A Vingança

18:00h quarta-feira

Havia chovido muito durante todo o dia. Ainda agora uma fina garoa insistia em cair.

Poucas pessoas circulando pela ruas. Frio. Chuva.

Jovens voltando da escola, fazendo barulho típico da idade, muito riso e brincadeiras.

Aos poucos vão se dispersando e cada um toma seu rumo. Uns param nos pontos de ônibus, outros seguem a pé.

Já está bem escuro pelo tempo chuvoso. Marly mora na periferia, espera o ônibus. Se despede dos colegas e fica em pé no ponto de ônibus, pois com chuva o banco está todo molhado.

Tem ainda uns quinze minutos para o seu ônibus passar. Normal. Todos os dias é assim.

Somente ela no ponto. As ruas vazias. Poucos carros circulam naquele bairro.

Se passaram cinco minutos. Hoje parece que os minutos estão demorando mais ainda. Ela tira um tocador de Mp3 da mochila e fica procurando algo para ouvir. Se distrai. Encontra a musica que quer. Black in back.

Percebe que a garoa se torna em chuva fina e engrossando. Percebe também alguém em pé ao seu lado. Se assusta.

Um homem magro, alto, pele bem branca, cabeça toda raspada, até simpático. Ele diz oi. Ela responde. Sente medo.

A chuva aumenta e pessoas passam apressadas.

O desconforto aumenta quando ela percebe que o estranho ao seu lado olha fixamente para ela, dos pés à cabeça.

O medo aumenta. Ela presente o perigo. Se abraça á mochila e olha a hora. Desespero.

A chuva agora está bem forte. A rua escura. Seu coração disparado.

O medo atinge seu ponto máximo quando percebe que o homem ao seu lado tem na mão direita algo brilhando. Uma faca.

Ela fica imóvel, paralisada pelo medo, pelo desespero, tenta gritar mas a voz não sai. Choque.

Ela sente a aproximação do estranho sem poder se mover. Sente sua mãos a tocarem. Ele a abraça, sem reação. Acompanha-o.

Um beco perto dali. Entram. Ela sente as lágrimas escorrendo. Ela sabe o que vai acontecer. Os olhos do agressor estão em transe. Fora de si, como se possuído por um ser maligno. Ela não consegue reagir. A dor.

Sente o hálito dele se aproximando de seus lábios. Sente sendo levada de seu corpo. A dor, a vergonha e humilhação.

Suas roupas rasgadas, sua mochila jogada junto aos entulhos do beco. Sozinha. Sem ninguém,

Seus pensamentos viajam. Seus pais, amigos, escola. Tudo passando por sua cabeça.

De repente um despertar. Abre os olhos e vê novamente aquele homem vindo pra cima dela.

Ela quer lutar, fugir, correr. Ele a agarra, suas mãos são fortes. Ela tenta com toda sua força escapar. Mordidas.

Gritos. A fúria do homem aumenta. Com as mãos na garganta de Marly, ele olha fixamente nos olhos dela.

O ar se acabando. Os pensamentos indo e vindo. Indo. A escuridão aumentando. Não vê mais nada. Não sente mais nada.

Seu corpo jaz no chão, junto à mochila. O mp3 ainda a tocar. A chuva caindo. Forte.

Como lágrimas chorando uma dor sem fim. Marly.

O agressor de deixa cair como se estivesse cansado. Simplesmente olha a menina. Morta? Desmaiada? Dormindo?

Sua mente começa a voltar ao mundo real. Vagas lembranças. Como sempre.

No fundo ele sempre sabe o que fez. Não é a primeira vez. Não será a última. Ou será?

Ele adormece como se estivesse anestesiado.

Uma voz doce o faz acordar. Sua cabeça dói. A menina volta a si. O chama suave.

Ele tenta se levantar mas caí sobre seu próprio corpo. Ela o olha como se não o visse. Ele se aproxima como se hipnotizado pelo olhar da menina a quem ele tinha feito mal. Ela tem um sorriso enigmático nos lábios.

Ela é muito bonita. Mais perto, olhos perdidos no nada, a boca semi aberta. Bem perto.

Ele se assusta quando vê que os olhos dela estão fixos nos dele, como se ela conseguisse ver sua alma, sua maldade e todos seus crimes. Um arrepio percorreu seu corpo. O rosto doce e bonito da menina mudara. Ele via todo ódio que ela tinha nos olhos. Sente algo segurando seu pescoço, o ar faltando, o desespero e a dor invadindo seu corpo e alma.

Foi assim que eu me senti. Foi essa mesma dor e desespero. Mas foi muito pior, além da vida, perdi minha virtude, perdi tudo.

Você está perdendo somente a vida, que não vale nada pra você.

Foi isso que o homem desesperado como nunca esteve na vida ouviu. As últimas palavras que entraram pelos seus ouvidos.

06:00 hs quinta feira

Algumas pessoas já circulam indo para o trabalho, escola e outros afazeres.

De repente um grito seco de medo e susto vindo do beco. Pessoas que circulavam por perto ou que estavam no ponto de ônibus correm para o local. No beco, uma senhora catadora de papel com as mãos na boca ainda aberta e de olhos apavorados.

Junto aos papéis e outras coisas que ela iria recolher, uma cena dantesca: uma menina semi-nua, com marcas arroxeadas no pescoço, sem vida. Há poucos metros dela um homem forte com os olhos arregalados e a garganta simplesmente destroçada.

Alguém chamou a polícia que chegou rápido. A cena realmente era assustadora. Muitas perguntas no ar.

Nenhuma testemunha. Haveria uma terceira pessoa envolvida?

A menina foi identificada. O homem somente se soube que havia sido visto circulando pelas ruas da cidade.

O caso foi arquivado.

Pelo menos por enquanto.....

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3 anos depois. Quinta feira, 22 hs.

O chefe de investigações especiais liga para o investigador Robério:

- Boa noite Robério. Sei que está de folga hoje mas preciso que dê um pulo até a delegacia agora.

Tenho um caso que você vai gostar.

Robério ainda esparramado no sofá, assistindo alguns vídeos de casos antigos já resolvidos, só pediu alguns minutos e já estaria lá.

Robério era considerado por seus companheiros de trabalho como “estranho”, aficcionado pelo trabalho, quase obcecado.

Não fumava como a maioria, não usava nada que contive álcool e era vegetariano há muitos anos. Solteiro por opção, um semblante sempre centrado, de poucas palavras, mas sempre uma boa companhia que tentava sempre ajudar a todos.

Na verdade era isso que sabiam sobre ele. Nada mais, ele não dava muita liberdade para que o questionassem sobre sua vida.

Em 18 minutos estava na sala da chefia de investigação.

Wander, o chefe, sentado na cadeira atrás de sua ampla mesa com tampo de vidro no formato triangular, uma breve ligação com a maçonaria. Sobre a mesa, muitos papéis e algumas fotos. Wander fumava como sempre fazia, num canto da mesa um copo de café fumegando, deveria ser o terceiro ou quarto copo.

Olhou por sobre os óculos pendurados sobre o nariz. E cumprimentou Robério de modo costumeiro:

- Boa noite, Preparado?

Robério correu os olhos pelas fotos e papéis espalhados pela mesa, puxou a cadeira, sentou-se:

-Sempre. Preparado sempre.

Quanto tempo tenho? Quem é o figurão das fotos? Quais as pistas?

Wander olhou bem no fundo dos olhos de Robério com ar preocupado.

- Sem pistas ainda, o cara é um dono de franquia de escola de informática, solteiro, sem família, situação financeira boa, sem passagem pela policia, sem envolvimento com drogas, nada que consta contra ele, pessoa exemplar. E com relação ao tempo; bem, acho que 45 dias é suficiente, depois disso, arquivamos o caso.

Só um detalhe, não roubaram nada. Nada.

Robério olhava atento as fotos enquanto ouvia as vozes do chefe entrando no seu cérebro que processava agilmente.

AS fotos não eram agradáveis, mas nada que ele ainda não tivesse visto nos seus muitos dias e noites de trabalho em casos, alguns arquivados pela complexidade apresentada.

Nas fotos um homem aparentando 40 e poucos anos, dentro de um carro, uma mercedes, olhos arregalados, aparentemente desesperado, a garganta estraçalhada, mas percebia-se que fora estrangulado até os dedos do agressor rasgarem a pele e a carne, deixando exposto veias , traquéia, deixando uma imagem bem desagradável.

Robério analisou as fotos, olhou novamente os papéis. Já tinha visto aquelas imagens antes. E mais de uma vez.

Wander só indicou o arquivo no canto da sala. Casos arquivados escrito nas portas.

- Fique à vontade.

A cabeça de Robério trabalhava a todo vapor. As imagens vindo à sua mente, todas elas, a semelhança das fotos, o olhar desesperado de cada vítima, as marcas na garganta estraçalhada. Qual a ligação? Ele não conseguia ligar os pontos, mas sabia que algo os unia, e ele iria descobrir dessa vez.

Abriu o arquivo, pegou seis pastas, com datas distintas. Em cada pasta um crime, um rosto, um enigma. Em cada pasta uma frustração de um caso não resolvido, mas esse seria diferente, iria ao inferno se preciso fosse, mas resolveria, e junto com ele, todos os outros seriam resolvidos. Todos.

Despede-se de Wander com um simples aperto de mão e boa noite.

- Dou notícias assim que tiver novas.

- Estou saindo também, estou um caco. Te acompanho até a rua.

Desceram. A noite estava bem escura, devido as chuvas que caíram e ainda estava por cair.

Já na calçada se despedem, Wander entra no carro, oferece carona mas Robério prefere caminhar e pensar, tentar descobrir algo que possa unir os pontos.

Já m casa, Robério deixa as pastas na mesa e vai tomar uma ducha e tentar dormir um pouco, pois sabe que a partir daquele momento, dormirá muito pouco, como em todos os outros casos, mas com a diferença que esse será resolvido, ele sente isso e isso o deixa fascinado, impaciente, mas ainda assim precisa descansar.

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Que pista Robério tem? Nenhuma.

Vai até a escola de informática tentar arrancar algumas informações sobre a vítima. Descobre com quem ele teria falado pela última vez antes de ter aquele fim trágico.

Hugo. O braço direito do Sr. Haroldo, o poderoso da informática assassinado. Consegue uma hora para falar com Hugo.

Marcam de se encontrarem numa lanchonete perto dali ás 13:00 h.

Robério chega, se senta e espera ansioso. 10, 15 minutos. Impaciente toma um suco. Espera. Hugo chega.

Rapaz jovem, bem apresentado, semblante calmo, centrado, tranqüilo.

Se cumprimentam, pedem o lanche. Conversam. Sabiam pelo que estavam ali.

Robério vai direto ao assunto:

-Há quanto tempo trabalha com o Sr. Haroldo? Me fale sobre ele.

Calmamente responde:

-Fazem 8 anos, desde quando ele fundou a escola. Trabalhávamos em outra escola. Ele abriu um negócio próprio e me ofereceu um cargo de liderança.

Sr. Haroldo era muito carismático, porém misterioso, inteligente, de poucas palavras, na verdade eu o conhecia pouco.

Somente o que ele deixava as pessoas conhecerem.

Mas posso afirmar que era do bem. Sem vícios, sem inimigos, veio do interior quando bem jovem, mas nunca soube que tenha voltado para lá nem a passeio.

-Interessante, cortou Robério.

Tinha namorada? Como era sua vida pessoal, digo, freqüentava algumas baladas, bares ou coisas parecidas?

-Não que eu soubesse- Hugo respondeu sem pensar muito.

-E quando o viu pela última vez? Indagou Robério

-Bem, na verdade, foi na noite do crime, ficamos na escola até 23 h, fechamos uns relatórios, ele me deixou em casa e o resto...

Bem, isso você sabe melhor do que eu.

-Alguma coisa diferente aconteceu ou que você tenha visto nesse dia que tenha chamado sua atenção?

Hugo fica pensativo, tentando se lembrar de algo.

Alguns minutos se passam. Hugo pensando.

Por fim, como que levando um susto, se levanta, e começa a andar ainda meditativo, olha para Robério.

-Sim, houve um fato estranho sim. Bem aqui perto passamos por um ponto de ônibus. Havia uma pessoa lá, sentada, enigmática, misteriosa e olhando fixamente para o Sr. Haroldo, íamos bem devagar e com o vidro aberto como ele sempre fazia. Notei que algo naquela figura o hipnotizava. Ele a olhou fixamente também. Não era costume dele.

-Como era essa tal pessoa? Estava sozinha? Ainda era horário de ônibus?

Hugo se concentra nas imagens que tem na mente:

- Uma garota, aparentando 16 ou 17 anos, com uma mochila, fones nos ouvidos. Nada de anormal. A não ser que estava sozinha. E acho que ainda passaria ônibus sim, mas uns 30 minutos depois que passamos por lá. Mas ela estava sozinha sim.

-Sr. Haroldo comentou algo sobre ela?

-Não, somente a olhou e voltamos a falar sobre os relatórios, respondeu Hugo, terminando de comer seu lanche.

Robério pediu para que Hugo lhe mostrasse onde ficava o ponto de ônibus onde viram a tal menina, se despediram.

Naquela mesma noite, Robério estava no tal ponto de ônibus indicado por Hugo. 23:08 h.

Sentou-se. Sozinho.

23:20 h. Algumas pessoas chegam ao ponto. Jovens. Estudantes.

Ele puxa conversa com um rapaz:

-Boa noite, todos os dias tomam ônibus aqui?

-Sim, quando não aparece carona sim.

-Sempre as mesmas pessoas?

-Sim, estudamos todos naquele colégio - apontando para um prédio já antigo.

-Semana passada viram alguém diferente? Alguém que não estudava no mesmo colégio?

-Não, não que eu me lembre.

Ao lado deles uma moça entra na conversa:

-Me desculpe entrar na conversa, mas na quarta feira, você faltou e havia sim uma menina aqui no ponto de ônibus que eu nunca a tinha visto.

Robério se interessa, havia achado a pista, a tal garota enigmática de que Hugo havia comentado.

-E como ela era? Pegou o ônibus?

Flávia, a moça que entrou na conversa então meio desconfortável responde com outra pergunta:

-Você é da polícia?

-Sim, investigador Robério, mas pode ficar tranqüila.

Aliviada, mas ainda preocupada Flávia continuou:

- A menina era bem estranha, 16 ou 17 anos, olhar vago, distante, pele bem branca, uma palidez quase mórbida.

Ouvia AC/DC no volume máximo, que apesar dos fones de ouvido davam para se ouvir.

Quando chegamos ao ponto ela já estava aqui. Mas antes do ônibus passar, um carrão parou e ela entrou nele, como se conhecesse o cara e foi embora.

- Sabe me dizer que marca de carro era?

-Sinceramente não sei. Só sei isso.

-Você a reconheceria se a visse novamente?

-Claro, era muito estranha.

-Poderia estar nesse ponto um pouco mais cedo essa semana? Estarei aqui às 22:45 h todo dia.

-Creio que sim.

-Obrigado.

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Terça feira, nada. Quarta feira, nada.

Quinra feira, 22:40 h, Robério chegou antes. Havia uma garota no ponto de ônibus.

Flávia chega 15 minutos depois. Sentiu seu corpo gelar da cabeças aos pés. Olha para Robério confirmando com os olhos que era a garota que ela vira naquela noite de quarta feira.

A gorota estava sentada, fones nos ouvidos, olhar vago, pálida, sem dúvida era ela.

Robério olha para ela, sim era ela.

Ele se senta ao lado dela, imóvel, consegue ouvir a musica que ele ouve, AC/DC.

As mesmas roupas, a mesma blusa, o jeans e a mochila.

Ela abaixa a cabeça, fica olhando para o chão. Robério continua imóvel, mas sente que é ela. Ele abaixa a cabeça e fica imaginando todos os casos arquivados, todas as fotos, todos os crimes. Era ela.

A essa altura os outros jovens já estão no ponto de ônibus também, todos falando ao mesmo tempo. Apenas Flávia presta atenção à cena. Aparentemente apenas ela está vendo a garota sentada, cabeça baixa.

O ônibus se aproxima. Robério faz sinal para que ela entre nele. Dali para frente ele resolve.

Todos entram. A noite fica ainda mais escura. Silencio total. Apenas dois vultos sentados no ponto do ônibus.

Robério e a garota. Imóvel. Olhar fixo no chão.

Robério respira fundo e sabe que a hora é aquela. Ainda de cabeça baixa também ele a chama:

-Marly? Eu sei que é você, eu sempre soube que foi você. Só preciso saber o porque.

A garota levanta a cabeça e olha para Robério. Seus olhos estão tristes, já não estão mais vagos. Olham dentro dos olhos de Robério. Ele percebe uma dor enorme nos olhos da garota e percebe tembém as marcas em seu pescoço.

-Sim, sou eu e sempre soube que você sabia. Todos os crimes. Todas as gargantas estraçalhadas foram obras de minhas mãos. Mas agora achei que era hora de você saber o porque de tudo isso. Vou te contar tudo, mas sei que ninguém vai acreditar em você, mas quanto a isso não posso fazer nada.

Está preparado Robério? Vamos ficar um bom tempo aqui sentados, ou prefere andar pelas ruas?

Se levantando, Robério confirma que sim, que está preparado, mas que prefere andar pelas ruas da cidade.

Vão andando lado a lado e Marly começa sua narrativa.

-Bem, sei que vai soar tudo estranho mas apenas ouça.

Quando fui estuprada e assassinada brutalmente por um homem doente, foi tudo terrível. Perdi tudo. Minha vida, minha dignidade. Tudo ficou branco, minha consciência se apagou. Me encontrei no lugar todo branco. Sozinha. Uma paz.

Uma pessoas me recebeu e pediu que a seguisse e que eu não olhasse para baixo. Caminhei alguns passos e não resisti, olhei e me vi. Morta, estuprada, sofrida, jogada no lixo. Minha revolta começou aí. Parei e não segui mais a tal pessoa. Ela se virou para mim e disse:

-Não há nada a fazer, acabou.

-Como acabou? Retruquei- tem de haver algo que eu possa fazer.

-Sim, tem, mas você não poderá mais ir para onde estou te levando.

-Aceito, foi minha resposta.

Ele me olhou com pesar e outra pessoa entrou em cena. Sombrio, frio, fez sinal e o acompanhei. Chegamos a um lugar cinza e ele se voltou para mim e me disse:

-O que deseja?

-Vingança - respondi- e poder para livrar outras pessoas como eu desse tipo de crime.

-Vingança não leva ao céu, assim mesmo a quer? Me alertou ele.

-Sim, quero. Respondi sem pensar.

Abri os olhos não mais sentindo dores, mas uma força e um ódio. Aí matei meu assassino e fiz minha primeira vítima.

A partir daí muitos outros vieram e muitas garotas livrei.

Robério ouvia atentamente, sabia que era verdade tudo aquilo. Tinha algumas perguntas, mas não sabia como fazê-las.

Marly percebeu e lhe disse:

-Pode perguntar, questionar, esclarecer. Fique à vontade.

-Ok, como sabia quando ia acontecer os crimes? Como sabia que eram psicopatas, que iam atacar?

Marly deu um riso até bonito e ingênuo.

-Simples, aprendi tudo sobre eles. Eles exalam um cheiro típico. Eles são incuráveis. Não se controlam, matam por prazer, estupram por necessidade e nunca vão parar, só quando morrem. E aí eu entro e dou minha contribuição á sociedade e ainda me vingo.

-Acha que foi fácil para meus pais quando souberam? Acha que superaram a dor ?

-Faço por eles, e por todos os pais que sofrem essa dor. Mas meu tempo de vingança acabou, foi o último.

Robério olha perplexo para Marly como se aprovasse seu trabalho e sua vingança.

Ele volta seus pensamentos para todos os casos em que trabalhou. As mesmas características e mesmo modo de agir. No fundo ele admirava Marly, ele sempre soube que fora ela e agora só confirmava tudo.

Mas algo não se encaixava. Sr. Haroldo. Ele não era psicopata, nenhuma passagem pela policia. Ficha limpa, Homem de bem.

Algo não estava batendo.

Quando se voltou para Marly ela já estava abrindo a boca para responder a sua pergunta.

-O Sr. Haroldo era sim psicopata, mas havia se controlado todos os dias de sua vida. Lutava interiormente com sua doença. Por isso nunca teve namoradas, num ia a festas, se isolava, evitando assim que seu lado doentio aparecesse.

Mas isso iria mudar naquela quarta feira. Naquela quarta feira quando ele iria dar uma carona para Flávia.

Mas eu cheguei antes e ele se foi, mas Flávia nem precisa saber disso.

Robério concordou:

-É, não precisa não. Mas e você? Me disse que foi o último, que seu tempo acabou, como assim?

Marly, com um certo brilho nos olhos, olhou para Robério:

-Bem , esse foi meu acordo, teria um tempo de vingança pré determinado. E esse prazo acabou.

Talvez eu me encontre com todos as minhas vítimas no inferno e tenha de conviver com eles.

Talvez me perdoem e me aceitem em outro lugar. Não sei, quando fiz a escolha, sabia que seria assim.

Robério ficou sem palavras e Marly continuou:

- Sei que vão te chamar de louco Robério, se contar essa história toda. Faça sua escolha.

E o beijou no rosto e foi também beijada no rosto por Robério.

Robério olhou nos seus olhos e apenas teve tempo de responder adeus, pois ela foi desaparecendo aos poucos, ao mesmo tempo que os primeiros raios de sol apareciam no horizonte.

Foi para sua casa exausto ao extremo. Caiu na cama e dormiu até 15:00 h.

Acordou, tomou um banho. Seus pensamentos viajavam. Não tinha certeza se tinha vivido aquilo tudo ou se fora um sonho.

Assustou-se com o som do telefone tocando. Era Flávia ligando para saber como havia sido a conversa com a garota do ponto de ônibus.

A ficha caiu, realmente aquela conversa havia acontecido, não foi um sonho.

Após a conversa com Flávia, sentou-se no sofá se recuperando.

Pegou o telefone e fez uma ligação.

Wander atendeu.

- Arquive o caso. Estou indo viajar e não sei quando volto ; disse Robério.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 02/11/2009
Reeditado em 02/11/2009
Código do texto: T1900737
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