A Figueira e a Jaqueta
    João estava com pressa, o dia estava chuvoso, o frio era intenso e ele tinha um compromisso inadiável na empresa em que trabalhava, no centro da cidade de Pelotas. Estava voltando de uma visita comercial que havia feito naquela tarde a um cliente, morador no interior da zona colonial da vizinha cidade de Canguçu. A chuva que caia intensamente deixava o vidro do carro embaçado, e o limpador quase não conseguia dar conta do serviço. João procurava prestar total atenção na estrada sinuosa, de chão batido e, por estar em velocidade condizente com o momento, apenas por este detalhe não atropelou o vulto daquela moça que procurava atravessar a estrada e proteger-se da chuva embaixo da figueira, situada após a curva, e que é conhecida por “curva da figueira”. João não tinha costume de dar carona para estranhos, mas aquela era uma condição especial e a voz chamada consciência falou mais forte. Parou o carro, engatou uma ré e com cuidado voltou ao encontro da silhueta feminina que por pouco não atropelara. Era uma mulher realmente, e que bela mulher .O sorriso meigo contrastava com o cabelo e a roupa humilde totalmente molhada faziam um belo conjunto. João convidou-a para entrar, não recebeu nenhuma resposta, apenas viu quando ela abriu a porta e sentou-se no banco traseiro. Engatou a primeira marcha seguindo sua viagem, pois não poderia atrasar-se mais do que já estava. Curioso e vendo-a tremer de frio, alcançou-lhe a jaqueta que ela graciosamente colocou sobre os ombros. Tentando estabelecer um diálogo, perguntou seu nome e como resposta ouviu aquela voz suave, um pouco rouca dizer:                                                                                                          
    - Eu me chamo Mariana e você como se chama?
     João não pode conter o nó na garganta e, com alguma dificuldade, conseguiu falar:
    - Meu nome é João Silva, sou comerciante e estou voltando para uma reunião de negócios em Pelotas, minha cidade.
     E assim percorreram todo trecho da estrada, conversando e trocando palavras amáveis que demonstravam afinidades em todos os gostos de João, de maneira tal que pareciam conhecer-se há muitos anos e muitos anos. Quando chegaram na faixa principal, Mariana aumentou um pouco o tom de voz, chamando a atenção para a casa que ficava do lado esquerdo da rodovia, pedindo para ele que a deixasse ali, pois morava lá com sua mãe e irmãs. João, com o coração acelerado,quis levá-la, ouvindo um não com resposta, mas foi um não carinhoso, sem repulsa. Como Mariana estava com a jaqueta de couro que ele tinha gentilmente emprestado, ia começando a tirá-la, sendo impedida por ele, que lhe disse que voltaria para pegá-la depois. João insistiu tanto, que ela aceitou. Mariana dando-lhe um beijo de agradecimento no rosto, seguiu em direção a casa. João viu-a sumir na baixada,reaparecer mais adiante e passar na porteira, ficou imaginando como seria maravilhoso ser amado por uma mulher como aquela. Ligando o carro, seguiu o reto da viagem.
        O dia seguinte estava lindo, o sol brilhante, João sai bem cedinho em direção a zona colonial, cheio de esperança, pois queria reencontrar Mariana, dizer-lhe que sonhara a noite inteira com ela e que estava apaixonado. Só poderia ser amor à primeira vista e não havia outra explicação plausível para tal sensação. Parou o carro em frente à porteira da casa, tocou o sino e foi recebido por uma senhora loira, aparentando uma idade avançada, o rosto marcado pelos anos, que, com um sorriso, lhe disse:    
       - Pois não!... O Senhor está procurando por alguém? Em que posso ajudá-lo?
       João apresentou-se, perguntou por Mariana e, caso não estivesse em casa, se não havia deixado a sua jaqueta, relatando com detalhes para aquela senhora tudo que havia ocorrido no dia anterior. Olga,(este era seu nome) muito pálida, com a voz tremula e lágrimas nos olhos, respondeu:
      - Não é possível, meu filho, que isso tenha acontecido, pois a minha Mariana faleceu no ano passado. Foi atropelada na curva da figueira por um bêbado no volante. Como poderia ter falado com ela, como?...
        João não conseguia dizer uma única palavra, seus pensamentos não batiam, não queria acreditar no que estava ouvindo, não podia ser verdade, tinha certeza de que não sonhara. Assim resolveu perguntar a Dona Olga se ela tinha fotos de Mariana e onde estavam enterrados seu restos mortais. A senhora não só lhe mostrou as fotos como o acompanhou até o cemitério da colina e, ao chegarem ao túmulo, João viu, incrédulo, sua jaqueta sobre a lápide fria, repouso eterno de uma linda mulher chamada “Mariana”.
 
Este conto faz parte de meu II livro “Marcas na Alma”, já em segunda edição. Cujo valor: R$ 25,00 reverte para a construção da “Associação Comunitária Oficina Michel Oliveira,” meu filho, tragicamente falecido aos 21 anos, no dia 02/01/04 . A obra terá como finalidade básica o auxilio a pais que por  razões diversas ficam sem seus bens maiores : Os Filhos .
Um livro de poemas, contos e relatos espirituais; incríveis, mas em sua maioria.... reais!
                      
Gildo G Oliveira
Enviado por Gildo G Oliveira em 15/05/2010
Código do texto: T2258027
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