O último soluço

Havia vinte minutos, duas notas e três moedas, e um tique de metrô para ir ao centro da cidade para levar uma encomenda raríssima, especial, vinda do sul africano.

Às setes horas da noite, esperava ansiosa e tensa o metrô, no qual vagaria só pelos grandes prédios da metropolitana São Paulo, em direção à passarela de luxo, ao lado norte da muralha, onde poria fim ao destino da enorme caixa lacrada que pairava aos seus pés. Olhava para aquela encomenda, receosa; parecia tão leve para tamanha caixa, esbranquiçada de bordas douradas com selo no canto superior da lateral, assinalado: rua principal, nº 134.

O que há naquela caixa estranha, naquele lugar estranho, com aquela moça estranha de cabelos amarrados, justapostos à jaqueta que ficava por cima de uma blusa vibrante; fazia frio na terminal, embora em hora precisa?

Discretamente cruzou a ponte, a rua, entrando em um beco longínquo, virando à esquerda onde havia um segurança parado à frente das enferrujadas grades que formavam o portão do desgrenhado motel. Mostrou seu crachá ao homem estátua que deu um sinal de confirmação à moça. O paredão de ferro grunhia ao se abrir, formando sons ensurdecedores.

Existia uma extensa escadaria que chegava ao corredor final; encontrava-se uma porta de aço. Retirou da bolsa um bilhete e redigiu o número correspondente, desceu a escadaria que se dava a uma pequena salinha escura. Bateu na porta e entrou, olhou-a rapidamente para averiguar se continuava com a mesma arrumação: o retrato acima da impressora manual, ao lado da porta a escrivaninha, o abajur no balcão, o vaso de flores, e na gaiola o tucano holandês, entregou-a.

- Sempre pontual! Você honra o compromisso. Comentou olhando para o relógio italiano que reafirmava o horário.

- O que há de novo chefe? Perguntou pretenciosa.

Olhou-a sem fazer julgo, respondeu-a:

- Não há nada "de novo", a qual não saiba. Mais uma de minhas conquistas. Uma eterna relíquia!

Enquanto circulava pelos trilhos voltando da grande megalópole pensava no que havia carregado consigo, o que seria aquela curiosa encomenda, será que mudaria sonhos, destruiria o mundo, se era as noções vagas da vida enraizadas na filosofia de um poeta. Estas e outras questões a atormentava sentada naquela poltrona dentro do metrô, dentro da São Paulo, rebuscada no planeta, localizado no Universo.

Embora a viagem parecesse longa, logo chegou em casa. Decidiu esquecer os maus pensamentos, deixando-os ser levados e arrancados do corpo com o cansaço após um banho de água fria.

Ao sair do banheiro, enrolada em uma toalha, ligou a TV em um noticiário a pouco começado, falava que o agente da CIA havia comprado o "último soluço".

Matheus Ernandes Monteiro de Moraes
Enviado por Matheus Ernandes Monteiro de Moraes em 21/11/2015
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