A Viatura Fantasma

Na sala com cores foscas se encontravam sete pessoas sentadas em círculos, naquele grupo de ajuda para pessoas que sofreram algum tipo de violência psicológica estava Marcelo.

Freqüentava o grupo há quase duas semanas, mas ainda não se sentia pronto para contar a sua história. Sabia que ninguém acreditaria nele, mas não era isso que o incomodava, em seus vinte seis anos de vida aprendeu a não ligar tanto para a opinião dos outros, sabia que o que viveu foi real e era o que importava.

Estava com o pensamento longe quando uma garota com os cabelos pintados de azul, aparentando ser mais nova que ele, terminava a sua historia.

Seus pensamentos foram interrompidos pela orientadora do grupo que o chamou pelo seu nome: - Marcelo, já se sente pronto para nos contar a sua experiência?

Marcelo cruzou as pernas respirou fundo e olhou para o antigo ventilador de teto que balançava lentamente fazendo um ruído hipnotizador capaz de dar sono em qualquer pessoa.

Acho que sim! Respondeu.

Antes de começar preciso dizer que minha história é muito diferente da maioria que aqui está.

Não fui espancado por meus pais, não sofri abuso sexual ou bulying na minha época de escola.

Fez silêncio e prestou atenção nos olhares das pessoas na sala, todos pareciam estar entediados.

-conte sua história. Pediu gentilmente a orientadora.

Há alguns meses atrás eu comprei meu primeiro carro; um corsa semi usado, e para comemorar chamei quatro amigos meus para irmos a uma festa que aconteceria próximo a Rodoviária Novo Rio.

Próximo ao cemitério do caju Alexandre que estava sentado no banco do carona ao meu lado, começou a contar uma lenda urbana que ouviu na época que morava ali perto.

Segundo ele um cabo da policia militar que estava de serviço recebeu uma ligação da esposa que estava grávida de sete meses, ela disse ao marido que estava sentindo dores e contrações na barriga, como ele estava próximo de casa, uma vez que eles moravam no bairro santo cristo, resolveu ir buscá-la com a viatura par a levar ao hospital.

-Um policial na viatura sozinho? Perguntou Paulo.

-Balela essa historia, todos sabem que PM dificilmente anda sozinho em uma viatura.

.Exclamou Rico.

O motivo de ele estar sozinho eu não sei, querem me deixar terminar a historia? Disse virando-se para trás Alexandre.

No caminho, bem abaixo do viaduto do gasômetro a viatura foi fechada por um Ford ranger forçando o policial a parar o carro.

De dentro do Ford saíram quatro traficantes armados portando fuzis, gritando ofensas e atirando contra a viatura, o policial saiu do carro cambaleando e Ferido, implorando para que a vida da esposa fosse poupada, os traficantes riram e um deles atirou na perna do policial, enquanto os amigos correram ate a viatura puxando a esposa dele para fora e dando um tiro de fuzil na barriga dela a matando.O policial foi morto com um tiro de fuzil na cabeça em seguida. Contou Alexandre.

È isso a historia? Perguntei a Alexandre que continuou seu relato.

Algum tempo depois, uma viatura fantasma marcada por tiros foi vista fazendo a ronda perseguindo motoristas até que eles horrorizados sofriam algum tipo de acidente.

-Bem, disse eu, vamos ver se esse seu policial é verdadeiro!

Afundei o pé no acelerador próximo ao local onde supostamente teria acontecido o crime, lembro que atingir a velocidade máxima do carro, todos se seguravam e riam fazíamos piadas com a historia contada por Alexandre, que também estava se divertindo com aquilo.

Até que na ultima curva antes de chegar a Rodoviária Novo Rio, uma viatura policial surgiu do nada bem atrás da gente, as luzes estavam completamente apagadas,e todos podemos ver quer o vidro da frente estava trincado possivelmente por disparos de armas de fogo.

A viatura cortou para o lado direito e vimos que a porta do motorista também estava toda marcada por tiros, com o coração na boca acelerei, e a viatura acelerou atrás.

Não conseguia ver quem estava atrás do volante, daquela distância podia jurar que o carro andava sozinho,meus amigos também estavam desesperados,todos falavam ao mesmo tempo não sei relatar aqui o que foi falado,foram tantas coisas ditas que não consigo me lembrar de nenhuma.Por mais que eu acelerasse, a viatura continuava na nossa cola,o carro do policial parecia não obedecer as leis da física ziguezagueava da esquerda para a direita e mesmo assim continuava colado na gente.

-Olha para frente! Gritou Alexandre ao perceber que eu tinha esquecido completamente da estrada para olhar a viatura.

Quando voltei a minha atenção para a estrada era tarde demais, estava próximo demais da mureta e só me lembro de fechar os olhos quando percebi que o choque era iminente.

Não sei quanto tempo fiquei desacordado, mas creio que foi por alguns segundos,quando recobrei minha consciência o carro estava de cabeça para baixo,eu tinha um ferimento horrível na cabeça podia saber isso pelo latejar na minha testa e pela quantidade de sangue que pingava no meu rosto, chamei pelos meus amigos mas ninguém me respondeu,no banco do carona onde antes estava sentado Alexandre agora jazia Paulo com o pescoço quebrado, Alexandre, havia sido arremessado para bem longe do carro,meus outros amigos estavam amontoados desacordados ou mortos no banco de trás.

A viatura policial parou bem próximo do meu carro capotado e duas pessoas saíram de dentro dela, um espectro vestido de policial que aparecia e sumia que me fazia lembrar esses “pisca piscas” de arvore de natal e a outra pessoa era ainda mais horrendo; uma mulher que assim como policial também sumia e aparecia,mas em seus braços ela carregava um bebê mal formado e um gigantesco cordão umbilical que ligava o natimorto as partes intimas da mãe.

O policial fantasma se aproximou de mim, puxou sua arma e apontou para o meu rosto.

Olhei bem para ele e percebi que onde deveria estar seus olhos só existia um enorme buraco, foi ali com certeza que ele levou o tiro de fuzil que o vitimou, ele mexia a boca, mas não saia som nenhum, sem entender o que o fantasma dizia eu não manifestei reação nenhuma, isso pareceu o irritar, logo em seguida ele apertou o gatilho de sua arma de onde não saiu nenhum projétil.

De qualquer forma aquilo pareceu agradá-lo, ele voltou com sua esposa para a viatura e foi embora.

Algum tempo depois o socorro chegou para me socorrer. Todos meus amigos morreram naquele acidente, até hoje respondo um processo na justiça, por mais que eu alegue que estava sendo perseguido,as câmeras próximas no local mostraram que eu corria sozinho,não tenho medo de ser preso todos conhecem a justiça do nosso pais, mas o que aconteceu naquela noite jamais vou esquecer.

Quando penso naquela noite, o que me vem à cabeça não são meus finados amigos nem muito menos a aparição do policial, mas sim no que ele tentou dizer, sempre acordo me perguntando: qual seria a mensagem que ele queria passar?