O MENINO MORTO QUE PEDIA ÁGUA

O MENINO MORTO QUE PEDIA ÁGUA

Naquela pequena cidade do interior, bem no centro, havia um casarão fechado há anos, mas que havia passado por uma grande reforma e agora estava transformada, a parte dos fundos em moradia e a da frente em salas comerciais.

A família de Erus, foi a primeira a alugar aquele casarão. Havia um grande quintal nos fundos com pés de laranja, amora, abacate e mangueiras. A casa era meio estranha porque tinha um cumprido corredor que se estendia de uma extremidade à outra da casa, com os cômodos dos dois lados e no final havia uma grande cozinha, que outrora era a sala de cirurgia.

A família de Erus não era grande, por isto, sobraram quartos. Pra ir da sala à cozinha, quase fazia-se uma viagem, de tão comprida que era a casa, mas era muito agradável, porque era ampla e o silêncio à noite imperava.

Erus era um jovem bem afeiçoado, alto e cursava faculdade de Marketing. Era cristão não praticante, daquele tipo que vai a igreja em ocasiões especiais, do tipo, casamento, batizados, formaturas e achava que só isto já bastava.

Nos primeiros meses da moradia, no novo endereço, tudo transcorreu tranquilamente, sem anormalidades, mas uma bela noite de lua cheia, Erus acorda às 4 da manhã com um barulho estranho, como se houvesse alguém ou algo deslizando no amplo corredor. Sentou-se na cama e ficou ouvindo, mas logo tudo ficou calmo. Na próxima noite no mesmo horário, acorda novamente com aquele barulho de algo rodando pelo corredor de cerâmica. O barulho nãopára e vai sentido à cozinha.

Erus levanta da cama com muito sono, pra ver o que está acontecendo. Ao sair do quarto, olha para o lado da cozinha e vê uma maca de hospital, andando sozinha e que entra na cozinha. Erus arrepia-se por inteiro, mas sente-se curioso pra ver o que era aquilo e caminha lentamente, passo a passo, de meias e pijama, sem fazer barulho. Muito vagarosamente abre a porta da cozinha, que era do tipo vai e vem, e no escuro da noite, iluminada apenas pela claridade da lua, depara-se com uma cena assustadora, para aquela casa: uma maca com rodinhas e sobre a mesma havia uma menino branquinho de cabelos loiros, aparentando uns 4 anos, magrinho, vestindo uma camisolinha branquinha, com apenas algo que não lhe era peculiar: os olhos eram de cor vermelha, do tipo de uma cereja madura.

Erus fica a olhar o menino, sem dizer uma palavra, somente se beliscou para ver se estava sonhando, mas estava bem acordado. O menino sentado na maca, com aqueles olhos vermelhos tristes olhou para Erus e apontou com a mãozinha para a torneira da pia. Não pronunciou uma palavra sequer, mas apontava insistentemente para a torneira, como a implorar por um pouco de água. O menino tinha um semblante angelical, mas quando abriu a boca tentando falar algo, não saiu som, mas saiu um insuportável fedor de enxofre, quanto mais o menino abria a boca, mais fedia.

Neste instante adentra à cozinha uma mulher gorda vestida de enfermeira, com uma cara de má, e também de olhos vermelhos , não vê Erus, mas fala com o menino: “Lucas, quem te autorizou a sair do quarto? Você não pode tomar água, o médico proibiu, vou te levar imediatamente de volta e não saia de lá novamente.” Ai sim o cheiro de enxofre piorou.

A enfermeira sai da cozinha empurrando a maca, muito furiosa, e o menino ainda olha para Erus com ar triste, quase a implorar misericórdia, quando então rola do seu olho uma lágrima, mas não uma lágrima normal, mas de sangue, que escorre e cai no piso branco. Quando eles saem da cozinha o cheiro de enxofre desaparece.

Nos dias seguintes tudo permanece tranquilo, mas Erus não consegue dormir direito. Erus decide então saber o que havia acontecido naquele lugar e procura pessoas mais idosas que lhe informam que naquele lugar, era uma maternidade, onde haviam sido realizados muitos partos e muitas crianças haviam morrido ali. Os médicos responsáveis também já haviam falecido.

Erus sabendo disto, vai até o cemitério municipal e questiona ao funcionário sobre enterros de crianças como nome de Lucas. Haviam mais de 50. Então refina a busca e encontra um enterro de um menino de nome Lucas Weber Waisenthaum, enterrado em 04/04/64, na rua 04, tumulo 04, aos quatro anos.

Erus vai até o endereço no cemitério e depara-se com um jazigo velho, abandonado pelo tempo, sem pintura, sem flor, sem vela, com apenas uma cruz de cimento de cabeça para baixo. Um mural de cerâmica na parede, mas não dava pra ler nada, por causa da sujeira acumulada há anos.

No dia seguinte, Erus retorna ao cemitério, com uma esponja, sabão balde, água e lava a parede de cerâmica. Cansado de tanto esfregar, aparece na parede o nome de Lucas e abaixo uma pequena foto em preto e branco, que deixou Erus estarrecido, era o menino que estava na sua cozinha pedindo água e o pior e mais assustador ainda, a foto em preto e branco que tinha os olhos do menino na cor vermelha cereja.