A Outra Margem

Havia um homem sentado às margens do rio. Ele segurava uma fotografia e a olhava com profunda tristeza; era de seu filho, falecido ali havia um ano. Por algumas vezes, desviando seu olhar para o rio, a memória lhe torturava com a imagem de seu garotinho sendo levado pela correnteza, clamando por socorro. Conformar-se com a agonia do menino na hora da morte parecia-lhe estar além de sua capacidade humana e ele chorava inconsoladamente.

O filho era o elo que lhe restara com sua esposa, que morrera no parto cinco anos antes da tragédia no rio. Eles costumavam namorar ali, naquela bela relva, e mais tarde, o pai passou a levar o menino até lá. O homem sempre era muito cuidadoso com o garoto, nunca o deixava entrar sozinho na água, sempre estava em vigília, alerta. Porém, naquele dia, após uma viagem de lembranças ao passado, ele despertou com os apelos do filho sendo levado pelas águas. Desespero... Pular no rio e nadar na tentativa de salvá-lo fora inútil.

– Eu devia ter me afogado também! – Pensava em meio às más recordações.

Em dado momento, o tempo começou a mudar e a correnteza parecia ficar mais forte. Uma imagem de pé, do outro lado do rio, o intrigara. Era seu filho.

– Como pode ser? – Era difícil crer em seus olhos, mas ele não tinha dúvida do que via.

Sem pensar, o homem atirou-se ao rio. Nadava desesperado tentando vencer a corrente, buscava forças onde não tinha. A água o empurrava para o fundo e ele emergia novamente. Seus braços doíam, seu peito formigava, faltava ar... Já sendo vencido, o semblante de seu filho lhe enchera de ânimo e ele nadou. A dor e a agonia se foram, o homem finalmente havia atingido a outra margem.

Quanta paz naquele instante! Toda a aflição de seu coração transformara-se em uma felicidade inebriante. Podia ver seu filho diante de si, vivo. Também, poucos metros à frente, sua esposa. Ela estava linda, como na época em que namoravam. Num impulso de ansiedade, o homem tentou correr ao encontro dos dois, mas uma voz o advertiu.

– Volte, meu amor! – Era a voz de sua esposa, ele a ouvia, mas ela não movia os lábios – Sentimos sua tristeza e queremos você conosco, porém ainda não é hora de vir para esta margem do rio.

Ao ouvir isso, ele sentiu a água sair de seus pulmões e acordou. Estava deitado sobre a relva.

– Você está bem? – Perguntou o jovem que havia acabado de lhe salvar a vida.

– Se estou bem? – Sorriu sereno o homem – Estou vivo novamente.

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Júlio A S Crisóstomo
Enviado por Júlio A S Crisóstomo em 27/11/2011
Reeditado em 02/03/2012
Código do texto: T3359459
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