VAMPIROS 11 – UM CIRCO DE HORRORES

A neblina não escolhia uma hora certa para descer sobre o lugarejo. Andrei acendeu mais um cigarro sem filtro, enquanto o veneno entrava pelos seu sangue causando-lhe tontura. É lógico que ele sabia que aquilo estava lhe fazendo matando, mas gostava do gosto. Ele estava com sessenta anos, sendo trinta e cinco na policia. Ele fora guarda na rua, prestou serviço administrativo quando nasceu a sua primeira filha, depois voltou pra rua, ai nasceu a outra e acabou ajudando em um caso e dois e virou detetive. Ele não era nem expert, mas era insistente e já resolvera alguns poucos casos. Andrei era sempre criticado, quando chegava cheirando a bebida, na cena do crime. Ele andava com um casacão escuro e sapatos surrados – desconfiava-se que ele só tinha aquele par. FarmWels era a típica cidade do campo da Europa dos anos cinqüenta. Sem muitas novidades, sem atrativos. Tinha um cinema, uma Igreja principal, um mercado, várias fazendas agrícolas e de animais de corte, ao redor. As ruas eram de terra batida. Os homens passavam seu tempo, ou trabalhando, bebendo e jogando no Bar do Joel, ou com suas esposas. Havia um ou outro que pulava a cerca. Assim como havia uma ou outra que também pulava a cerca. Andrei enconstara o seu carro velho, pesado, que fora sucesso comercial a uns trinta anos atrás, agora... era só um carro velho. Ele sorveu a fumaça venenosa para dentro dos seus pulmões, com força, fazendo a ponta do cigarro brilhar, na tarde que já estava escurecendo.

Havia um burburinho de gente, perto da estrada, adentrando um pouco no mato. Passando um morrinho, logo após, uma criança encontrara a irmã, adolescente, morta, com uma facada no peito. Uma só, certeira. Não havia rastros do criminoso. Não havia nada, de novo. Havia apenas uma coisa, uma premonição, uma intuição, que Andrei já estava perseguindo a algum tempo. O Criminoso da Faca, como estava sendo procurado, já sabiam que era um homem, era alto, devido à posição da facada, e no geral escolhia gente rica para matar. O Criminoso matava qualquer pessoa, empregadinhas, mordomos, motoristas, mulheres ricas e vazias, seus filhos e os maridos, pais de família, também, na maioria gente fútil e vazia. Ele atacava as casas dos ricos, as grandes fazendas, gente de posse. Parece que ele matava, apenas por matar. Não havia um motivo. Mas Andrei sabia que deveria haver, pois ninguém faz nada sem motivo, pode ser que nem o criminoso soubesse o motivo, que deveria estar entranhado no fundo da sua mente, mas havia sim, deveria haver, um, o mais motivos. Porque senão, qual o motivo de ele atacar gente rica? Os outros que morreram e não eram ricos, eram impecilho apenas para o plano maligno. Era gente que se interpôs entre o assassino. Ele, até ali, perseguira a mais de dez anos, um único padrão. Sabia-se que ele estava na ativa, pois apareciam entre dois a seis casos dele por ano. Apelidaram aquele caso de o Caso da Fazenda. Fugia totalmente do padrão seguido até agora. Uma mocinha sozinha, de quinze anos, pobre, mal-vestida – Andrei ao olhar a menina, lembrou-se imediatamente das suas filhas com suas roupinhas velhas. A vida de Andrei era de uma miséria absoluta. Apesar de ganhar o seu salário, igual aos outros companheiros de policia, o dele não rendia nada e ele nunca entendeu bem porquê. A casa da menina era próxima, mas não tanto para alguém escutar algum grito, ou movimentação. Como fora atacada próximo à avenida, imaginava-se que um carro passou com o assassino. Mas porque ele parou, o que a moça tinha de diferente? Aparentemente nada. Ela percorria o mesmo caminho de sempre. Não havia nada de diferente em sua aparência, segundo os pais e vizinhos. A menina não tinha nada, parece, que fizesse o assassino parar para matá-la e depois seguir viagem. Mas no meio do burburinho de gente que ia e vinha, tentando colher algo na cena do crime, Andrei ficou de pé em frente à ela, olhando o seu rosto. A menina era linda. Seu rosto era igual ao de uma modelo. Era, como o jargão: uma flor nascida na lama. Andrei já vira aquele rosto em algum lugar. Ou um rosto parecido com o dela. Mas onde? Quem?

...

Cristoferson chegara àquela cidade a três meses. Arrumara um emprego de balconista numa loja daquelas que vendiam tudo, desde comida – arroz por quilo, óleo por litro, ou meio -, até material de construção. Ele tentava agora ficar quieto. Um rastro de sangue e morte o seguia. Ele procurava alguém, talvez, para dar-lhe um rumo em seu destino. A moça fantasma dissera-lhe, numa aparição da noite, para procurar alguém no circo, que seria mais uma peça, até ele chegar aonde era o seu destino. Ele só sabia que deveria estar ali, mas não sabia exatamente pra que. Andara pela cidade sondando o que pudesse haver de diferente, mas aparentemente nada havia. Então ele esperaria, até surgir, pois a fantasma, até aqui não errara em nada. Para não causar suspeitas ele começou a namorar uma mocinha boba, mas muito bonitinha, que trabalhava com ele. Isso evitaria algumas perguntas. Moço pobre, viera de longe, acabou na cidade à procura de emprego – essa fora a história que contava a quem perguntava.

Mas um dia viu um anjo. Com certeza era o anjo da cidade. Cristoferson já vira alguns anjos antes e achou estranho ver esse agora. Próximo à cidade haviam algumas montanhas, num dia ele fora até uma delas e lá de cima ficara observando a cidade monótona, ao longe, lá em baino, num vale. Ai ele viu um anjo, com a orla de sua veste branca agitando-se como os tentáculos de um polvo. A agitação da aba da roupa do anjo, ele descobrira que era a influencia que o anjo exercia, o seu poder, sobre o local. Esse era o anjo da cidade, velando por ela. A sociedade angelical era bem organizada. Algum anjo tomava conta de um grupo de ruas e seus moradores. Outros anjos tomavam conta de um bairro. O anjo que tomava conta de uma cidade era um príncipe angelical. Poucos anjos, ou potestades, tomavam conta de nações. Toda nação tinha o seu anjo. Ele já sabia de tudo isso, só não sabia porque estava enxergando aquele anjo.

...

Dois dias depois da morte da menina na estrada um circo chegou nos arredores. Ficando afastado meia hora de carro, as estacas foram postas. A cidade alvoroçou-se com a noticia. As olhinhos das crianças brilhavam. Havia noticias de um elefante, tigres, cachorros amestrados, palhaços, malabaristas, uma profetiza, um homem gordo muito forte, duas gêmeas sensuais e cavalos enfeitados. Havia a noticia de pipoca, bolos doces e salgados variados, comida típica da Alemanha, balões que voavam sozinhos. Por duas vezes eles desfilaram pela rua principal, com anunciando o espetáculo. Isabel a namorada de Cristoferson o convenceu a levá-la na estréia no sábado.

Do quarto andar, enquanto olhava para a rua, da sua janela, Andrei decidira também ir ao circo, mas a serviço. Naquela manhã chegou a foto de um antigo caso não resolvido em uma cidade grande, que alcançara certa repercussão. Agora havia alguém, ou melhor, uma profissão, a de palhaço, que precisava ser investigada pelo detetive. Estranho - ou não - era a chegada justo de um circo, pensava Andrei, enquanto pegava uma garrafa na gaveta.

...

Os namorados chegaram lá pelas sete horas, uma hora antes do inicio do espetáculo. Isabel estava bastante sorridente, enquanto comia milho. Toda a cidade estava ali. As crianças nunca estiveram tão felizes na suas vidas. Isabel não queria, mas Christoferson quis passar na profetiza. Era uma tenda velha e suja, cheirando a mofo. Havia uma mesa pequena no centro e uma mulher muito bonita sentada em frente a um elefante vermelho. Suas roupas eram de cigana. Mas o seu sotaque não era cigano, sabia o vampiro.

- Sentem-se – disse afável a profetiza. – Vejo que o casalzinho quer saber do futuro, não é?

Isabel sorriu, ela tinha planos para o seu namorado bonito e forte.

- Eu quero saber sobre um homem. – falou Cristoferson, causando surpresa em todos. Isabel olhou para ele, meio atravessado.

A profetisa começou a mexer os braços no ar como ele já vira antes. Ela não era uma profetisa, ela era uma bruxa. Sem notar ele recuou lentamente o seu pé, para a segurança debaixo de sua cadeira.

- Seu caminho é de morte e sangue. O ódio em seu coração ainda não passou, mas vai. Você procura um homem velho e assassino cruel. Há quem o chame de sábio. Ele vai te levar até um castelo. Lá está o seu destino: uma espada cravada no seu peito, até a morte. Mas antes disso a mulher e o lobo vão te encontrar. E quanto a sua namorada, esse é o seu ultimo espetáculo.

Isabel saiu xingando a mulher, assustada com aqueles vaticínios de mau agouro.

...

O espetáculo transcorreu normal: alegre e colorido. Uma coisa só veio quebrar a monotonia, um palhaço ficara mais interessado em sua namoradinha do que o normal. Ele a olhava insistentemente, notava Christoferson, não que ele gostasse dela, que era mais um disfarce. Naquela noite mesmo iria embora, já se decidira, mas esse circo, em especial tinha algumas irregularidades sombrias. Ao passar pelo homem gordo e forte do circo, o vampiro sentiu o cheiro de morte. Pensando sobre que cheiro era aquele, lembrou que era o cheiro de canibal. As moças gêmeas, iam até o palco e dançavam uma dança um pouco mais sensual do que o permitido para as crianças, levantando reprimendas das esposas para com seus maridos que não sabiam disso também. Mas elas tinham, cada uma, colares com símbolos satanistas. Ele ainda achava que uma mulher velha e gorda, que servia como cozinheira do circo, era a mãe da bruxa profetisa e que ela era uma bruxa mais perigosa do que a primeira. O apresentador, dono do circo e diretor principal era um velho imponente, descendente de nobres. Ele não sabia o que, mas havia algo muito intrigante em sua pessoa. Um dos cavalos era um fantasma. Ele vira os olhos vermelhos e o rosto transfigurado, entre uma volta e outra. A melhor coisa a fazer, até para ele, era sair correndo dali, quando acabasse o espetáculo. De qualquer forma ele iria embora assim que levasse a moça até a sua casa.

Até que o show era interessante, pensou Andrei. Ele precisava de uma distração a bastante tempo. De qualquer maneira, se não descobrisse nada, ele pelo menos teria visto um show de circo grátis, pois apresentou a sua carteira de detetive na bilheteria. Bom, quando acabasse ele iria interrogar os palhaços. Ia ser fácil, só haviam cinco. Ele pensava tudo isso, quando levando a garrafa mais uma vez à boca, notou uma mulher e seu filho olhando firmes para ele. Ele ficou constrangido e guardou a garrafa no bolso. De qualquer maneira ele já não estava agüentando beber mais nada àquela hora.

O Palhaço estava se sentindo muito cansado. Ele entrou no picadeiro arrastando os pés. Era mais um espetáculo, em mais uma cidade vazia. A sua participação transcorrera automática, até que ele ouviu um riso feminino que o lembrou de alguém. A moça da estrada tinha o mesmo riso cativante e bonito. Ele não queria ter feito mal a ela, mas ela teve medo dele e acabou acontecendo. Ele ficou procurando no meio dos rostos, quem era a nova moça do riso, até que a encontrou. AS vozes começaram a conversar dentro de si.

- Oh, velho, olha, mais uma mocinha pra nós.

- Mas quem é essa nova mocinha? – disse o garoto.

- Eu não sei, mas o Palhaço vai conversar com ela mais tarde. Ele precisa de uma nova namoradinha, pois matou a ultima na estrada.

- Eu não queria ter matado a moça, foram vocês que me obrigaram.

- Palhaço, você adora ver sangue, você adora matar.

- Não é verdade, eu não gosto de sangue, não suporto. Mas adoro matar. – disse rindo da própria piada.

- Como nós vamos fazer? – falou o garoto se referindo como iriam conseguir se livrar do loiro forte ao lado dela.

- Ah, vai ser fácil. Assim que saírem vamos enrolar um pouco os dois até todos irem embora e ai os matamos.

- Mas eu não quero matar a moça velho. Eu quero namorar com ela. – falou indignado o Palhaço, em sua mente.

- Mas ela vai gostar de você. Olhe como ela te olha. Ela já foi com a sua cara. – disse o velho malicioso.

- Você acha que ela gosta de mim?

- É claro que sim Palhaço. – falou o garoto. Ela te adora. Ela está louca pra te beijar. É só acabar o espetáculo e vamos conversar com ela.

- Vocês não atrapalhem, por favor. Ficam conversando na minha cabeça e eu não consigo pensar direito.

- Velho, ele disse que nós estamos atrapalhando?!

- Quando é que nós atrapalhamos Palhaço? Lembre quantas vezes te ajudamos a matar as pessoas que te perseguiam. E olhe que foram muitas.

- é verdade. – disse por fim o Palhaço. Enquanto olhava insistente para a moça, sua futura namorada.

pslarios
Enviado por pslarios em 20/02/2012
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