Assassino - Parte II

O sol mal havia inaugurado as cores do novo dia, e Ricardo já estressado premeditava seus futuros atos. Um antigo algoz havia dado as caras novamente, após anos inerte, o perigoso homem retornou para o cotidiano de sua vida, algo inaceitável em tal altura do campeonato, uma vez que seus assuntos neste determinado período começaram a fluir novamente, os negócios estavam bons e o dinheiro rolava solto, tudo graças ao cutelo do assassino. Até uma nova namorada havia conseguido. Anna era formidável, além de feições belas detinha corpo escultural completamente subserviente as ganas de quem a possuía. Realmente a vida andava muito bem e aquele fatídico telefonema não deveria mais perturbá-lo, por instantes recordou-se do último assunto com o vil assassino, tal individuo tinha expressões maléficas, todavia em um incomum ato poupou-lhe a existência neste plano, uma grande falha quando tratamos de matadores. Uma testemunha sempre será uma testemunha e quando o cerco aperta, esta deveria ser a primeira a morrer.

Permanecendo diante a tela azulada e ofuscante de seu computador, Ricardo culpava-se intensamente, deveria ter eliminado o problema quando possível, as autoridades poderiam ter-lhe auxiliado, porém preferiu um acordo verbal, tendo em vista que durante esta época o terror de só imaginar as retaliações consumiam-lhe o corpo e a mente. A tela a cada instante tornava-se um borrão de dados fictícios, mal conseguia pensar e ainda deveria entregar uma nova matéria para o mais popular jornal metropolitano, afazeres que possivelmente poderiam ser atrapalhados pela intromissão do antigo cidadão. Por descuido pensou que Bruno integrava a lista dos indigentes mortos, que por fim abdicam da condição de homens tornando-se somente números de protocolo, a nomenclatura mais sincera nesta sociedade tão desumana que vivemos.

A relação amorosa noturna e o telefone no modo silencioso pode ter-lhe custado caro, infelizmente não havia escutado as incansáveis ligações do número legalmente registrado. Neste curto espaço de tempo sequer pensou nas futuras consequências de suas desesperadas ações de marketing pessoal, somente repensando no dito cujo depois do ressuscitado brotar munido de conhecimento em sua secretária eletrônica. Verdadeiramente a consciência dos devedores é pesada e aprendera a eficácia desta frase da pior maneira, em breve o dia abriria por completo e certamente novas ligações figurariam em sua secretária. Sabia que deveria tomar alguma atitude, a polícia neste momento não poderia ser chamada, não havia antiga pendência com a lei, entretanto figurando em seu apartamento, artefatos ilegais fatalmente lhe causariam dores de cabeça, então pensando desta maneira optou por preparar-se para o inevitável embate.

No primeiro instante pensou em convidar o meliante amistosamente, oferta-lhe algo venenoso e depois desová-lo em alguma localidade, mas tinha fé que seria algo bastante previsível para um homem tão rodado. Depois buscou em sua escrivaninha um estrondoso revólver e após alguns passos circulares no interior do cubículo que chamava de escritório, também desistiu de tal idéia, tendo em vista que não conseguiria olhar naqueles piedosos olhos e sacar a pistola com mais destreza, algo tinha de ser feito, mas não sabia o que, e como uma úlcera, esta dúvida devorava-lhe o estômago.

As opções estavam a cada instante mais reduzidas. No passado pôde presenciar a bestialidade de tal sujeito e noites passou em claro recordando-se disto, entre seis bilhões de pessoas havia sido o sorteado para encará-lo, entre tantas constatações, a última expressão que lhe caberia é a de sortudo, e mantendo essa ótima alcunha de desafortunado, Anna irrompe a barreira silenciosa quando uma genial ideia lhe atingia a mente.

A voz renitente de sua amada que tantas vezes através de gemidos lhe proporcionou incontável prazer, neste exato momento o azucrinava, a cretina estava acordada e obviamente o incomodaria o restante do dia, desviando sua atenção da principal questão que emergencialmente deveria ser abordada. Bispou a mulher e furioso voltou seus vermelhos olhos em direção a tela do maquinário, porém logo após as drásticas conclusões seus olhos retornam e param estáticos mirando a bela mulher que somente envolta pelo lençol invadia seu escritório, não estava estonteado com a marcante beleza da fêmea de pêlos incandescentes, e sim pela oportunidade que a maquiavélica mente lhe ofertava, finalmente a sorte batia em sua morada, e talvez a formosa jovem fosse à chave do imprescindível enigma.

A vida é engraçada e inusitada, mas Ricardo não pretendia desfrutar das ironias e muito menos conhecer a colega ceifadora de manto negro que, tão imperceptível traça as mais engenhosas tramóias para atingir-lhe no momento crucial, não pretendia também abdicar do glamour que com sangue escreveu igual à tinta em suas colunas semanais para o ilustre jornal, aquele pistoleiro maldito não colocaria seu engenhoso estratagema a perder, então a vida não seria assim, o mundo não viraria, pois outra vez não conseguiria catar os cacos e reconstruir-se neste mundo tão desumano e segregador. Permanecendo estático e com os globos oculares vidrados em sua companheira, imaginou que certeiro foi Sinatra que há anos atrás já dizia: “Essa é a vida, é o que todos dizem, você está bem em abril e baleado em maio”

O plano estava pronto em sua atual diabólica mente, Anna seria o ponto chave e concomitantemente o cavalo de tróia perfeito para sua reação que no mínimo classificaria como fantástica, uma vez que no mano-a-mano jamais teria hipóteses de vitória contra seu démodé oponente.

Neste meio tempo o amedrontador telefone tocou outra vez, um número sigiloso aparecia no identificador de chamada, óbvio que o matador Bruno Fogliossi o convocava novamente para a animosa prosa, após anos aquele cidadão lhe veria outra vez frente a frente, mas desta vez seria a derradeira, e com confiança romana ordenou que sua parceira atendesse ao telefone. Dois minutos depois a ligação lhe é repassada e esbravejado, o pistoleiro entoava sua antes assustadora voz. Era perceptível a fúria do homem e a incessante busca pela verdade, notório através do ódio, revelou-se a calamitosa situação na qual Bruno encontrava-se, mais assemelhava-se a um devedor e fatalmente também buscava soluções, contudo somente um deles poderia sair com a razão, e como ouvira há anos, a sentença proferida pela boca do mesmo matador enquanto enterrava o esburacado serial killer, Ricardo concorda envolto pela sobriedade do vis que somente existem dois tipos de homem,e naquele mefistofélico encontro que estava por vir, um teria de ser a vítima, neste mundo onde relacionam-se os que matam e os que morrem.

*OBS: Aluga-se, Assassino e Carioca, respectivamente pertencem ao mesmo arco, todavia são histórias independentes que compartilharão do mesmo final na próxima e única edição chamada: Aluga-se assassino carioca.

Vittório Torry
Enviado por Vittório Torry em 01/04/2010
Reeditado em 05/07/2010
Código do texto: T2171588
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