O DEFUNTO
Não pôde acreditar na notícia, pois naquele dia conversaram. Trazia toda a vitalidade na expressão e o aperto de mão da despedida ainda sentia. E agora morto!
No velório muitos presentes. Aproximou do caixão e fitou o morto – parece estar dormindo – disse uma senhora gorda. Concordou com veemência. A pele era rosada em contraste com a palidez característica de um defunto. Fez o sinal da cruz e pousou a mão sobre os dedos entrelaçados, sentiu um arrepio subindo pela coluna, estava quente! Tocou o rosto e a testa, como procura a febre quem não dispõe de um termômetro, aquele homem não poderia estar morto, concluiu. Pôs-se em guarda ao lado do caixão a espera de um sinal, mínimo que fosse, pra acudir a todos sua conclusão. Corria o tempo e sua espera mostrava-se vã. O padre concluía a cerimônia e a água espargida da benção final frustrou sua ultima esperança. O funcionário da funerária com seis porcas borboleta lacrou o caixão que seguiu para o enterro.
Acompanhou de perto o cortejo até a sepultura. Advertiu o coveiro sobre descobrir a pequena abertura na tampa do ataúde, por onde, através de um vidro pode se ver o rosto do defunto, a fim de uma derradeira despedida e ficou pasmo com os olhos entreabertos, mas ninguém comungou com a sua impressão então se fechou. Desceram com quatro ganchos o caixão até o fundo da cova e cobriram com terra. Uma cruz de madeira com a inscrição do nome marcou o local da ultima morada.
Aqueles olhos entreabertos lhe seguiram até em casa. Não sentiu fome. Tomou um banho e foi dormir. Dormiu como uma criança; a salvo das responsabilidades que por vezes assaltam o sono dos adultos.