Promessa Maldita

-- PROMESSA MALDITA --

Renato B. de Melo

"Jesus foi com ele. Grande multidão o seguia, comprimindo-o. Aconteceu que certa mulher, que, havia doze anos, vinha sofrendo de uma hemorragia [...] tendo ouvido a fama de Jesus, vindo por trás dele, por entre a multidão, tocou-lhe a veste".

Marcos 5:24-25,27

Cemitério da colina. São Bernardo do Campo - SP - 1989.

- Marcelo - disse a doce Amanda em um tom repreensivo - Não pise nos túmulos, tenha respeito com os mortos.

- Eu respeito eles - ele disse zombando - respeito o fato deles estarem mortos. Nada podem fazer, além de me ver pisando em suas tumbas, o que vão fazer ? ein, ein

Ela ignorou essa brincadeira, pois sempre fora assim. Continuaram caminhando em meio aos túmulos, procurando aquele nome descrito no papel; Gizélda Chavez.

Acho que estamos perto disse um deles...

- Certo - Marcelo tirou a mochila das costas e começou a montar o telescópio que havia roubado no laboratório de astronomia da faculdade.

- Tem certeza de que precisa fazer isso? - questionou Amanda, olhando de forma dislexa do telescópio para o túmulo.

- Sim- disse ele com uma certa tristeza na voz - Tenho certeza que esse túmulo é a chave, preciso apenas posicionar o telescópio adaptando a visão do cadáver e, preciso de sua ajuda.

Marcelo invadiu um porão, e pegou duas pás de coveiro. Ele e Amanda começaram a cavar o túmulo, depois de 35 minutos, o bico da pá bateu na madeira úmida do caixão...

- Caralho! - gritou ele atônico - conseguimos, quem vai abrir?

- Você é claro - disse ela saindo do buraco e sentando-se na lapide de mármore. Deitou-se na grama e começou a admirar as estrelas. O céu de São Bernardo estava realmente muito limpo...

Marcelo começou a golpear o caixão com o cabo da pá, usando toda a sua força. Amanda tinha medo de algum funcionário ouvir o barulho e chamar a policia. Mas os dois continuaram ali, cada um do seu próprio jeito. Ela deitada na relva olhando descuidadamente para o céu. Ele dando golpes violentos contra o caixote de madeira podre.

O cheiro putrefato de cadáver em decomposição logo invadiu os pulmões de ambos. Marcelo imaginava quantas milhões de bacterias haveria naquele corpo, nojento e gosmento...eca! Com a ajuda da sua doce namorada Amanda, retirou o corpo com ajuda de uma corda. Primeiramente a amarraram em volta da cintura do cadáver, mas pelo avançado estado de decomposição, a corda cortou a carne e entrou órgãos a dentro, fazendo vazar sangue podre e restos de órgãos mecatrefes.

- Que nojo do caralho - gritou Marcelo enquanto empurrava o cadáver por baixo e sentia o sangue e as tripas caindo em sua boca. Ele então cuspiu, algo que poderia ser o pedaço de um rim podre.

- Puxa logo essa merda - gritou ele para Amanda - Santo Deus! Acabei de ser banhado pelas tripas desse cadáver.

Amanda conseguiu terminar de puxar o corpo , o mesmo caiu sobre ela em um baque mole. O cadáver caiu de boca aberta em cima de seu rosto, vomitando o próprio interior em decomposição.

- PUTA QUE PARIU ! - gritou ela engasgada com a água do morto - Tira isso de cima de mim, por favor!

Marcelo deu um pulo e saiu do buraco todo molhado, olhando aquela cena ele achou certa graça, e deu uma risada sútil.

- Pare de gritar igual uma putinha - disse ele retirando o corpo de cima dela - Já estamos quase terminando.

Amanda então foi cuspindo até sua bolsa, e retirou o banco dobrável que trouxera de casa. Montou ele, e posicionou o telescópio em cima da lápide. Com muito esforço colocaram o cadáver sentado neste banco, e posicionaram novamente o telescópio a fim de fazer com o que o cadáver olhasse pelo seu visor. Marcelo ficou abraçado com o corpo, enquanto o mesmo via pela primeira vez o Eclipse completo da lua, naquele longe 6 de janeiro de 1989.

A 5 anos atrás, Marcelo havia prometido pra sua mãe, que compraria um telescópio pra ela ver o eclipse, porém, ela morrera vitima de câncer...e o assombrava, ele sabia que seu espirito só ficaria em paz, depois que cumprisse esta ultima promessa....e agora estava cumprida.

.... Renato B. de Melo....

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15:38 - 18 de março de 2012

Renato Mello
Enviado por Renato Mello em 18/03/2012
Reeditado em 16/03/2013
Código do texto: T3561669
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