Ele...

“Eu não sei muito bem quando ele começou a me fazer mal... Éramos tão amigos, brincávamos juntos durante horas. Tudo mudou de repente... À noite ele vinha, tenho certeza de que era ele, ele vinha e começava a fazer barulhos estranhos, barulhos que se assemelhavam a ossos se quebrando, suspiros desesperados, era como se alguém estivesse preso em algum lugar e começasse a arranhar a porta ou parede, sei lá, tentando escapar...Eu ouço isso durante toda a noite...Todos os dias...Ainda, ainda agora consigo ouvir aqueles lamentos horríveis”.

Enquanto entrelaçava nervosamente os dedos uns nos outros, Alberto olhava ansiosamente para os lados, como se estivesse verificando que ele não estava ali.

“Ele ─ disse sussurrando ─ Ele se zangava, eu acho, porque eu sentia medo... Dizia que eu era covarde, mas, mas eu sentia que sufocava quando fingíamos que estávamos sendo soterrados. Eu sentia os vermes passeando pelo meu corpo despreocupadamente enquanto brincávamos que havíamos morrido, eu conseguia sentir o cheiro da minha carne apodrecida... Eu sentia medo, eu queria parar com essas brincadeiras, mas ele não. Aí teve um dia que ele não apareceu, e eu fiquei feliz porque ele havia ido embora, eu não sentia falta dele.”

Nesse momento Alberto sorria de maneira doentia enquanto movimentava cada vez mais rápido suas mãos e mantinha seu olhar fixo no relógio empoeirado que já não funcionava mais, e que ficava acima da porta do seu quarto.

“Mas ele voltou, e voltou mal, voltou perverso e foi quando os barulhos começaram... Foi quando eu comecei a ter medo de dormir e ele me matar... Sim porque ele é louco! Ele não dorme, não descansa... Seus olhos estão sempre abertos, me vendo! Oh! Eu já tentei tantas vezes fugir dele, mas ele sempre vem atrás, ele sempre me alcança... Ele não me deixa ter paz, não me deixa viver... Eu não vivo mais, apenas resisto ao tempo, apenas espero pelo momento em que ele vai voltar e pelo momento em que todas aquelas lamurias virão me tirar o sono, me atormentando madrugada adentro enquanto todas as outras pessoas dormem. Durante o dia eu não posso vê-lo, mas eu sei que ele está lá espreitando, observando... lendo meus pensamentos, tomando conhecimento dos meus planos de fuga.”

Um barulho qualquer parece chamar a atenção de Alberto e ele ressabido fica imóvel esperando pelo barulho seguinte que parece nunca surgir.

“Ah, meu Deus! Eu posso escutá-lo... Ele está vindo! ─ disse Alberto enquanto empalidecia ─ Ele está ali, ele está ali! ─ gritou enquanto apontava para a sua própria imagem refletida no espelho à sua frente.”

Brasi Wykeman
Enviado por Brasi Wykeman em 04/07/2006
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