A menina da lan house

Como era costume daqueles jovens da periferia, lá estavam ele na lan house que se tornara o point.

Bairro pobre, quase ninguém tinha computador em casa.Mas todos já eram internautas experientes.

Jogos online, orkut, msn e tudo o mais que os ligava com o mundo todo.

Geralmente nas sextas feiras, iam todos pra lá e varavam a noite. O famoso corujão.

Todas as máquinas ocupadas. Cada uma antenada em uma opção.

Silêncio, só o som saindo das caixas de som acomodadas pelas paredes.

O dono da lan house se admirava em ver tanta energia e falta de sono, ás vezes ele os deixava trancados e ia pra casa.

Nessa noite ele também estava sem sono. Ficou por lá acompanhando o corujão.

Tudo ia tranquilo, a noite estava quente. Havia lua e estrelas no céu.

Três da madrugada. Tudo se apaga. Um breu. Ele pede calma e para que fiquem sentados que vai resolver.

Possivelmente um fusível queimado. Ou algo simples.

Lá fora as luzes continuam acesas. Normal.

Ele nem teve tempo de sair e o medo tomou conta de todos que estavam na lan.

Todos os monitores voltaram a funcionar, somente os monitores. Uma luz fraca e branca vinha deles.

Imóveis. Ninguém conseguia se levantar ou tirar os olhos deles.

De repente uma imagem aparece simultaneamente em todos eles.

O medo aumenta. Como que congelados e sem ação continuam olhando fixamente.

Assusto e sem saber o que se passava. Uma escuridão e os monitores exibindo imagem.

Insólito. Impossível. Estavam todos dentro de um pesadelo coletivo. Era o que pensavam.

O dono da lan toma coragem e dirige seu olhar para a imagem no monitor sobre o balcão de atendimento.

O que viu era assustador. Medo. Arrepio. Todos com a mesma expressão de pavor.

Na tela uma imagem havia se materializado.

Uma jovem, apentando 16 ou 17 anos, de pele bem branca, pálida, com sinais de agressão. Hematomas, escoriações, sangue secando no canto da boca. Um olho quase nem dava para ver, mas o outro era de um verde extremamente bonito. E seus cabelos loiros que outrora foram lindos agora se apresentavam sujos e desgrenhados, com sangue seco e folhas grudadas.

Ela ficou ali como se olhasse para cada jovem. Os olhos fixos. O silêncio era total.

Talvez se passaram minutos mas que pareceram horas.

Os corações disparados podiam ser ouvidos e a respiração presa.

Ela tenta forçar para abrir seu olho inchado e abre a boca com dificuldade.

- Não se assustem e nem tenha medo. Sei que minha aparência é terrível, mas ainda é a parte menos ruim que posso mostrar. Me chamo Clara. Na idade de vocês tinha as mesmas manias e diversões que vocês.

Gostava de tudo isso também. Mas isso me custou a vida.

Numa noite de sexta feira como essa, também fui para um corujão. Tinha um amigo virtual. Havia alguns meses que nos falávamos. Não o conhecia, só o que ele me falava.

Me encantei. Nessa noite, na lan, ele entrou no msn. Fiquei toda empolgada. Feliz.

Ele me disse que estava perto da lan. Não acreditei, pois ele sempre dizia morar em outro estado.

Minha curiosidade de adolescente foi a mil.

Uma hora depois eu estava saindo da lan, minhas amigas não entenderam e como eu morava bem perto, me deixaram sair na boa.

Lá fora, a dois quarteirões dali, meu amigo me esperava. Quando o vi tentei voltar mas era tarde.

Ele era forte e me jogou dentro do carro. tentei gritar quando senti sua mão em minha garganta.

Percebi que era um psicopata. Ele me torturou, me cortou, me queimou. Fui espancada até quando senti que meu corpo estava se entregando e meu espírito indo para outro lugar.

Não estou aqui para assustar. Só tenho uma missão de avisar. Não voltarei mais. Não nessa lan.

Vocês jamais conseguiram imaginar um ínfima proporção da dor, do medo, do desespero que senti,

E o psicopata continua lá fora, pode ser um amigo virtual de algum de vocês.

Eu não posso fazer nada contra ele. Mas vocês podem.

Eu tinha muitos planos, gostaria de estar em casa agora, dormindo, e sabendo que meus pais dormem no quarto ao lado e podem me proteger. Mas nunca mais terei isso.

Uma lágrima correu de seu olho verde. E ela abaixou a cabeça.

- Me desculpem pai e mãe por não tê-los ouvido.

Eu os amo.

A imagem foi desaparecendo até se tornar somente um ponto luminoso bem no centro de cada monitor e sumiu.

As luzes se acenderam devagar.

Ninguém abriu a boca, somente se entreolharam. Eram quatro da madrugada, O corujão chegava ao fim.

Foram saindos, todos calados. Pensativos.

Cada um foi pra sua casa com a certeza de que seus pais estavam dormindo ainda, mas sempre prontos a protege-los, fosse de um psicopata ou de qualquer outra coisa.

Nunca mais fizeram corujão, pelo menos naquela lan house.

PS. Caro leitor, sua opinião é muito importante para, se puder deixar um pequeno comentário eu agradeço. Não vai demorar num 2 minutos.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 15/12/2009
Reeditado em 26/12/2009
Código do texto: T1980176
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