A Casa da Avenida 76

<<<Nota do autor:

Este conto na verdade era o capítulo 1 de um livro que não irei mais escrever. >>>

1

Nada como um dia após o outro. Essa foi a frase que mais escutei durante quase todo o ano de 1995. Pra mim não foi um ano muito bom e todos os dias pareciam iguais. Mesmo assim eu mesmo repetia – nada como um dia após o outro – tentando acreditar realmente que o amanhã seria melhor.

Quando o telefone tocou na madrugada de sexta feira eu já sabia que não era nenhuma notícia agradável. E como todos já pensam besteira, aqui em casa corremos para o telefone querendo saber quem é e o que querem a essa hora. Pelo menos por aqui não temos o costume de acordar às 3 da manhã e acredito que não é um hábito muito saudável para quem o faz, mas isso não vem ao caso.

A notícia não era realmente boa e muito menos esperada. Meu tio, irmão da minha mãe, havia falecido. Ele sofreu um sério acidente enquanto voltava do trabalho. Neste dia ele pegou a rodovia saindo de Acreúna - uma cidade no interior de Goiás - e quando foi cortar uma carroça avançando a outra pista não percebeu outro carro com o farol desligado, deixando agora uma mulher viúva e dois filhos pequenos órfãos de pai. Ainda me lembro da minha mãe segurar as lágrimas na minha frente e principalmente na frente de minha irmã. Não sei como ela conseguiu. Não lembro muito daquela madrugada, mas lembro dela desligar o telefone dizendo “Voltem a dormir vocês dois”. Um pouco relutante, obedeci mesmo sem saber o que estava acontecendo. Eu na verdade estava entregue ao cansaço da madrugada. Naquela época eu tinha 12 e era muito criança para entender certas atitudes dos meus pais. Muito menos imaginar que eles não haviam dormido nada e que minha mãe não parou de chorar depois que eu e minha irmã fomos dormir naquela noite.

Laura – minha irmã seis anos mais nova – já no outro dia pela manhã começou a me cutucar perguntando sobre meus pais.

- Eu não sei aonde foram – falei sonolento e meio nervoso por ter sido acordado – mas se você não os viu por aqui, por que me acordou?

- Eu não gosto de ficar sozinha aqui nesta casa e você sabe!

- Só que eu estou aqui!

- Sim, e dormindo – é muito gostoso conversar com a minha irmã e vê-la franzir a testa com seus lindos cabelos pretos e lisos sobre o ombro. Faz uma carinha tão especial que mesmo um turrão como eu fica sem jeito e ri – eu tentei esperar você acordar, mas você dorme demais.

- Tá bom! Já estou acordado agora. – Falei esfregando os olhos e bocejando longamente como se fosse engolir um sanduiche em apenas uma dentada, recuperando do choque entre estar dormindo e acordar – Tomou café da manhã?

- Não, estava esperando você também.

Calcei os meus chinelos rapidamente e nem quis trocar de roupa. Fomos para a cozinha preparar algo para comer. Abri a geladeira, peguei um suco e alguns frios que vi por lá e fiquei encarando a geladeira por pelo menos 10 minutos, coisa que todo mundo faz - ou pelo menos eu faço - quando se abre a geladeira e não vê nada apetitoso.

- Nosso tio morreu – disse minha irmã tão naturalmente quanto eu estava abrindo a vasilha de margarina para ver se era realmente margarina ou apenas mais uma vasilha surpresa de feijão.

- Tio, qual tio? – perguntei, porque naquele momento eu não estava sabendo e ainda estava sonolento.

- Nosso tio Francisco.

- Como você sabe disso? Minha mãe ou meu pai contou pra você? – fiquei espantado, pois ela me acordou perguntando pelos meus pais e eu tinha certeza que ela não atendeu ao telefone pela manhã, pois quando o barulhento toca por aqui é impossível não acordar e eu tenho o sono muito leve.

- Nada disso. Foi o meu amigo Sam quem disse.

- Você está mentindo.

- Eu estou com medo – disse e foi fazendo carinha de choro sem nem ligar se eu havia acreditado nela ou não. A cara de choro dela não chegava a franzir a testa, mas era tão bonitinho quanto. Não resisti e larguei tudo pra lá e a abracei.

- Laura, calma. Seja o que for minha mãe está cuidando de tudo junto com o meu pai.

- Sam disse que meu tio não está bem. E que está perdido.

- Pare de falar com esse seu amigo, Laura.

- Por que?

- Ele não é real. Não existe isso. – Falei tão firme que eu mesmo estremeci.

- Você é um bobo. Não sabe de nada! – resolvi parar de contradizer, pois percebi sua testa franzir.

- Calma, calma – falei tentando acalmar a ferinha, pois é muito mais fácil eu mentir uma vez do que escutar uma mentira qualquer da boca de Laura. Na verdade eu estava com mais medo que ela.

Depois daquele episódio, terminamos o café da manhã mais tranquilamente e sem conversas sobre o amigo Sam. Lembro que Laura quase não comeu. Pegou uma fatia de bisnaguinha e só deu uma dentada porque eu pedi. Tomei uma golada de suco de Laranja, comi mais um monte de coisa e depois guardei e arrumei tudo. Era estranho não ter notícias dos pais. Eles não eram nem um pouco ausentes. Na verdade quase nunca ficávamos sozinhos. Somente algo muito sério para que os dois sumissem daquela forma.

Fiquei sem muita ação na espera de notícias e então perguntei a Laura se ela queria ver televisão. Era domingo, nove de julho de 95 e naquela época a ovelha Dolly era famosa. Lembro-me de ligar a TV e estar passando um noticiário sobre clonagem. Concordei com Laura que precisávamos ver algum desenho legal e já que os canais não estavam passando nada infantil, liguei o vídeo cassete colocando uma fita dos clássicos da Disney com vários desenhos. Minha irmã ficou quietinha. Eu por outro lado não parava de pensar e nem prestava atenção no desenho – já tinha visto aquilo tantas vezes com Laura que o filme já estava desbotado – tentei ligar algum fato, alguma lógica naquela história toda. Se Laura estivesse certa eu não engoliria a conversa do amigo Sam.

Logo depois que o Pluto foi julgado culpado e severamente punido – no desenho animado que assistíamos – o telefone tocou alto e esganiçado como sempre. Deixei Laura assistindo o final daquele desenho e fui atender ao telefone. Era meu pai.

- Pai, como você está? Minha mãe está com você? O que está acontecendo?

- Calma! Eu estou bem, sua mãe que está aos prantos aqui.

- O que aconteceu pai? – perguntei querendo que ele respondesse algo totalmente diferente do que realmente estava acontecendo.

- Sabe Pedrol – meu pai me chamava de pedrol assim como quase todos meus amigos. Talvez para encurtar o Pedro Luiz. Esses nomes composto nunca dão certo. E até que eu gostava desse apelido – eu serei direto. Seu tio Francisco teve um acidente muito feio de carro e morreu – escutei ele falar e aquilo me causou náuseas – estou com sua mãe na casa da esposa do seu tio. As duas estão chorando muito. – fiquei mudo por um tempo viajando nas palavras “nosso tio morreu” parecia que estava tudo rodando, eu não sabia em quem acreditar ou se eu acreditava mesmo – Pedro está aí?

Na verdade eu não estava. Não estava em lugar nenhum. Olhei para Laura e mesmo distante percebi ela mexendo a boca e senti um arrepio muito forte. Ela estava conversando sozinha – ou não tão sozinha assim.

- Pedrol, sei que está em choque, mas aterrissa aí. Liguei para falar com você e pedir um favor. Está escutando? – Não sei se ele me chamou novamente, mas voltei para a conversa um tempo depois.

- Estou aqui pai. Estou aqui. – Disse querendo estar com ele. Eu me sentia seguro ao lado dos meus pais. E ainda estava nauseado, tentado disfarçar minha voz de pânico pelo menos ao telefone. – pode falar, papai.

- Seus primos não devem ir ao enterro do pai e sugeri deixá-los com você e Laura. Tudo bem?

- Claro que sim, pai – eu não estava me sentindo bem. E nem sabia o que estava respondendo. Como escutei a palavra “primos” achei melhor nem pensar muito e dizer que estava tudo bem. Eu queria mesmo era estar com mais pessoas e meus primos eram legais. Toda vez que aparecia um primo lá em casa era uma festa só, bagunça, correria, risos. Tudo o que eu estava precisando naquele momento.

- Certo. Passarei aí em cinco ou quinze minutos, ok?

- Estarei esperando aqui. – falei, nos despedimos e desligamos o telefone. Desliguei e fiquei ali parado tentando imaginar onde foi que me perdi naquela conversa toda. Amigo Sam, tio Francisco. O que estava acontecendo?

Olhei para Laura e a danadinha estava quieta ainda assistindo ao desenho. Fui me juntar a ela e antes de tentar dar o primeiro passo uma folha de papel que estava junto ao telefone voou e bateu no meu braço. Achei aquilo estranho. Peguei o papel percebi umas anotações de caneta BIC e me surpreendi.

EU AVISEI, POR QUE NÃO ACREDITOU?

Não foi Laura quem escreveu. Mesmo eu a considerando um gênio, a caligrafia rebuscada do papel não parecia ser de uma criança que estava sendo alfabetizada. E não a vi sair da frente da TV para nada. Notei apenas uma movimentação de seus lábios e nada mais.

Tentando controlar meu medo – não sei quanto tempo levei para isso – fui devagar com o papel na mão até o sofá onde Laura estava e sentei perto dela. Eu não sei descrever o que estava sentindo, mas medo era apenas uma das coisas. Seja amigo ou não o papel foi escrito por alguém que não era da família. Escreveram enquanto eu estava ao telefone e o pior é que foi do meu lado.

Mostrei o papel para Laura para que ela lesse. Ela olhou o papel e ficou calada. Continuou assistindo ao desenho. Sacudi a mão para que ela prestasse atenção ao papel e ela deu um tapinha na minha mão.

- Tira isso daqui! Foi você quem não acreditou no Sam e não eu.

- Do que você está falando? Quem é Sam?

- Ele mora aqui assim como nós. – Disse inocente como se estivesse dizendo que gosta de sorvete de morango com castanha de caju.

- Do que você está falando? Não tem nenhum Sam morando aqui em casa.

- Tem sim. Ele disse que escutou a mamãe chorando ontem à noite depois que estávamos dormindo e ficou sabendo do tio Francisco.

- Laura, você tem certeza do que está dizendo?

- Você não confirmou tudo com o papai ao telefone? – disse e como percebeu que olhei intrigado para ela apenas completou – o Sam disse que era o papai.

- Era o papai mesmo. E ele disse que nossos primos virão para cá – nem terminei de dizer e senti um arrepio forte na espinha.

- Sam e Kelvin não gostam dos nossos primos.

- Kelvin? Quem é Kelvin?

- É o irmão do Sam – disse e chegou bem perto de mim como toda criança faz para contar um segredo – ele me dá medo. Principalmente quando está de mau humor – a voz dela foi abaixando propositalmente como se alguém estivesse chegando perto de nós – Ele grita e fala que não gosta da gente. Você já ouviu alguma vez?

- Não! – Respondi tentando me lembrar de algum grito ou algo assim. Não lembrava, a não ser uma vez que o vizinho gritou alto. Pelo menos eu achava que era o vizinho. – Por que será que nunca consegui escutar nada, Laura? Você conversa com os dois?

- Só com o Sam. O Kelvin não gosta de mim. E eu não gosto de ficar sozinha com ele.

Fiquei ali pensativo e conversando com minha irmã que sem dúvidas era mais corajosa que eu. Pouco depois um barulho na porta da frente me fez acordar e dar graças a Deus.

- Pedrol, chegamos!

Era meu pai com meus primos. Eduardo e Gabriel. Entraram e aparentavam tristes e abalados. Lembro que tentei fazer uma piadinha qualquer e fui cortado pelo meu pai que olhou para mim me fazendo entender o que ele queria dizer. Era clima de luto. Escutar piada enquanto você está sabendo que pedaços do seu pai estão sendo recolhidos em alguma parte da rodovia realmente é complicado.

Conversei um pouco com meu pai, não falei nada sobre Sam ou Kelvin. Apenas perguntei sobre a tia e a minha mãe. Estava achando muito bom estar com meu pai novamente. Toda aquela história estava me embrulhando o estômago. Vi meus primos se juntando a seção desenho de minha irmã. Calados e quietos. Não parecia nenhum pouco com o Eduardo que uns dias atrás estava passando trote a um telefone de supermercado e morrendo de rir dessa façanha. Nem com o Gabriel que brincava de matar passarinhos com um estilingue.

Meu pai disse que precisava voltar para a mamãe e acompanhar o caso todo, perguntou se eu ficaria bem e eu apenas assenti com a cabeça. Ele me abraçou e saiu de casa novamente.

Fechei a porta e tranquei. Fui me juntar à Laura e aos meus primos que estavam todos no sofá, puxei uma cadeira para perto deles e por lá ficamos até os desenhos terminarem. Quando acabou, tirei a fita do vídeo e olhei para eles.

- O que querem fazer? – perguntei, mas não houve respostas. Na expectativa de uma reação positiva e tentando animar o pessoal peguei uma fita VHS – podemos assistir “Ninguém segura esse bebê”? Pegamos ontem na locadora. – Vi um sorriso de animação na cara de Eduardo e Laura o que já bastou para eu colocar a fita e sentar ao lado deles novamente.

Tudo estava tranquilo até que na parte onde os bandidos do filme começam a tentar fazer o bebê dormir escutamos um barulho vindo do meu quarto. Parecia uma porta do armário fechando com força. Pulei da cadeira e me vi obrigado a ir lá.

- Não deve ser nada – disse meu primo não querendo parar o filme. Percebi que Laura me olhava com uma cara suspeita e fiquei pensando no amigo Sam.

- Não precisa pausar o filme, irei lá verificar e já volto. – Não acreditei que essas palavras saíram da minha boca, mas aquilo me deu uma coragem e eu marchei normalmente até a porta do meu quarto. Olhei para trás e vi que todos haviam ficado assistindo ao filme.

Entrei no meu quarto e já diminui o ritmo de caminhada. Vi a porta do guarda roupa aberto e minhas roupas no chão. Eu não me lembrava de ter jogado nada no chão e nem mesmo uma pancada forte fariam com elas caíssem daquela forma. Pareciam que estavam brincando comigo.

Quando peguei as roupas percebi a porta do guarda roupa se fechar sozinha. Levei um susto e perguntei se havia alguém por lá. Meus primos gritaram “Sim” e eu percebi que a porta balançou apenas. Então resolvi fazer um teste.

- Eu estou sozinho neste quarto? – perguntei bem baixinho e vi a porta bater levemente fazendo um pequeno barulho. Será que aquilo era uma resposta? Eu estava assustado e ao mesmo tempo fascinado. – Sam, o amigo de Laura? – a porta balançou sem fazer barulho – Você quem escreveu o recado no papel? – novamente a porta fez o mesmo movimento – o que você quer de mim? – nenhum movimento e fiquei ali parado. Eu estava conversando com uma porta. Será que eu tinha perdido o juízo? Talvez ele respondesse apenas sim ou não – você gosta dos meus primos? – e a porta bateu.

Arrumei as roupas em cima da cama e deixei tudo por lá. Estava em choque e com a adrenalina em todo meu sangue. Não ia conseguir assistir ao filme. Deixei meu quarto e fiquei sentado na cadeira sem rir ou manifestar algo. Apenas estava ali.

O tempo passou rápido e já era noite. O único problema que realmente tivemos foi no almoço que peguei as sobras do dia anterior e esquentei numa panela. Acredito que minha mãe estava tão transtornada com tudo o que aconteceu ao seu irmão que esqueceu um pouco da casa e da gente. Um pouco depois que almoçamos, meu pai liga perguntando se estava tudo bem. Eu disse o que havia comido e ele ficou tranquilo e orgulhoso do filho ter dado um jeito sozinho. Ele também disse que a noite ele voltaria para a janta e era isso que estávamos esperando.

Não demorou muito meu pai aparece na porta perguntando se alguém ali queria pizza. Nós quatro felizes corremos para cima dele e da embalagem da pizza. Foi uma janta muito feliz. Comemos a vontade e logo os olhos começaram a pesar. Meu pai disse que passaria parte da noite fora, mas voltaria logo pela madrugada. Disse para meus primos que se acomodassem por aqui mesmo e perguntou se eu não poderia deixá-los dormir no quarto enquanto eu ficava no sofá. Falei que não tinha problema. Eu só queria ficar longe do meu quarto.

Meu pai conseguiu um colchão e colocou do lado da minha cama. A cama ficaria para o Gabriel e o colchão para o Eduardo. Fez todos nós tomar banho e colocar um pijama esperando todos deitarem, deu um beijo em Laura – que foi a primeira a dormir – depois me abraçou e disse que voltaria logo com a minha mãe. Ficou na sala fazendo hora e quando eu comecei a cochilar ele apagou as luzes e escutei a porta fechar silenciosamente e percebi que estávamos sozinhos novamente. Estava escuro, mas não totalmente. As luzes da rua iluminavam um pouco a sala.

Eu sabia que minhas horas de cochilo haviam acabado. Estava desperto. Principalmente porque senti o meu cobertor sair de mim vagarosamente. Tinha alguém puxando com certeza. Eu congelei e não consegui falar uma palavra. Quando estava somente sobre meus pés fechei os olhos completamente e quando abri percebi um vulto voltando para meu quarto. Olhei para o lado e vi outro papel escrito com aquela caligrafia que eu já conhecia.

TIRE-OS DO MEU (SEU) QUARTO

Eu não conseguia me movimentar e perdi completamente a noção de tempo espaço. Não sei que horas eram ou o que estava acontecendo. Não era uma brincadeira. Era algo muito sério e por isso eu estava tão abalado sem consegui nem ao menos puxar o cobertor para tapar a cara.

Escutei um barulho estranho vindo do meu quarto e mais que depressa fechei os olhos. O barulho vinha aos poucos como se alguém arrastasse – ou empurrasse – um corpo com certa pausa. O ritmo e o som deste arrastar iam aumentando gradativamente e chegando para perto de mim. Tentei abrir um dos olhos, mas pareciam que estavam colados.

Silêncio. Reunindo forças abri o olho esquerdo com certa relutância e vi meu primo dormindo no colchão bem do meu lado. Reuni forças, puxei a coberta e tapei a cara. Estava rezando para meu pai voltar logo. No entanto, senti novamente o cobertor sendo puxado e o suor da minha testa escorrendo em bicas. Tentei ficar de olhos abertos, mas não consegui. Virei para o lado mirei a cabeça onde possivelmente meu primo estava deitado e abri rapidamente os olhos. Só tinha o colchão ali.

Olhei para o colchão naquela penumbra da sala e fui procurando pelo corredor da sala até chegar à porta do meu quarto. Ele estava lá na porta. Pendurado por uma corda no pescoço. Parecia morto. Assustei e aquilo me fez dar um pulo do sofá e fechar os olhos com força. Quando abri e firmei os olhos para o meu quarto não vi mais nada. Olhei para o colchão e ali estava Eduardo. Dei graças aos céus dele estar do meu lado e não enforcado.

Estava tentando esquecer tudo o que acontecera quando escuto um grito que mais parece um guincho sofrido de um animal. Tento procurar de onde saiu aquilo e com medo de olhar para a porta do meu quarto vejo primeiro o colchão. Eduardo dormindo. Não sei quanto tempo depois olhei para a porta e vi Gabriel saindo do quarto vindo em minha direção. Parou quase de frente a mim.

- Me ajuda a pegar essa mosca – Olhei procurando o bicho e não vi nada.

- Mosca?

- É... Está me atrapalhando a dormir – Fiquei caçando a maldita mosca sem nem ter noção naquela época de que meu primo era sonâmbulo. Até que de repente meu primo para olha para seu irmão dormindo do seu lado – Ali, pousou em cima do meu irmão – Quando olho para Eduardo, vejo uma mão saindo de seu peito. Olhei de novo para Gabriel.

- Você está realmente vendo isso também?

- A mosca?

- Não, uma mão...

- Para de tirar sarro, seu idiota – falou e voltou para o quarto resmungando baixo e tropeçando de leve como todo bom sonâmbulo.

Volto a olhar para o outro primo e a mão saindo cada vez mais, apontando para a porta do meu quarto. Não gritei por que faltou voz, acho que minha voz saiu correndo de mim. Fiquei só naquele instante.

Deitei um pouco a cabeça de lado, fechei os olhos e comecei a rezar bem baixinho. Pedia proteção ao anjo de guarda. Quando pedi ajuda a Deus senti alguma coisa pesada deitada em mim. Abri os olhos e deparei com uma criança mais ou menos da minha idade, mas franzina e com os cabelos louros enrolados.

- Você é tão bom quanto a sua irmã, só que mais descrente.

- Quem é você? – Perguntei assustado para aquele ser que estava sentado em cima de mim.

- Pensei que você ia deduzir isso um pouco mais rápido. Sou Samir.

- O amigo Sam da minha irmã.

- Sim. Eu mesmo!

- O que faz aqui? O que quer de mim?

- Não quero nada com você, mas achei você legal. Desculpa se assustei você!

- Eu nunca te vi antes. Por que?

- Porque eu nunca permiti, mas eu sempre estive aqui.

- Seus primos estão incomodando meu irmão. Eles possuem péssimos hábitos e uma aura tenebrosa. Isso incomoda muito. As casas e os quartos ficam magnetizados com uma determinada aura ou vibração. Seus primos são carnes putrefatas. Teria como tirar seu outro primo do seu quarto?

- Sim, mas não consigo carregá-lo e mesmo assim aonde eu o coloco? – falei aquilo sem entender uma palavra do que ele estava tentando me dizer. Apenas concordei.

- Aqui mesmo neste sofá. Preferimos você por lá.

Não sei se eu estava ficando louco, mas fui até meu quarto e vi Samir pegando os pés do meu primo falando para eu cuidar da cabeça. Não demorou muito e meu primo estava no sofá. Dormindo. Eu é que não ia conseguir dormir. Tentei ficar falando com o fantasminha camarada, mas ele não queria muita conversa. Até que perguntei quem eram eles e ele me mandou verificar o fundo do guarda roupa.

Não foi surpresa quando percebi um fundo falso daquele velho guarda roupa de madeira. Tentei não tossir com o tanto de poeira que levantou quando tirei o fundo do guarda roupa e vi uma foto velha ali. Era Samir. O cabelo era inconfundível. Olhei para o lado e não vi mais nada e ninguém.

Peguei a foto, arrumei o guarda roupa e escutei barulho na porta. Escutei cochichos. Eram meus pais. Fiquei tão empolgado que fui pra cama e adormeci rápido.

Acordei, vi que dormi com a foto na mão olhei para o lado e vi Laura sorrindo pra mim.

- Meu amigo Sam – mostrando a foto em minha mão. Sorri de volta pra ela e fiz que sim com a cabeça. Levantei sai do quarto, meu pai me fez um monte de perguntas que não lembro agora, mas recordo quando minha mãe perguntou quem eram as pessoas da foto.

- Dois amigos meu e de Laura – Disse, e no mesmo instante senti um frio estranho na espinha.

- Nossa eu podia jurar que eram os filhos do casal que moraram aqui antes de nós.

Agitei os ombros e em seguida olhei para meus primos. Estavam bem mais tranquilos, mas não se lembravam de ter trocado de lugar comigo. Sorri para o pessoal e olhei para um papel em cima da mesa. Caligrafia inconfundível.

NADA COMO UM DIA APÓS O OUTRO

Ferrachi Abdtzen
Enviado por Ferrachi Abdtzen em 02/09/2014
Código do texto: T4946182
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.