os olhos de Lucia

os olhos de Lucia

Esta frio, escuro. A fome me devora a cada momento, sinto um cheiro estranho, acho que estava dormindo, mas não sei onde estou. Aos poucos lembro o que houve. Eu e meu namorado estávamos curtindo uma noite de sexta feira, alegres sorrindo como sempre, quando estamos juntos, mas algo aconteceu. Minha mente dói ao tentar lembrar. As luzes se ascendem de repente, quando meus olhos conseguiram focalizar o ambiente, vi que estava em uma sala, sem portas ou janelas, nada alem de uma cama, sanitário e chuveiro, na cama a minha direita havia um caderno no qual estou escrevendo agora...Não sei por que !

Quando uma voz ecoou pela sala.

_ Lucia ! Uma voz, a única no local...

_ quem esta ai ?

_ Não importa quem sou eu, importante é que você esta aqui Lucia...Vá ate a sala que esta a sua direita!

Ela caminhou lentamente, descalça no piso frio, sua respiração estava ofegante, sua mãos gélidas, o silencio era mortal. Ao entrar na sala a visão que teve foi aterradora, a única coisa a ser ouvida foi seu grito agudo, expressando o mais profundo terror e dor da alma. Ele estava lá, seu amado, disposto em uma cama, dormindo em mais profundo sono, parecia quase morto, inerte, apenas um som fraco de sua respiração. Ela correu ate ele, debruçou sobre o seu peito, e em um ato de desespero gritou seu nome, em vão pois ele não esboçou nenhuma reação. Seus lábios estavam levemente acinzentados, em seus olhos não havia movimento algum. A voz voltou a estremecer em meio à agonia que sentia;

_ Lucia, ele esta em um sono profundo, mas se eu assim quiser pode estar morto... É simples! O mais irônico é que você provocou tudo isto...

_ como assim? Seu louco, porque fez isto? O que nos fizemos de errado?

_ a pergunta não é, O que nos fizemos? Mas o que você fez? A culpa é sua, ele pode morrer por suas mãos, imagine só, que fardo a se carregar pelo resto de sua vida...

_ o que você quer que eu faça, não posso velo morrer, não posso.

Seus olhos já haviam lavado seu rosto em lágrimas, uma expressão desesperadora, sua mente estava transtornada, tentando entender o por que de tudo aquilo.

_ sabe Lucia, eu acompanho vocês há muito tempo, os observo em cada passo. Desde o inicio do namoro até agora, analisando cada traço de sua personalidade...Como você é passional, egoísta, insegura, mas isto tudo já havia sido moldado a você desde de pequena. Não é ?

_ você não sabe nada sobre mim...Cala a boca !!

_ ha´, sei sim, mas do que você imagina...Vamos ver o nome dele mesmo é Luis, tem 26 anos, há seis anos vocês namoram, sem planos concretos para futuro, mas uma coisa ele tem certeza, ele ama você, mas que a si mesmo. Isto é fato...E você o ama?

_ amo sim, muito, não sei o que faria sem ele ao meu lado...

_ ele te ama tanto que lhe aceitou com os milhões de defeitos que você tem , não é mesmo. E você como fiel agradecimento, esqueceu dele por longos anos, ao tentar a cada instante que seus mais secretos desejos fossem realizados por ele...Seu egoísmo me enoja, sabia?

_ mas eu não fiz nada de mais, eu sou fiel a amor dele, você não tem direito de julgar!

_ não estou lhe julgando, estou enumerando defeitos de sua personalidade Lucia, quem sabe você possa melhorar e ser feliz consigo mesma...

_ por favor, eu quero sair daqui !

_ o que você é capaz de fazer para vê-lo vivo ? É capaz de morrer e matar ?

_ sim eu sou...

_ é capaz de renunciar a própria vida para que ele viva?

_ é muito mais, eu amo mais que a minha própria vida!

_ Lucia saiba que qualquer decisão que tomar neste momento, tudo esta sobre a sua responsabilidade, sua vida e a vida dele...

_ o que você quer que eu faça ?!

_ você não entendeu ainda não é, você precisa de auto-ajuda Lucia, exorcizar os seus demônios e eliminar sua duvidas, seus medos...Lucia tente enxergar seus erros!

_ eu não consigo , não posso!

_ Lucia é sua ultima chance de tentar consertar seus próprios erros, você sempre teve medo de tanta coisa não é?

_ sim, sempre tive medo de muitas coisas !

_ o medo reprime ações humanas, você fez escolhas erradas, tomou atitudes nem um pouco dignas de racionalidade Lucia, sempre agindo por impulso, seja nas mais banais situações, há você sabe muito bem do que eu estou falando!

_ eu não fiz nada !

_ você brinca com os sentimentos dele, não. Quantas vezes presenciei as mais ridículas e teatrais crises existenciais. Quantas vezes eu vi você chorar por se perguntar se as pessoas gostam de você. Quantas vezes tive de olhar pelos seus olhos no espelho quando você se pergunta se é feia ou bonita. Quantas vezes tive de agüentar as suas queixas incondicionais sem fundamento, por que Lucia, porque você é assim?...

_ eu não sei, eu não queria, não queria ser assim...

_ você sabe o que pode perder com isso, não é. Ele a pessoa que você mais ama nesta vida. A pessoa que agradece a todos os dias por te amar, e que aceita como você é ! Porque é tão difícil se aceitar, me diga? Por que a opinião dos outros sempre é mais valida do que a dele?!..._

_ Diga Lucia, Por que ?

Sua voz tornou-se tão alta, que as paredes tremeram, assim como a própria alma de Lucia. Neste instante uma pequena abertura surgiu na parede, e dela uma pequena maleta.

_ pegue a maleta Lucia, e abra !...

Nela havia uma seringa e um pequeno frasco com um liquido amarelado.

_ o que é isso ?!

_ e a sua escolha, a veneno ali dentro, você pode desistir de tudo ou lutar contra tudo, você decide!

Lucia olhava atentamente para a seringa, e seu olhar desviava-se às vezes para a cama onde estava Luiz em um sono tranqüilo.

_ antes de tomar sua decisão Lucia lembra-se aquele caderno que a principio você escrevera algo, escreva novamente, mas tudo aquilo que esta sentindo neste exato momento, não omita , não minta, revele sua alma Lucia...

Lucia pegou o pequeno caderno, olhou por alguns instantes Luiz, com olhos tristes e melancólicos. Depois de algum tempo, havia terminado. Caminhou lentamente até a maca lhe deu um único e suave beijo. Depois de uma breve despedida, pegou a seringa e a preparou calmamente, não havia som, somente o silencio.

_ é isto o que você quer não é? Eu quero que ele viva, já que sou um ser tão imperfeito assim talvez não mereça a dádiva que me foi concedida...

Nada foi ouvido, nem a pergunta foi respondida. Lucia esperou, mas não havia resposta, então ela aplicou o veneno em seu braço, que queimou suas veias. Ela sentiu cada célula de seu corpo morrer, primeiro seu corpo caiu inerte no chão, havia consciência, seus olhos estavam abertos, todas as sensações podiam ser sentidas.

_ você não entendeu Lucia, não quer, não pode...mas saiba que ele vivera como sua ultima visão...

Neste instante, Luiz acordou de seu sono, confuso e meio tonto, olhava ao seu redor, retirou a seringa que estava em seu braço. Logo viu Lucia deitada sem movimento, foi em desespero ao encontro dela, em seus braços ela permanecia com os olhos abertos, já estavam opacos e sem brilho. Esta foi a ultima visão de Lucia, seu amado chorando e urrando de dor, com elas nos braços, e depois tudo era escuridão.

Luis encontrou o caderno onde estava escrito _ por mais que eu tente me entender não consigo, não posso, então, renunciei a minha vida por você, viva por que eu te amo, e sempre te amarei...e ao vasculhar a maleta ele encontrou a chave em um fundo falso.

Lucia perdeu a não só quem amava, mas perdeu a si mesma, foi devorada pelas suas duvidas, seus medos, suas neuroses. Como fuga, preferiu a morte, ao invés de assumir seus defeitos, tentar conserta-los, e ser feliz. Aceitar-se era um dilema, sua escolha foi infeliz, às vezes o caminho mais fácil é o pior caminho.

Taiane Gonçalves Dias
Enviado por Taiane Gonçalves Dias em 23/06/2008
Reeditado em 13/07/2010
Código do texto: T1048017
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