O BARCO DAS COISAS MAIS IMPORTANTES

Um navio estava em alto-mar e nele haviam muitas pessoas, entre elas, um homem muito rico e ambicioso, que levava consigo malas cheias de dinheiro, roupas de grife, perfumes caríssimos... Tudo de demasiado valor e não tinha nada além do dinheiro, nem sequer uma família. Sucedeu que, quando era noite, que veio uma tempestade forte, aquele navio teve problemas; a água começava a invadi-lo por todos os lados, rompendo as janelas e portas, quebrando as mesas e as belas taças de vidro. E tudo se tornou um alvoroço; as pessoas corriam com o peso da água em suas pernas e gritavam desesperadamente, cheias de medo. Começaram então a baixar os barcos de reserva e era uma disputa acirrada para ver quem entrava nos barcos, uma vez que todos ali queriam se salvar. Eram seis barcos e cinco já haviam sido cheios e saíam pelo mar; restara só um, para no máximo dez pessoas. Eis que, o salva-vidas que preparava aquele barco, vendo o tumulto de gente querendo adentrá-lo, vociferou:

- Ouçam! Ainda há muita gente no navio e apenas dez pessoas poderão subir neste barco! Portanto, essas dez pessoas terão que ter algo realmente muito importante na vida, para que seja justo que se salvem!

Então, a primeira pessoa a se manifestar foi uma mulher, que disse:

- Minha mãe está enferma, e eu preciso muito ir vê-la!

Nisso, o salva-vidas falou:

- Tudo bem. Suba, senhora!

A mulher subiu no barco, aliviada, e o segundo a gritar foi um senhor, já idoso:

- Eu prometi a meu neto que estaria com ele, em seu aniversário, que é no Domingo!

E falou o salva-vidas:

- É justo! Suba, meu senhor!

O idoso então subiu e a terceira pessoa foi uma mulher, com duas crianças. Ela falou:

- Estes são meus filhos e eles perderam o pai...

Logo, disse o salva-vidas:

- Não é preciso dizer mais nada, a senhora pode subir com eles!

Subindo a mulher, com seus dois filhos, só restava agora espaço para cinco pessoas no barco e, com isso, o valor de cada coisa tornava-se maior. Gritou então um homem:

- Minha mulher está perto de dar à luz. Eu preciso chegar na cidade à tempo de ver meu filho nascer!

- É mais que justo! Suba! - falou o salva-vidas.

O homem subiu e se aproximou um casal, que disse:

- Nós estamos prestes a realizarmos nosso grande sonho de nos casarmos na igreja!

Falou, então, o salva-vidas:

- E realizarão! Subam no barco!

Agora, só restavam nada mais que duas vagas e no navio ainda haviam muitas pessoas. Porém, só duas delas, que tivessem algo de muito valor em suas vidas, poderiam subir no barco. Sucedeu que apareceu o homem rico, com as malas cheias de suas riquezas nas mãos e debaixo dos braços, e pulou com pressa no barco, dizendo:

- Eu tenho coisas de muitíssimo valor!

Porém, o salva-vidas o reprovou e falou:

- Ei, você não pode entrar com esse monte de malas! Vai pesar no barco e ocupar muito espaço!

E o homem reclamou, dizendo:

- Mas, todos os meus ternos caros, meu dinheiro e meus materiais de valor estão nessas malas!

- Sinto muito, senhor... Mas, se quiser ficar no barco, terá que deixar as malas.

Sendo assim, com muita lástima, o homem escolheu uma de suas malas e a lançou para fora do barco. E disse o salva-vidas:

- Precisa tirar mais malas!

- Mais?

Ralhou o homem, que se viu obrigado a lançar fora mais uma mala, restando-lhe somente duas. E falou o salva-vidas:

- As outras duas também!

Estupefato, o homem então jogou suas últimas malas e, vendo o salva-vidas consentir com aprovação, exclamou:

- Mas, agora eu não tenho mais nada de valor!

E disse o salva-vidas:

- Sendo assim... Acho que o senhor terá que sair do barco.

E pôs ele o homem que era rico para fora do barco; contudo, este outro falou:

- Espere! Eu... Eu ainda tenho algo de valor!

- O quê? - indagou o salva-vidas.

- Tenho... Tenho um filho! - mentiu.

- Bom... Então está bem, volte para o barco.

O homem, que agora estava sem suas riquezas, subiu novamente no barco e respirou com alívio. E só sobrou lugar para uma única pessoa no barco. Entretanto, se aproximou do salva-vidas um homem, com um menino, pedindo para os deixar entrarem no barco. Todavia, o salva-vidas os barrou e falou:

- Eu sinto muito, mas, só há lugar para uma pessoa agora!

- Mas, eu estou com meu filho! - aquele homem exclamou, desesperado.

- Sinto muito, senhor. Ou só o senhor, ou só seu filho, poderá subir no barco.

O pai olhou absimado para o salva-vidas e abraçou fortemente seu filho, não querendo se separar dele. Ora, isso o homem que era rico viu e, muito lhe doendo, ele mirou a vista no menino e gritou:

- Filho! Venha!

O menino olhou estranhamente para aquele homem que não conhecia, mas, tendo seu pai consentido em silêncio, para que ele fosse, o menino correu e subiu no barco. Agora, não faltava mais ninguém. O salva-vidas já ia soltar o barco e as pessoas dentro dele davam graças a Deus, porque logo estariam livres daquele pesadelo e voltariam para suas casas. Porém, o pai que ficara no navio, chorava, porque sentiria muita falta de seu filho tão amado. Só que, quando o barco estava a ponto de cair no mar, o homem que era rico se levantou depressa, dizendo ao salva-vidas:

- Espere! Eu me esqueci de algo muito importante mesmo!

- Mas, você não pode sair agora! - o salva-vidas exclamou para ele.

- Será rápido, eu prometo!

E, mirando o homem rico a vista no pai do menino, gritou para ele:

- Ei, você! Pode guardar aqui meu lugar, enquanto busco algo muito importante que esqueci?

- Posso! - respondeu o outro.

Então, o homem que era rico saiu do barco e no seu lugar se sentou o pai do menino, este outro que estava também no barco, bem ao seu lado. Nisso, inclinando-se para aquele pai, o homem que era rico murmurou:

- Cuide bem de seu filho.

E, sorrindo o pai, ainda meio assustado, consentiu e permaneceu ali, no barco, ao passo que o homem que era rico ficara no navio, quieto. Ora, não voltando mais ele ao barco, disse o salva-vidas para as dez pessoas:

- Não dá mais para esperar! Vou soltar o barco!

Assim, foi-se o barco pela imensidão escura do mar, enquanto o homem que era rico contemplava, da proa inundada do navio, aquele pequeno barquinho desaparecer, cheio das coisas mais importantes.

Lyta Santos
Enviado por Lyta Santos em 18/01/2018
Reeditado em 18/01/2018
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