SOBREVIVENTE

Meu pai sempre foi um homem muito simples e um dos seus

ensinamentos era que a maior riqueza do ser humano e o

conhecimento.

E desde muito cedo ele me ensinou sobre literatura, filosofia

despertando em mim uma paixao incondicional pelas letras.

Quando meu pai adoeceu eu conheci o Francisco, um homem

cordial, gentil e encantador.

De repente eu estava vivendo uma paixao avassaladora e

logo que meu pai morreu nos casamos.

Do homem gentil Francisco se transformou em alguem cruel

e violento.

E quando nos mudamos para o sitio dele eu passei a ser uma de

seus empregados.

Eu acordava bem cedo e precisava limpar, passar, cozinhar,

costurar suas roupas e obedece-lo.

Muitas vezes fora suas explosoes de ira e por muitas outras eu

temi pela minha propria vida.

Ele havia me proibido de escrever, de ler meus livros e quando

ousei desobedece-lo ele incendiou meus livros.

Assustada com tal insanidade tentei argumentar, mas o peso da

mao dele me calou.

Mesmo sabendo dos riscos eu tentava ensinar as crianças do

sitio, e todas as tardes que ele estava fora eu as recebia em

casa.

Um dia ele chegou mais cedo me surpreendendo e vendo as

crianças em minha volta ele me pegou pelos cabelos.

Assustadas elas sairam correndo e o que se sucedeu foi uma

seçao de espancamento e para me impedir ele quebrou meus

dedos.

Senti dores horriveis, mas a dor era em minha alma, como poderia

ele querer me conter diante da minha paixao efemera pelas

letras.

O enfrentei teimando em escrever, por muitas vezes as surras

que ele me dava me deixava por dias sem conseguir andar.

Quando o olhava nos olhos a procura do homem em que eu amei

pela doçura e cordialidade, encontrava um homem atormentado

e insano.

Certa noite ele me acordou e temendo o pior me levantei para

tentar fugir dele, mas nao consegui.

Ele atirou querosene sobre mim, principalmente em minhas maos

e enquanto meu corpo se incendiava ele se virou e saiu do

quarto.

Com o corpo em chamas sai correndo, pedindo ajuda e foi um

capataz do sitio que apagou a chamas.

Eu me lembro de ter ouvido a voz do Francisco perguntando se

eu havia morrido, mas o capataz teve piedade de mim e disse

que sim.

Friamente ele pediu que este colocasse meu corpo num saco e

que juntos me jogariam no rio.

Tudo que me lembro foi da agua fria do mes de junho me deixan-

do sem ar, da dor insuportavel sendo suavisada pela temperatura

congelante.

Eu ja nao me lembro de muitas coisas, meu cerebro parece que

me fez esquecer as maiorias das lembranças para me proteger

da dor e tristeza.

Hoje depois de alguns anos eu vivo num abrigo para mulheres

vitimas de violencia domestica.

Falar desta fase da minha vida me dilacera o coraçao e prefiro

falar da concretizaçao do meu sonho em educar pessoas semi-

analfabetas e a publicaçao do meu livro.

A crueldade que sofri se resume em, um homem de mente primi-

tiva sempre vai preferi um ser tolo para exercer seu comando

privando este de qualquer evoluçao.

CAMOMILLA HASSAN

CAMOMILLA HASSAN
Enviado por CAMOMILLA HASSAN em 19/03/2008
Reeditado em 19/03/2008
Código do texto: T908259
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