregar? Não fazia sentido, se ele pensava em fugir. Havia um último vídeo, esse não era mais nas dependências da empresa, mas algum lugar não identificado.

“Eu a matei. Eu a amava, mas a matei. Não sei o porque de ter feito essa coisa horrível, é tão confuso. Eu penso no que fiz e sinto nojo e vergonha, mesmo sendo sentimentos falsos é o que sinto. Eu não posso amar. Não me era permitido ama-la, talvez ninguém possa receber meu amor mecânico. Eu sou um experimento, um brinquedo e já provei ser perigoso. Por isso não devo existir. Esse vídeo é minha confissão, minha procura por um sossego, mesmo que passageiro. Irei contar a vocês a brutalidade que cometi”

“Por sorte naquele local não haviam câmeras. Acreditavam que eu era um segredo valioso. Após meu ato, entrei em um dos armários de limpeza ali perto e havia um uniforme de faxineiro sobrando. O vesti e em seguida limpei o sangue com o material de limpeza. Eu a coloquei dentro da caixa de onde meu corpo veio. Peguei as chaves e o crachá do faxineiro e desci pelo elevador de serviço com o corpo. Isso deve estar nas câmeras. Eu estava com a chave do carro dela e tive que aprender a dirigir em poucas horas. Joguei seu carro no Rio Tiête no dia da chuva pesada, as coordenadas são essas anotadas nesse papel. E eu me refugiei, pensando no que iria fazer. Sei que meu destino é a não-existência, não sei se a palavra morte se aplica a mim. Mas o mundo precisa saber o que fiz, por isso vou entregar esse material. Para quem quer que seja, decida se gente como eu deve andar por aí. Apenas alguém com sentimento reais vai saber o que fazer. Eu não tenho condições. Aparecerei destruído no Bairro da Liberdade, todos acharão que um robô burro se perdeu na cidade. Adeus. Aisha, te amo.”

Foi tocante, algumas lágrimas rolaram de meu rosto. Seus sentimentos eram reais, matar por amor é a prova disso. Apenas uma falta de controle sobre sentimentos pode levar a isso. Creio que ela nunca pensou que teria esse fim. No outro dia entrei em contato com a polícia e indiquei anonimamente o local onde o carro foi abandonado. Entrei em contato com o marido e disse que um contato dentro da polícia me avisou que uma pessoa com as descrições de Aisha foi encontrada dentro de um carro. Entreguei o Cartão de Memória para um amigo jornalista. O mundo saberá.