CRUZ CREDO!

A preocupação tomava sempre conta do espírito de Nayara, pois quando adentrava o mundo onírico, via uma escada e, sob a mesma, alguém extraindo uma botija. Sabia que essas histórias pertenciam a uma época remota, provavelmente, quando não havia cofres, bancos, desvalorização da moeda, e sim facilidade para a compra de jóias verdadeiras. -“Puxa, que sonho mais esquisito”!

Já que o pensamento da moça não determinava o local daquela escada, voltou-se para um sobrado que fora do seu avô. -“Será uma atual versão daquela outra”?-interrogava-se.

No casarão que pertencera ao avô materno, havia realmente uma ESCADA, porém não tinha nada a ver com a que sonhava. Fora o imóvel adquirido dos descendentes de um negociante afortunado. Com a sua morte, filhos e netos acabaram com a herança, restando apenas aquela casa, e foi comprada por seu Damião, provavelmente, com uns cem anos de construída, embora não mais pertencesse, também, à família da jovem.

“Ora, ora, conclui! O sobrado do vovô Damião é o local apropriado para a existência de uma botija, mas se eu falar uma história dessas por aí, irão pensar que estou maluca”!

Cada vez que lhe vinha, em sonho, o mesmo cenário, as mesmas imagens, a moça, ao despertar, ficava pensando no conteúdo de uma delas: moedas, correntes, braceletes de ouro; pedras preciosas, pérolas, prata de lei... Intimamente, sorria diante da própria fantasia e temia, encontrando uma botija, ser confundida com alguma ladra, indo, por isso, para trás das grades e, quem sabe, torturada para explicar a origem dos objetos: ” Se eu disser que foi o conteúdo de um tesouro, sob uma camada de, mais ou menos, um metro de areia, quem acreditará em mim? Depois, ia esquecendo os sonhos e os pensamentos.

A casa de Nayara era térrea. Escada, apenas, para um quartinho sobre a garagem, onde acomodava os parentes vindos do interior ou de outros estados, não havia a menor possibilidade de caixa, baú, junto à garagem, seus pais foram os primeiros proprietários do local, antes um pequeno sítio. ”Meu Deus! Não posso mesmo falar nisso para ninguém”!

Certo dia, pais e irmãos resolveram construir outro cômodo, no quintal da casa, contíguo à garagem. Os pedreiros começaram a cavar, junto à escada, para colocarem uma das colunas de sustentação do teto. Súbito, uma surpresa: e enxada levantou, entre a areia, um vidro bojudo, cheio de sal grosso e pedaços de papel. Logo, a notícia espalhou-se pela casa, e a moça correu para o quintal, pensando haver algo de mais valor.

Um dos pedreiros derramou o sal sobre um jornal, porém só havia papéis com nomes de mulheres e das quais nunca ninguém ouviu falar antes. A empregada passou mal, desmaiou; outro pedreiro não mais compareceu ao trabalho, todos temendo o alcance da feitiçaria.

--Cruz credo, exclamou Nayara, benzendo-se!

O certo é que, depois daquele dia, a moça não mais sonhou com escadas e botijas, e o mistério nunca foi realmente desvendado.

FORT-CE

ELIANE ARRUDA
Enviado por ELIANE ARRUDA em 08/01/2011
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