Salmos, fobias e um punhado de Zumbis.

Alice vagava semi-consciente entre o real e o irreal. Seus olhos viam, mas não enxergavam. Sua mente perturbada transcendia pelos bosques psicodélicos além gabinete. Era o bêbado e o equilibrista tentando atravessar a linha tênue da realidade, ou voltar, dependendo da sorte, para o concreto frio.

Nunca em todas as suas experiências transgressoras, que não eram poucas, havia experimentado algo tão extra-sensorial. As luzes tinham som. E os sons tinham luz. Estava em um limbo onde a dor era prazerosa e a angustia inebriante. Sentia-se como uma personagem em um comercial da MTV dirigido por Tim Burton. Alice era um ponto em uma reta em busca do nirvana.

Nos recreios do colégio, sempre escutara histórias de pessoas que experimentaram a loucura e nunca mais voltaram. Conhecia a lenda do garoto que bebera um chá feito de fitas cassetes e, automaticamente, assumira um estágio próximo ao autismo. Ouvira relatos sobre benzina, cogumelos, santo daime, absintos medievais e tantos outros. Porém, nada se parecia com o que estava vivenciando. Era como se tivesse ingerido a mesma pílula vermelha que Neo ousara aceitar.

Tudo acontecia numa velocidade que não podia ser medida. O fundo musical bem que poderia ser o tema de Twilight Zone, entretanto, seu cérebro confuso escolhera uma versão nunca gravada de Poker face na voz de Joe Cocker. Contrariando o senso comum, ela não viu duendes, unicórnios ou fadas.

Alice viu um céu completamente estrelado. O cenário lembrava a projeção feita em um planetário. Ao seu lado, um senhor barbudo vestindo uma alinhada manta branca falava sozinho, em um grego impecável. Estranhamente, Alice entendia tudo.

O homem penteou com os dedos a enorme barba branca, olhou para o céu de Alice e perguntou?

- Será que uma estrela vira para outra e diz: eu quero ser um homem?

- O que?

- Isso mesmo. Será que dizem “meu sonho é ser um homem”

- Por quê?

- Nós não dizemos que queremos ser uma estrela. Que ser uma estrela é ser o máximo que podemos alcançar – o velho de vestido branco disse, apontando para o céu - Elas devem querer ser um homem.

- Nós dizemos isso porque estrelas são lindas, majestosas, únicas – Alice falou, com brilho inoxidável nos olhos.

- Na realidade, não. As estimativas contam que devam existir dez sextilhões de estrelas no universo.

- Dez o que?

- Para cada sextilhão acrescente uma fileira de 21 zeros ao algarismo um.

- E daí.

- Daí, que até onde sabemos, nós somos, aproximadamente, apenas 7 bilhões de homens no universo. Ou seja, muitos zeros a menos.

- Não estou te entendendo.

- Quero dizer que nós humanos, somos infinitamente mais raros que estrelas. E ainda assim queremos ser estrelas.

Alice ficou muda, olhando para o céu e contemplando a imensidão de sua própria existência. O filósofo estava certo, mas errara feio no número de humanos. A humanidade nos últimos dias não era apenas rara, ela beirava perigosamente a extinção.

RSollberg
Enviado por RSollberg em 29/04/2011
Código do texto: T2938944
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