Teletransporte - parte 11

— Aqui à nossa direita temos o departamento de Paraquímica...

Charles e Mauro me escoltavam num tour pelos vários setores daquele Centro de Pesquisas Etéreas.

— Paraquímica???

— Sim, meu amigo! Descobrimos recentemente que as coisas aqui também são feitas de partes fundamentais, equivalentes aos átomos de nosso mundo físico. Só que diferentes...

— Diferentes como???

— Ainda não entendemos como, mas os fótons, transportadores da energia eletromagnética, interagem. E, aparentemente, a paramatéria etérea parece ser constituída de átomos de luz...

— Átomos de luz???

— Isso! Estranho, né?

Tentei absorver a ideia por algum tempo, sem conseguir totalmente.

— Fótons não interagem!

— Sim, é exatamente isso que aprendemos lá no nosso mundo físico. Mas parece que precisamos reaprender as coisas básicas por aqui...

— Átomos de luz...

— Isso! Fótons aprisionados por ressonância em órbitas semiestáveis em torno de... nada! Átomos sem núcleos, formados apenas de nuvens fotônicas...

— E vocês chamam isto de... paraquímica?

— Sim! E é muito mais estranha ainda do que vc deve ter imaginado à princípio!

— E o que poderia ser mais estranho que átomos de luz, meu amigo? Fótons girando em torno de nada?

Charles parecia se rir por dentro, prevendo meu espanto diante daquilo que ainda estava para ser revelado.

— Você considera que gelo, água e vapor de água são as mesmas substâncias, não é? Apenas em estados diferentes?

— Sim! Uma substância só, em estados físicos diferentes! Que só dependem do nível de energia em que estão...

— Três estados da matéria, é o que vc quer dizer?

— Sólido, líquido e gasoso. Sim, é o que eu quero dizer!

Penso um pouco. Lógico que Charles estava escondendo algo, uma surpresa que não se segurava pra me revelar!

— Ah sim, tem o plasma, o quarto estado da matéria! Mas alguns não o consideram um estado, já que é tão energético que os átomos perdem suas nuvens eletrônicas e se ionizam! Os átomos perdem sua identidade, deixam de ser átomos para se tornarem coisas diferentes, que precisam ser estudados por outras regras. É disso que estamos falando? É disso que trata esta paraquímica?

Ele e Mauro parece se divertirem.

— Vai mais longe que isto, meu amigo! Aqui temos muito mais que três fases de agregação dos átomos de luz! Temos até dificuldade de nomeá-los, desafia nossa criatividade...

— Mais de três estados?

— Sim!!! Algumas coisas são líquidas, ou se parecem bastante com a ideia de líquidos que trazemos das lembranças do mundo físico. Lembra da água com a qual tentou encher aquela garrafa de Klein, né? Mas também temos coisas que se tornam superlíquidas, algo parecido com os superfluidos que estudamos no mundo material, só que a temperaturas não tão baixas. E temos os líquidos duros, que se comportam como sólidos quando pressionados demais. No mundo material temos algo parecido também com os fluidos não-newtonianos. Mas também temos gases cristalinos, sem equivalentes no mundo físico, sólidos instáveis... E substâncias que mudam completamente suas propriedades e valências em estados distintos, podendo até reagir entre si...

— Como assim?

— Numa analogia grosseira, imagine que o gelo fosse capaz de reagir quimicamente com a água líquida, e a mesma substância, em estados diferentes, pudesse formar uma terceira substância num estado completamente diferente das originais? Este tipo de maluquice acontece aqui na nossa paraquímica, que estuda as reações entre átomos e moléculas de luz. E por isso é um assunto tão complexo de se estudar...

Continuamos caminhando pelo longo corredor, quando ouço Mauro dizer.

— AH, o departamento de parabiologia!!!

— O quê????

— O estudo de nossos corpos etéreos, amigo!!! De que são feitos, como se organizam, de onde surgem...

— Imagino que de átomos de luz, não?

— Sim!! De átomos de luz! Substâncias etéreas! Mas, ao contrário dos organismos materiais, não são formados de células...

— Como?

— São contínuos! Suas unidades fundamentais são átomos de luz! Não se organizam em tecidos e células como os organismos que conhecemos de nossos mundos físicos!

— E de onde vêm?

— Boa pergunta, meu amigo!!! Boa pergunta!!! Gostaria de nos ajudar a respondê-la?

Charles me olha no fundo dos olhos:

— Quando soubermos responder isto, saberemos exatamente o que esquecemos de copiar no nosso teletransporte, Richard!!! Saberemos explicar por que você ficou aqui, ao invés de ser transportado com o resto de seu corpo orgânico...

* continua *