Rara Beleza

Seus olhos se abriram lentamente, as pálpebras ainda pesavam é claro. Logo os belos e sedutores olhos azuis estava totalmente abertos. Esbanjavam beleza, mas não agora. Agora se rotulavam muito mais pela árdua confusão em sua mente.

Abaixo deles ligeiras marcas rubras. Havia chorado em demasiado antes de chegar ao local desejado. Cabelo desemaranhado, vestes rasgadas e sem toda aquela tinta profana espalhada pela face, era ainda uma sedutora em completo ápice. Beleza única, rara... Perfeita em êxtase, bela demais para ser contemplada por nós reles mortais. Era minha a incumbência de pregar o destino naquele Ser.

De mãos e pés literalmente atados ela não demonstrava em nenhum momento a ânsia que sentia para se libertar. Estava rodeada por chamas, que ardiam continuamente em óleo da sacristia. As chamas flamejavam até ela, se insinuando, se mostrando. Sua face branca dava um parecer puro, que banhado pelo fogo era digno de poema. Melhor ainda, de romance.

Se não tivesse completamente tomado de minha decisão, com plena certeza sucumbiria aos seus olhos. Morreria e vagaria eternamente sob os traços azuis desenhados ali.

Não! Não posso me distrair. Concentre-se! Foi exatamente o que se passou por minha mente enquanto eu quase caía em tentação.

Sabe? Amargurou-me imensamente fazer aquilo. Ter que fazer tudo que fiz com uma criatura tão bela, tão delicada. A pior parte foi arrancar-lhe todo o longo cabelo ruivo com minhas próprias mãos. Ela soltava um grito estridente de dor, enquanto tufos de seu cabelo saíam vagarosamente.

Cortar-lhe a garganta não foi difícil. Apenas um movimento, e a pele frágil se quebrou bem à minha frente. O sangue escorria de forma delicada e majestosa. Não era rubro, era diferente. Não tinha cor. Eu sei que é estranho, mas é a verdade.

A partir deste momento não se fez ouvir mais sua respiração ofegante. Seu coração provavelmente parara agora, não posso afirmar com certeza já que nunca o ouvi. Sua pele não se esfriou, - pelo contrário já era fria – e agora ardia em fulgor, como se pudesse entrar em combustão a qualquer momento.

Um último corte e estava feito. Ainda assim era a mais bela que pudesse ter habitado em toda esta terra. Mesmo com o enorme buraco escavado em seu peito. Era agora literalmente sem coração, mas não perdia por isso em nenhum segundo sua beleza.

Não poderia ir e simplesmente abandoná-la. Enfiando uma das mãos em seu globo ocular retirei uma daquelas esferas brilhantes. Era presa por alguma coisa, mas não resistiu quando usei de um pouco de força. Fiz novamente do outro lado.

Seria a minha lembrança. Seria minha maneira preferida de vagar em vida, já que meu coração fora arrancado junto ao seu. Perderia-me em seus olhos.

Eles não eram a janela de sua alma, passavam algo que não era real - senão quando a víssemos sorrir todos choraríamos com ela – porém eram a mais bela das coisas que alguém poderia desejar. Entravam em contraste com toda a forma brutal com que foram arrancados a sangue frio. Ao contrário disto, guardavam em seus traços o sorriso melancólico que um dia fora o mais belo de todos.

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- Padre, você precisa contar em testemunho o que o assassino disse em sua confissão. É imprescindível para o caso. – esganiçava o detetive ao me indagar.

- Ele acreditava que a esposa era um anjo... – E foi o que me limitei a responder...