Câmara Escura

Escura, úmida e viscosa era a caverna onde estava preso. O breu absoluto o sufocava durante as longas noites. Felizmente a duração das noites era finita, e um ponto de luz de brilho crescente numa das paredes indicava que estava nascendo um novo dia.

Havia um pequeno orifício numa das paredes da caverna, que desde sempre ele sabia ser pequeno demais para iluminar plenamente seu interior. Só que é da natureza da luz seguir trajetórias em raios retos, e daquele pequeno orifício partiam partículas luminosas de todas as direções, trazendo informações a respeito do que existia no mundo lá de fora. Os raios de luz percorriam todo o interior da caverna e formavam manchas luminosas quando suas trajetórias retilíneas eram barradas pela parede na direção oposta. Algumas manchas eram mais brilhantes, outras mais escuras, tudo dependia se mais ou menos partículas de luz atingirem aquelas regiões. Os brilhos mediam quantas partículas de luz por intervalo de tempo vinham daquela direção específica, atingindo cada região da parede.

Mas as partículas de luz não eram todas iguais. Elas tinham energias diferentes, e isso enriquecia as imagens projetadas na parede oposta da câmara escura daquela caverna. Se a quantidade diferente de partículas luminosas tornava as projeções do mundo externo mais brilhantes ou mais escuras, a energia destas partículas lhes dava cores. As partículas vermelhas eram as que possuíam menos energia. O espectro luminoso era percorrido à medida em que a energia das partículas crescia, criando o laranja, amarelo, verde, azul, até chegar nas partículas violetas, as mais energéticas que chegavam de fora.

Ah! como eram belas as imagens projetadas do mundo exterior!! Vegetações verdejantes, crepúsculos impressionantes. Se observasse bem as imagens, mesmo no breu noturno às vezes ele distinguia pontos fracos projetados na parede do fundo da caverna, estrelas centrais de outros mundos a distâncias incomensuráveis! Porém, preso dentro daquela caverna escura, o mundo que orbitava estas estrelas era tão inacessível quanto o mundo próximo, mas além daquelas paredes.

Paredes? Não, observando melhor a caverna não faz muito sentido afirmar que ela tem paredes. Se via claramente que seu teto era abaulado, assim como o chão. E também as paredes, e era este o motivo das imagens projetadas parecerem côncavas. Era neste formato que eram projetados os raios de luz que atravessavam o orifício da parede oposta. Me desculpem o deslize, não havia parede oposta. Como o chão e o teto da caverna, as paredes laterais também eram curvas, côncavas. A rigor havia uma coisa só, chão, teto, paredes, um contínuo côncavo assumindo todas as direções possíveis. A caverna era um oco esférico. E ele vivia preso dentro desta casca esférica, observando o mundo através de imagens projetadas pelo orifício de uma câmara escura.

Mas nada daquilo existia. Toda sua vida foi vivida mergulhada em sombras luminosas projetadas numa parede, representações intangíveis dos objetos reais. Projeções no fundo daquelas duas câmaras escuras globulares incrustradas nas cavidades oculares de seu crânio.