Tua ira será teu fim
...Levava uma sacola negra, trajava roupas não muito condizentes com os dias atuais, um figurino mais apropriado para o século XIX; uma espécie de capa ou sobretudo e uma cartola, que davam ares londrinos ao taciturno personagem.
Ele andava retilíneo e obstinado, chamando a atenção dos transeuntes que caminhavam apressados pela grande avenida.
Os passantes mesmo acostumados com as estranhezas da grande cidade, abriam caminho para o misterioso homem de vestes negras, que cheirava a museu, fitando-o com olhares curiosos e temerosos.
O Sol já desaparecia no horizonte, deixando o firmamento crivado de um vermelho sangüíneo.
Voltando algumas horas atrás:
No final da mesma avenida que o macabro personagem do início deste conto percorria ( algumas horas adiante ).
Encontrava-se uma loja de antigüidades que foi herdada pelo jovem Nathan do seu avô, um velho que morreu centenário e que em suas andanças quando jovem, conheceu um famoso ocultista inglês, que o iniciou no mundo das práticas sombrias do satanismo.
Voltando ao jovem Nathan que sentia-se perdido em meio às mórbidas velharias, heranças de seu avô.
- Maldita! Como pôde fazer isso!? - praguejava colerizado.
- E pensar que eu confiava tanto nela, como ela teve coragem para...para isso?
Ele segurava uma foto, que fora entregue a ele , poucos minutos atrás.
A foto mostrava a esposa de Nathan almoçando com outro homem. Era a explicação para o comportamento estranho e a frigidez que tomaram conta dela a pouco tempo.
Nathan olhou em volta e estacou, magnetizado diante de uma bizarra figura, uma espécie de ídolo pagão, um velho presente do ocultista inglês ao avô de Nathan.
Os olhos do jovem encaravam o ídolo pagão e numa torrente de ira hipnótica, ele disse:
- Daria minha alma para ver a cabeça de minha traidora esposa cortada, decapitada.
Uma rajada de um vento indizivelmente frio e espectral, invadiram a loja, trazendo consigo uma frase no ar:
- Tua ira, teu desejo, teu fim.
Nathan estremeceu e gélido se indagava:
- Minha raiva está trazendo-me alucinações?!
Nathan esqueceu-se deste pequeno acontecido, sua mente tinha coisas mais sérias e reais para se preocupar.
O dia arrastou-se moroso e sombrio.
A campainha da loja soou tétrica, anunciando tragédia.
- alguém ai? - Gritou uma rapaz trajando roupas brancas.
- Sim já estou indo! – Respondeu Nathan saindo dos fundos da loja imersos na penumbra.
- Em que posso aju...aju...mais é você?! – O rapaz de roupas brancas era o mesmo que estava na foto junto da esposa de Nathan.
- Meu nome é Augusto, sou um velho amigo de sua esposa, e sou médico também! – foi dizendo ele e emendando.
- Ela me procurou angustiada porque não sabia o que fazer! Senhor Nathan, sua esposa está gravida, e, como o senhor não pretendia ter filhos e a tarefa de se prevenir para que não ocorre-se uma gravides indesejada, era dela! A pobre desesperou-se.
Nathan limitou-se a escutar.
- Aconselho o senhor a ser compreensivo com ela, porque ela chegou a cogitar um aborto! – Falou o médico num tom amável – com muita persistência e persuasão consegui faze-la mudar de idéia.
Respeitando o silêncio resignado de Nathan o médico retirou-se, com uma saudação gestual.
Nathan estava sozinho e com seus pensamentos envoltos numa turva nuvem de sentimentos, porém em meio a tantos sentimentos conflitantes, a alegria se sobressaia.
Afinal, sua esposa não o traia, ela era fiel a ele e trazia no ventre um bebê, seu filho.
Mal o pobre Nathan esboçara um tímido sorriso, a porta da loja foi aberta com grande violência por um estranho homem, uma figura espectralmente bizarra.
Lá fora o vermelho sangüíneo que flagelava o céu foi lentamente sucumbindo às trevas, já era noite.
O estranho homem era o mesmo do início deste conto! Porém agora ele denotava um ar sisudo e a sacola que carregava estava úmida e dela gotejava um liquido rubro...sangue.
- Teu nome é Nathan? – inquiriu o homem.
- Si...si...sim sou eu – respondeu o jovem, atônito.
- Trago comigo o que pedistes, o resultado de tua ira, tua infausta desconfiança...a tua tragédia.
Então o homem mostrou o conteúdo da sacola a Nathan, que caiu aturdido, num estado de inércia cataléptica.
No fundo da funesta sacola jazia, morta e decapitada a cabeça de sua esposa.
Era uma visão inefavelmente horrenda!
A foto que levou Nathan a desconfiar de sua esposa, como num truque mágico, transformou-se em pó! Mas Nathan sabia que não era truque. Era sua trágica maldição.
- Já pagastes com tua alma a infausta divida que tinha para comigo, agora levarei a cabeça decepada de tua falecida esposa amada – bradou o sombrio homem.
E diante do gerente boquiaberto retirou-se com a sacola e seu conteúdo.
Fim