NABUCODONOSOR

Pessoal comentem caso gostem do texto. Desde já agradeço!

O imperador sanguinário anda de um lado a outro, furioso pela rebelião de Zedequias; enquanto as nações se lhe iam sujeitando uma a uma, por força ou rendimento, aquele pérfido rei que ele próprio pusera sobre o governo de Jerusalém, subvertia-se contra o seu domínio. Porquê? O que o levava a semelhante insânia? Porventura acreditava que algum deus poderia livra-lo da sua mão avassaladora? Indagava Nabucodonosor com os olhos chamejantes perlustrando pelo paço real.

-- Eles confiam no Senhor, meu rei, o Deus de Jerusalém – uma entidade misteriosa que não tem forma nem imagens, o mesmo que se revelou a Moises seu servo e feriu os egípcios com as dez pragas, a fim de separar Israel para ser seu povo e revelar-lhe os seus sagrados mandamentos.

O imperador encarou austero o seu chanceler, estacou os passos e franziu a testa:

-- O Senhor? Não é este o mesmo Deus que o profeta Jeremias alega haver entregado a cidade deles em minhas mãos?

-- Jeremias não é aceito pelo povo, meu rei, ele é tido como um traidor da pátria por encorajar Zedequias e os generais a se submeterem ao teu jugo e irem a Babilônia.

-- Pois muito bem. Zedequias acha que o seu deus irá livra-lo, que se fie no Senhor seu Deus! Vamos ver se Jerusalém resistirá a fúria dos meus exércitos. Pois ei de embriagar a minha espada com o sangue dos seus príncipes, dos seus nobres, dos moços, dos velhos, das virgens e mesmo das suas crianças! Não me apiedarei deles, em verdade que cumprirei o meu intento.

-- Meu rei, Faraó saiu em socorro de Zedequias, por isso os nossos exércitos caldeus se retiraram, conformo ordenastes.

-- As ordens mudaram; mande que o exército ataque Jerusalém, quero que invadam a cidade e profanem o santuário de Deus; que as portas do templo do Senhor sejam queimadas a fogo, os seus precisos vasos sejam fendidos; e Zedequias, juntamente com seus filhos trazei-me ilesos a minha presença, em Ribla. Quanto a faraó caso queira opor-se ao meu poder, quero a terra do Egito queimada a fogo, como sucederá a Jerusalém.

-- E quanto ao profeta Jeremias?

-- Se não o matarem antes, deixa-o ir. Tratai-o benignamente conforme todo o desejo do seu coração.

-- Assim se fará meu senhor. Com a sua licença.

O chanceler curvou-se perante o rei antes de sair, Nabucodonosor anuiu e voltou a sentar-se no seu trono.

***

Zedequias estava desesperado, não sabia ao certo o que fazer; de um lado tinha a voz de Jeremias que aconselhava a sujeição, afirmando que este era o próprio designo de Deus, do outro os seus oficiais o instigavam a resistir e confiar na providência do Senhor. Estavam reunidos na sala do trono no paço de Jerusalém:

-- Senaqueribe não foi um dos que desafiou o nosso Deus e foi destruído por ele? Os seus exércitos eram numerosos como as estrelas do céu, até que a sua arrogância chegou às alturas; não foi preciso que o Senhor fizesse um grande feito para detê-lo. Bastou um anjo para desbaratar cento e oitenta e cinco mil homens do seu exército em uma única noite. Se como o rei Ezequias filho de Acaz, ó rei Zedequias, tu te humilhares perante a face do Senhor nosso Deus e instar pelo seu livramento, certamente que o Senhor nos livrará das mãos do rei de Babilônia. Não seremos estrangeiros em terra estranha.

Disse Pasur um dos oficiais do exército israelita. Zedequias soltou um riso de escárnio; os príncipes e oficiais do recinto emudeceram esperando a resposta do rei.

-- Magor-Missabibe. Este não é o nome que Jeremias te deu general pasur: terror em derredor?

-- Não macule esta reunião com o nome de semelhante ignaro meu senhor. As profecias de Jeremias são como um câncer para nossa nação. Ele desencoraja as mãos do nosso exército, profetizando que o Senhor está com Nabucodonosor. Como pode o Senhor está ao lado de um rei ímpio que não o conhece e que quer destruir o seu povo e a sua santa cidade – a cidade de Davi, seu ungido?

-- O Senhor está irado conosco, porque deixamos os seus mandamentos e nos encurvamos diante de deuses estranhos.

O general encheu-se de furor, bradou ao rei colérico aos olhos de todos:

-- Então crês tu em Jeremias? Se Creres vá segui-lo. Aqui não há espaço para desertores. Aqui há espaço para homens que querem honrar o seu povo e a sua nação; se preciso, dar a vida por ela! Não eis tu o rei de Judá? Ou eis um cão que foge ao som do alarido? Deverias tu ouvir a um louco ou aos conselheiros do teu reino?

Zedequias afrouxou. Calou-se diante daquelas palavras com circunspecção. Temia um motim. Demais, os conselheiros e todos os comensais pareciam inclinarem-se as palavras de Pasur. Ele, a dizer a verdade, estava em um amargo dilema. Queria acreditar que realmente o Senhor ainda estivesse com eles e que conseguiriam resistir aos caldeus, todavia as palavras do profeta fustigavam sua consciência. Ceder a elas, era remar contra a correnteza, possivelmente o fariam figurar aos olhos dos príncipes e da nação como um verdadeiro covarde; principalmente se Nabucodonosor não levasse em consideração seu rendimento e o punisse. Grande seria a vexação! Seria escarnecido por todos; registrado no livro das crônicas dos reis de Israel como o rei que foi subvertido pelo seu próprio medo e enganado por um profeta, tal seria a eternização da sua história. Concluiu de si para si que a melhor coisa a se fazer era manter-se fiel aos seus oficias e encorajar o exército diante das intempéries.

A grande questão é que o destino da nação estava em suas mãos. Ainda que o parlamento o apertasse, a decisão final era sua. Cuidando disso fitou os nobres que o rodeavam, os seus filhos que o escutavam submissos, preocupados com o que poderia acontecer ao progenitor. Olhou pela janela do paço e viu as casas ao redor, a paisagem, algumas colina ao sul donde figurava longinquamente pequenos pontos em movimento que deveriam ser trabalhadores ou animais; viu o céu de Jerusalém que estava límpido e esplendoroso. O destino de tudo e de todos estava nas suas mãos. Respirou fundo fitou os oficiais e ordenou:

-- Prepare o exército. Nós não nos renderemos aos caldeus.

***

De fato Judá resistiu nobremente leitor, dizem os relatos do profeta, que Jerusalém foi sitiada e todos os reinos da terra combatiam contra ela, até que os seus muros foram fendidos e enfim a cidade foi invadida pelo exército inimigo. Zedequias junto aos nobres fugiram de noite entre os dois muros do jardim do rei, mas foram alcançados nas campinas de Jericó.

***

Agora presos, foram levados a Ribla, na terra de Hamate, não restava outra coisa senão suplicar pela clemência do imperador. Nabucodonosor os esperava para enfim encontra-los face a face.

O sol se punha, a noite nascia crespa, cheia de agitações pelo abalo das potências. Os raios cortavam os céus, cintilantes, retumbando um som avassalador; a chuva caia as bátegas sacudindo junto ao vento, as árvores que despejavam suas folhas e seus frutos violentamente. Podiam-se ouvir como que gritos em meio tormenta, vozes dos ventos impetuosos.

-- Os deuses estão furiosos!

Disse um dos soldados que escoltavam a tropa trazida de Jerusalém.

-- É o Deus de Judá ele protesta contra a captura dos seus servos.

Redarguiu o companheiro.

-- Seja como for nenhum deus mudará a sentença de Nabucodonosor. Esses homens certamente morrerão.

Um raio alumiou os céus.

Nabucodonosor levantou-se do trono para receber os prisioneiros; Zedequias e os outros entram manietados no alpendre do paço, que ficava nas alturas de uma colina.

-- Diga-me Zedequias, em quem confiastes quando te voltastes contra mim?

Pergunta o rei Nabucodonosor.

-- No Senhor, no Senhor nosso Deus meu rei.

E se encurva perante o rei de Babilônia.

-- Levante-se (os soldados levantam Zedequias avidamente). Olhe os meus olhos e me diga o que vês?

-- Misericórdia meu senhor! Misericórdia!

Grita o rei e alguns dos oficiais.

-- Calem-se!

Um trovão estronda.

-- Não ouvem? Achei que ao olhar os meus olhos veriam a ira do Senhor vosso Deus que arde contra vós. Não vêm que os trovões é uma ânsia do próprio Deus para que eu execute logo juízos contra vós. O que fizestes para aborrecer tanto a ira do vosso Senhor?

-- Nosso Deus nos ama meu senhor!

Berrou Pasur. Nabucodonosor se aproximou dele, encarou-o face a face.

-- Vou te mostrar que não. Há duas hipóteses: ou eu sou mais poderoso que vosso Deus para vos destruir sem que ele vos possa livrar das minhas mãos, ou Ele se enfarou tanto de vós que decidiu os regurgitar da terra, como se lança fora uma abominação alforja. Pois isso é o que sois, serpentes profanas que se rebelam contra Deus e o seu rei. Se há no Senhor clemência para vós, não o há em mim, dado a isso eu vos sentencio a morte. Arranquem a cabeça dos nobres senhores de Judá aos olhos do homem ao qual o Senhor ama.

Então os soldados arrancaram a cabeça de todos os aristocratas de Judá, amigos de Pasur, perante os seus próprios olhos, os quais se esbugalharam de horro. Magor-missabibe!

-- Vamos apressem-se arranquem-no a cabeça, os abutres do céu tem muita fome igualmente os vermes da terra.

Um relâmpago incandesce o recinto.

Os sodados ajoelham Pasur e arrancam-lhe a cabeça.

-- Meu Deus! Meu Deus! Meu Deus!

Grita Zedequias fremindo desesperado.

-- E esses rapazes tão belos?

-- Meus filhos! Por favor não faça nada a eles!

Nabucodonosor acena aos solados para que os rapazes sejam degolados a vista do pai. Tal foi a cena aterradora! Era como se o pobre rei morresse ainda vivo. Ver a decapitação dos filhos a olho nu partiu-lhe o coração. Estava em pedaços; não podia aguentar mais. Que bom que estaria morto em alguns minutos! Felicitou o fato da última profecia de Jeremias ao seu respeito haver falhado: “Não morrerás a espada, em paz morrerás conforme as incinerações de teus pais”. Que importava mais viver depois daquilo? Jerusalém estava destruída, o templo profanado, os principais do governo mortos, e todo Judá entregue nas mãos de Nabucodonosor.

-- Aproveite bem a visão desta cena, será a última que tu verás.

Zedequias esperou que sua decapitação se executasse; os soldados, ajoelharam-no no chão, lançaram mão da sua cabeça, abriram bem os seus olhos e arrancaram suas pupilas, vazando seus dois olhos com a ponta de uma adaga. Estava feito o juízo.

-- Agora viverás nas trevas pelo resto dos teus dias. Não morrerás.

-- Mas porque?

Indagou o rei ensanguentado, ofegando nas trevas.

-- Porque eu decidi.

Respondeu Nabucodonosor, e virando-se para o seu chanceler que acabava de entrar:

-- Conte as novas de Jerusalém. Embora o rei de Judá esteja cego, a sua audição ainda funciona bem.

-- Sim meu rei; Jerusalém foi devastada, suas portas foram queimadas a fogo; os muros foram derribados por terra; os vasos da casa do Senhor foram fendidos e o templo foi incinerado. Também os principais da terra foram mortos e outros conforme o vosso mandado foram transportados a Babilônia. Deixamos somente os pobres, os miseráveis para que lavrem a terra e plantem vinhas. Também soltamos o profeta Jeremias que estava preso por profetizar no nome do Senhor muitas das coisas que fizestes hoje.

Zedequias rememorou aqueles tempos antigos; não via mais com os olhos, mas a imagem mental estava fresca, as reminiscências emergiam da sua memória trazendo a tona todos os desazos da sua vida, porque não crera em tempo?

Os soldados o levaram ao cárcere aonde ficou até o dia de sua morte.

Dion souza
Enviado por Dion souza em 21/07/2015
Reeditado em 21/07/2015
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