COMO SE BEIJA

Quando a seguia pelo shopping uma roda de avião caiu em cima do meu carro. Rodas caindo do céu. O platinum blonde brilhando sob o efeito do sol.

Devia ter tirado isso tudo da minha cabeça. Talvez aquilo fosse um sinal.

Ela tomava café numa mesa perto de uma janela que dava para rua. Ela era realmente muito bonita. Sempre correndo o olhar, passando por cima da minha cabeça. Fingia ignorar os olhares que eu lançava sobre ela.

- Boa tarde.

- Eu te conheço?

–Sou assassino de mulheres.

–Como?

–Malaquias o Maníaco.

–Nunca ouvi falar.

–Falam de mim todos os dias na tv.

–E como você vai me matar?

–Não decidi ainda se vou te matar.

Ela me deu um sorriso carinhoso, falso. Ela conhecia o tom de voz dos maus escritores. Impotência criativa, ah esse veneno!

Uma mulher sentada numa mesa ao fundo, começou a cantar uma canção de Chico Buarque. Ela tinha uma boca muito bonita, apesar dos dentes cariados. Todos no bar viraram-se para admirá-la levantar-se, caminhar entre as pessoas aparentemente estáticas, como quem trocam olhares, e sair pela porta e sumir pela rua cantando.

–Parece um filme francês que vi.

–Você está triste?

- Meu cachorro morreu.

Até o dia anterior o animal corria lépido e saudável atrás de um disco voador de plástico colorido que ela arremessava longe com todas as suas forças e ele o trazia na boca deixando escorrer pela língua aquela saliva aquosa, salubre e nojenta.

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F Mendes
Enviado por F Mendes em 26/11/2010
Reeditado em 27/12/2010
Código do texto: T2638872
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