CONTOS DE CRETUS - E NASCE UM MONSTRO

E lá estava ele, pulando de prédio em prédio, desbravando aquele que considerava seu território, a sensação de liberdade o contagiava nesses momentos, enchendo seu peito de tranqüilidade e força. A força que fora tão necessária para mover a sociedade, a vontade desesperante de tentar um novo amanhã, a crença tola que o futuro provavelmente será melhor... tolices, mas ainda assim agradáveis de se sentir.

Já fazia algumas horas que estava a “sobrevoar” a cidade velha com seus saltos, mas sentira a necessidade psíquica de sentar-se para degustar de um cigarro, e assim o fez. Enquanto ouvir o som do cigarro amassado se queimar, e a fumaça densa adentrar seus pulmões com violência, observava as poucas estrelas daquela noite fria, e pensava sobre sua falta de medo, em como aquilo contagiava cada canto do seu ser, e o tornava a cada dia mais e mais anestesiado, e distanciava o artista que um dia vivera naquele corpo monstruoso. Suspirou por um instante, abaixando a face encoberta pela mascara escura de lã. Pensava agora no garoto de interior esquecido, na vida que tanto o privava, não por agir como de fato agia, mas pelo que de sentia. Tanto ódio, dor, violência. Tudo isso o privava de um sincero relacionamento com a sociedade e o deixava cada vez mas próximo do monstro que era, do homem que tirava vidas, ainda que de pessoas sádicas, e consideradas ruins, ainda assim tirava vidas. Parecia que cada dia, o Mariposa se sobrepunha ao Jerry Rocco, e que ao contrario que pensava, os dois se tornariam um, é mais evidente que um engoliria o outro. Fora quando ouvira um ruído, ainda que baixo, sabia de alguma forma que merecia atenção diante daquele pandemônio auditivo. Mas o perseguiu lentamente até o parapeito daquele prédio, mas nada parecia ser suspeito, olhara para os lados, e enquanto tragava caminhara com calma ate a porta que levava a escadaria e assim as desceu, e cada vez os gritos se tornavam mais altos, o coração por um momento palpitou com mais velocidade, mas não sabia dizer se por excitação ou medo. Olhava para os lados na esperança de não ver ninguém, e de fato não haveria aquele que continham a bravura de abrir suas portas durante as noites da cidade velha., Crestus era um inferno, e quem não sabia disso possivelmente já estava morto. Os passos o aproximavam da porta “35 B”, e ficou alguns segundos diante da tosca porta enquanto ouvia dos gritos. Mas ouvira um grito. A fechadura se arrebentou com o chute de Jerry. Ele vira os dois o olhando, a expressão terrível de susto em seus olhos, o homem havia erguido a mão para golpear a mulher, e essa, com suas lagrimas refletia sobre a luz da lareira com sua chama forte que bailava sobre o desespero daquela jovem. Jerry (ou mariposa) lembrou-se do diabo naquele momento, e pensou de que lado ele estava, não ele, Jerry, mas sim o próprio Lúcifer, talvez não passasse de um aliado de Deus, provavelmente o mais importante, já que sem ele, Deus não existiria. Mas o pensamento logo passou, o homem o olhava e a mulher abraçava o mesmo. Jerry franziu o cenho enquanto os observava e então ouvira:

- Some daqui! – e então o homem lançou um objeto em sua direção, e com facilidade, Mariposa o desviou, ódio o subiu, mal teve a chance de questionar aquela sensação e o atacou. Desferiu com todo seu ódio, sentindo o punho tocar a face, e quebrar seus dentes enquanto a mão se enche de cortes. O corpo da vitima cai sobre ao chão frio do apartamento medíocre. Mariposa apenas ouvi o grito da segunda vitima, a mulher, que tenta correr, mas não consegue, ele a agarra pelo pescoço, e enquanto ela luta desesperadamente pela vida, e debatendo, e na tentativa tola de gritos já ineficazes péla sufocação das mãos de Mariposa em seu pescoço. Ela chora, e sussurra – ou tenta sussurrar – um “por favor”, mas Mariposa pouco se importa, o coração se enche de ódio, uma raiva que foge da compreensão humana, ou pelo menos da dele, e então, com as duas mãos continua a apertar, e apertar, até sentir que seu corpo não parece pulsar como antes, a vida não jorra (seja de medo ou não) como deveria, e sentindo-se como a criança que não vê mais graça em um brinquedo, a arremessa o mais longe que pode, e nesse momento nota que o homem ainda continua vivo. Por trás da mascara de lá escura surge um sorriso diabólico de satisfação. O homem ainda estava deitado, tentava erguer-se enquanto balançava os braços e chamava pela mulher, mas não houve tempo. Logo Mariposa estava sobre ele. Socos e mais socos que não demoraram muitos para trincarem seu crânio e por fim o fraturarem de vez, sentia sua forma sobrehumana exalar pelos seus punhos que desfiguravam aquele ser que nem mesmo o nome sabia. O sangue vertia pelos lábios entre gemidos estranhos, até que tudo parou, exceto o som dos socos de Jerry (ou Mariposa) , e por fim este parara, não por cansaço, mas por ouvir o som peculiar de no outro quarto. Ergueu o tronco, observou por alguns segundos uma das portas do curto corredor. Ergue-se, e caminhou até ele, com o corpo curvado como qualquer demônio faria nas mentes criativas, e notou que a porta estava aberta, apenas a empurrou lentamente, e apesar da escuridão, sabia ter alguém ali, que era frágil e o temia. Era como se pudesse ouvir seus batimentos cardíacos. A cada segundo Mariposa se sentia mais forte, repleto de uma poder inimaginável. Dera um passo adentrando aquela quarto escuro, e ouvir um gemido, era agudo como de uma criança, provavelmente um menino. Mas nem mesmo pensara, os olhos franziram, e então avançou como uma animal que vira sua presa sem escapatória, e por fim um grito. Os socos foram muitos, tantos que provavelmente aquele rosto ingênuo se tornara irreconhecível.

Agora o coração não palpitava de emoção como antes, a mente não estava tão rápida, e a alma se ressentia sobre seus atos. A mascara sobre o sofá, enquanto os olhos claros observavam aqueles três seres mortos ao chão, com seus peitos abertos, o sangue que já secava no chão rio daquele apartamento. Mas apesar de tudo, o que chocava Jerry não fora a capacidade de matar aquele casal, mas a criança. As mãos passavam sobre os bagunçados cabelos loiros enquanto dizia em um sussurro para si mesmo

- que diabos de demônio que sou eu? A muito tempo ultrapassei o limite sádico do ser humano...

Zé Rizzotto
Enviado por Zé Rizzotto em 21/05/2006
Reeditado em 21/05/2006
Código do texto: T159861