O MISTÉRIO DO VELHO CASTELO - PARTE 11

-Mas que droga aconteceu lá em cima?

Fischer havia virado a curva da rua em que morava em alta velocidade olhando para trás. Tinha se esquecido de trancar a porta da sala e sua garagem também estava aberta, mas por Deus, não voltaria para lá antes de amanhecer.

Pouco antes de virar a esquina, deu uma última olhada e reparou que o vulto da mulher que antes estava sentada em sua cama, o observava pela janela. Apertou o volante com as mãos, e tentou se concentrar na pista, enquanto gotas de suor pingavam do seu rosto.

Após uns 15 minutos pisando fundo, se deu conta de que havia esquecido sua carteira ao lado de sua cama. Olhou para o marcador de combustível. Estava quase na reserva.

-Vou arriscar – pensou ele – pra casa é que não volto.

Apesar de sua convicção, Fischer sabia que não conseguiria chegar ao hospital.

-Que se dane. Paro aonde der e vou a pé.

Mesmo que parasse no meio do mato, não se importava. Sabia que nada poderia ser pior do que havia acontecido em sua casa. No entanto, ele estava irremediavelmente enganado.

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-Que favor precisa que eu faça Sr. Ricardo?

-Quero que me ajude a embalar umas caixas no porão e depois as deixe na sala. Hoje a noite um mensageiro virá busca-las. Ele deve lhe dar 10.000 cruzados pelos pacotes. Receba e deixe na minha biblioteca, na terceira gaveta da esquerda, que fica em minha mesa.

-Sim Senhor, pode deixar – dito isso, girou nos calcanhares em direção as escadas.

-Ah, e Armand, por favor, não toque em nada lá embaixo.

-Certamente Senhor. A propósito, quantas caixas são?

-São 15 caixas. A fita para embalar está sobre o balcão. O interruptor fica no canto direito. Você terá que encostar a porta quando entrar, só assim conseguirá acender a luz. Vou tomar mais um café, e em seguida desço para lhe ajudar. Alguns pacotes são menores, mas você deve tomar cuidado com todos eles, fui claro?

-Sim, obrigado Senhor.

Armand desceu com cuidado a escadaria que dava acesso ao hall de entrada. Ao lado do relógio, uma porta discreta dava acesso ao porão. Percebeu que de fato, a porta não abria para fora, e sim para dentro. Uma vez lá dentro, fechou a porta para poder encontrar o interruptor. Só então notou o quanto estava escuro ali embaixo. Tateou a parede, e finalmente conseguiu acender a luz.

Pode notar o quão grande era o porão. Na verdade, a casa fora construída sobre ele, o que fazia com que fosse mais amplo do que parecesse. A luz era forte, mas iluminava somente o canto direito; para onde quer que ele olhasse, a luz se perdia na escuridão deixando oculto o restante do lugar. Um ar gelado entrava nos pulmões de Armand, afinal, as paredes eram constituídas de pedras, e em algum lugar do porão que ele não conseguia enxergar, escutava o barulho de uma corrente de água, provavelmente uma nascente encontrada nas fundações da casa.

Debaixo da luz, junto à parede havia uma enorme mesa com vidros cheios de líquido, e alguma coisa dentro que a principio não conseguia distinguir. Em uma extremidade da mesa, quase se perdendo em meio a escuridão havia uma pequena pia de pedra, e na outra ponta, uma prateleira com ferramentas de corte, alicates, pinça, serrotes, facas, martelos e tudo o mais que se possa imaginar. Ao lado, finalmente as referidas caixas que o Sr. Ricardo descrevera a ele. Sobre elas, fita para embalar e uma tesoura. Seu trabalho ali havia de ser rápido.

-Mas o que é isso dentro desses vidros? – Armand se aproximou receoso, e observou com cuidado o conteúdo dentro daqueles frascos. Era uma espécie de coração, menor que o de um humano... Em outro frasco, duas patas de coelho com pelos ralos e soltos estavam depositadas no fundo. E outro, e mais outro... Havia uma dúzia de frascos contendo partes de animais

-Bem, isso é muito esquisito.

Armand seguiu em direção as caixas, pegou a fita adesiva na mão e iniciou seu trabalho. Não estava gostando muito do porão, portanto quanto mais rápido terminasse, mais rápido poderia sair dali. Quem sabe até terminasse antes do Sr. Ricardo poder ajuda-lo? Afinal de contas, muitas caixas eram pequenas e poderiam ser facilmente lacradas. Apenas 04 caixas eram grandes, quase um metro de largura por 50 cm de espessura, mas no ritmo em que estava não teria muita dificuldade com elas.

Já estava na sétima caixa, quando escutou alguma coisa se mexendo do outro lado do porão. A luz não chegava lá, de forma que interrompeu o barulho que fazia ao puxar a fita e prestou atenção no barulho. Era uma espécie de ganido, triste e confuso. Havia algum animal ali. Armand pensou em subir para pegar uma vela, mas se topasse com o Sr. Ricardo pela casa seria questionado se já tinha terminado, e isso, ele não queria de jeito nenhum.

Deixando a fita e a tesoura de lado, caminhou em direção ao barulho. O animal, percebendo seu movimento, começou a ganir mais alto, como se dissesse a ele onde estava. Armand penetrou na escuridão. Sua única luz havia ficado para trás, e por incrível que pareça, não enxergava um palmo a sua frente, seu único senso de direção, eram os ruídos fracos que o animal emitia. Cauteloso, seguiu passo a passo, olhando para trás de vez em quando, observando a luz que ficava cada vez mais distante. Facilmente ele se perderia no porão se não fosse por aquela lâmpada. Atrás dele, era seu caminho de volta, a sua frente um breu tenebroso não permitia que enxergasse nada sequer.

Esbarrou em algo no chão. Colocou-se de joelhos e apalpou.

-É você amigo? O que está fazendo aqui embaixo?

Tateando, Armand percebeu que era um filhote de cachorro. Não precisou de luz para perceber que o animal estava em pele e osso. Fraco, sua única fonte de “sustento” se é assim que podemos chamar era a água gelada que corria no córrego bem próximo dele.

-Você está preso aqui embaixo? – Armand percebeu uma corrente e uma coleira presas ao pescoço do cãozinho – Como conseguiram te prender aqui? De repente, uma série de conexões se formou em sua cabeça – será que? Não, acho que não.

Desatou a coleira do pescoço do animal e o pegou no colo. Virou-se para trás. A luz ainda estava acesa, de forma que ele não teria dificuldades em retornar. Seguindo em direção à lâmpada, o cão lambeu sua mão, em forma de agradecimento.

-Saia daqui seu infeliz. Eles vão matar você.

Desorientado, Armand se virou para trás, em direção à voz.

-Quem está ai?

Apenas silêncio. O cachorro em seus braços rosnou. Apesar de fraco, também havia escutado aquele sussurro, que parecia vir de dentro das paredes.

-Armand? Armand você está ai?

Olhando em direção à luz, Armand reparou que o Sr. Ricardo havia entrado no porão, e o procurava a sua volta.

-Sim, senhor! Estou aqui?

-Mas que diabos você está fazendo no escuro? Você não terminou o serviço que lhe pedi? Venha cá! Falei para que não mexesse em nada. Apenas pedi que embalasse as caixas.

Seguindo a passos rápidos em direção a Ricardo, Armand se desculpou.

-Perdão senhor. É que encontrei este cachorro preso do outro lado do porão.

Ricardo se aproximou até estar embaixo da lâmpada.

-Preso, como assim preso? Este cachorro está vivo?

-Sim senhor, estava chorando lá, eu não podia ficar aqui sem fazer nada.

-Estranho isso... Trouxeram-me este cachorro da rua, mas eu tinha certeza de que ele estava morto, quer dizer, ele não se mexia, estava magro, encardido e mais duro do que uma pedra!

-Mas senhor, como explicar a corrente? Ele estava preso lá!

-Não, não estava. Eu o deixei lá exatamente como me trouxeram. O velho que me deu o cachorro disse que ele havia morrido de fome. Sua antiga dona tinha falecido dentro de casa, e quando encontraram o corpo dela, o cachorro estava amarrado a uma corrente, presa a casinha, sem água e sem comida, estava duro, fedendo, ao menos foi o que o velho me contou, e quando recebi o cachorro, realmente tive de concordar com ele.

-Senhor, este animal deve estar a muito tempo sem comer, e se não fosse pela água, certamente teria morrido mesmo. Não seria melhor que eu subisse e alimentasse o cão? Depois podemos procurar por alguém que tenha interesse em pega-lo.

-Não, pode deixar... Vamos cuidar dele, e quando estiver saudável, podemos presentear alguém, o que acha? Ele é novo, branco... Apesar de magro, se bem tratado poderá ficar muito bonito.

Armand ficou feliz com a sugestão de Ricardo, mas ainda assim, o fato de ter encontrado o animal no porão ainda não fazia sentido.

-Senhor posso lhe fazer uma pergunta?

-Claro, de que se trata?

-Mesmo que o cachorro estivesse morto, porque o manteria aqui embaixo?

Ricardo riu, colocando a mão na cabeça, como se estivesse esquecido de contar a Armand sobre tudo o que ele fazia.

-Desculpe... Meu pai era taxidermista, empalhava animais. Colhia os corpos na estrada, ou pegava com alguém. Aprendi isso com ele, e tenho como hobby nas horas vagas. Esse cãozinho se livrou, eu ia empalha-lo, mas por sorte ele está vivo... Apesar de magro, parece um poodle, o que você acha?

-Sim, realmente parece mesmo. Bom, se o Senhor não se importa irei subir e alimentá-lo. Acho que mais 05 minutos e ele não aguenta – Armand riu de si mesmo.

-Tudo bem, eu o acompanho.

Armand e Ricardo subiram conversando e seguiram em direção à cozinha. Agora, o porão estava às escuras, e lá no fundo, outro ganido ainda mais fraco surgiu.

Continua...

Bonilha
Enviado por Bonilha em 07/03/2012
Reeditado em 03/05/2012
Código do texto: T3540413
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