A lição.

Alguns vão dizer que não tenho sentimentos, outros que sou apenas uma pessoa curiosa.

Mas se tem algo que sempre despertou minha curiosidade foi à morte, era só chegar ao meu conhecimento que havia algum cadáver próximo para minha excitação aumentar e eu me dirigir para o espetáculo; é assim que eu defino cadáveres expostos em vias publicas um grande espetáculo.

Não sou uma pessoa doente, sou casado há trinta anos com a mesma mulher tenho dois filhos, gosto de fazer programas em família, beber com amigos, contar piadas, assistir jogos de futebol pela televisão, mas observar mortos na rua sempre foi minha paixão secreta.

Numa sexta feira voltava de carro para casa depois de um dia cansativo de trabalho, quando avistei uma aglomeração de pessoas na rua.

Meu coração começou a bater mais forte, sentia que ali havia acontecido um acidente, parei meu carro em frente a uma loja de roupas e andei apressadamente em direção a aglomeração de pessoas.

A primeira coisa que eu vi foi uma moto com a frente toda destruída e mais a frente um ônibus parado. Entre a moto e o ônibus me deparei com um corpo já coberto por um saco preto, me agachei, e puxei o saco. Foi quando o mundo parou. Não conseguia mais respirar, o rosto estava quase todo esfolado, mas o pouco que eu podia ver tinha certeza que era meu filho. Não podia ser ele, era tão jovem, acabará de completar dezenove anos.

Lagrimas jorravam do meu rosto. Do meu lado direito surgiu uma menina apontando um celular para o que sobrara do rosto do meu filho.

Dei um grito, e fui em direção a ela para tomar o celular.

Algumas pessoas riam da situação.

Será que vocês não respeitam o sofrimento dos outros? Gritei para a multidão.

Avistei um senhor que ria bastante no meio da multidão, o reconheci na hora, mas aquilo não poderia ser verdade.

Eu tinha visto aquele homem morto na semana passada, ele andava na rua quando sofreu um infarto.

Seus olhos estavam sobre mim, seus lábios se moviam vagarosamente eu podia entender o que ele estava dizendo, e ele dizia: como é que você se sente agora?

Do meio da multidão começaram a aparecer outras vitimas de acidentes que eu presenciei, todas apontavam e riam.

Uma garotinha de quatro anos que havia caído da janela do quinto andar de um prédio dançava e cantava em volta do corpo do meu filho.

Mais pessoas iam chegando, o rosto de todas elas expressava curiosidade.

Ninguém respeitava o meu sofrimento.

Toda hora um curioso vinha descobrir o corpo do meu filho apenas para saciar a sua curiosidade.

Agora entendo que não é certo brincar com o sentimento dos outros, mas paguei caro para aprender essa lição, não sei se os mortos estavam ali de verdade, ou foi o choque de ver meu filho estirado que me levou aquela situação, o fato é que agora penso duas vezes antes de saciar a minha curiosidade.