O Mistério das 13 Almas

Na casa humilde rolava um clima de desesperança, beirando a depressão e a baixa- estima. Diogo morava com a sua mãe, uma idosa-e, era o responsável pela casa, o provedor. A velha ainda aguardava os laudos médicos que a indicariam para uma breve aposentadora, contudo, não havia tempo a esperar. Doente, inválida e com sérios problemas de saúde - necessitava de diversos medicamentos. A casa estava nas últimas. O último mês do seguro desemprego fora àquele. Fizera uma escolha difícil: nada de compras para a cozinha, so o bastante para um, ou dois dias para garantir o alimento de sua mãe. Todos os medicamentos foram comprados - para a diabetes, a pressão, e para o coração ja velho e doente. A casa estava no mais mórbido silêncio. A idosa deitada, por ter se sentido indisposta. Diogo, de barriga vazia, estava sentado numa cadeira, defronte à janela. Os braços apoiados no parapeito, o queixo apoiado num dos braços. O olhar perdido na rua, olhava, displicentemente o movimento quase inexistente na pacata rua , onde morava. Talvez, assim, buscasse uma solução. A tarde que se estendia, num calor sufocante, não o castigasse tanto e lhe desse inspiração para encontrar uma solução.

Levantou-se de forma abrupta da cadeira, tirou a camisa, deu uma olhada para a velha deitada na cama, foi ao banheiro e tomou um demorado banho refrescante, que o deixou bastante relaxado.

Trocou de roupa, calçou o par de sapatos surrados, e saiu sem destino, por ironia, longo tempo depois, chegando à Av. Francisco Falconi, 837, Vila Alpina , deu de cara com a entrada do cemitério São Pedro. Observou:

- Minha nossa, so pode ser obra de Deus, eu ter vindo até aqui, andei de metrô e ônibus sem destino certo, depois de andar por mais de quatro quarteirões, chego até aqui, à frente do cemitério, e deu de cara com uma placa dessa: " Precisamos de vigia noturno".

Aumentou os passos, andava de forma ligeira, estava ansioso - ficou intrigado, talvez, apenas tivessem esquecidos de tirar aplaca-, qualquer oportunidade de emprego na grande São Paulo, logo se forma uma longa fila, seja la qual for a vaga ofertada.

E, ali, entre as lápides, túmulos, mausoléus, se sentiu por aquela atmosfera mórbida, envolvente, se quer, sabia para onde se dirigir em busca daquela vaga oferecida. Estava perdido por entre os túmulos e pelo raro verde que ali reinava. Flores murchas distribuíam-se em jarras espalhadas pelos túmulos, deixadas ali pelos parentes dos que repousam para sempre.

Um cemitério é sempre cercado de mistérios, por mais que seja barulhenta a rua onde se localiza, movimentada, quando se está dentro do cemitério a atmosfera ali, reinante é diferenciada - há uma magia especial , uma sintonia que nos liga de forma inconsciente com o mundo dos mortos.

Depois de andar por eternos três minutos, ou mais, perdido por entre as covas, avistou uma casinha simplória nos fundos, para ali se dirigiu.

Antes que se anunciasse, a porta foi aberta. Uma senhora magra, vestida de forma elegante o mandou entrar. A sua pele era de brancura diáfina, profundas olheiras formavam-se em volta dos seus olhos graúdos. Um decote, de forma acidental se insinuava, por entre dois botões abertos , de forma acidental na sua blusa de mangas compridas. Parte dos seios miúdos, cobertos por um sutien transparente se revelavam. Ele os obeservou, de soslaio. A senhora, que aparentava cerca de quarenta anos, não perdeu tempo:

- Preencha esta ficha, depois conversaremos, três minutinhos, apenas. está com os seus documentos?

- Sim , estou, poderia me emprestar uma caneta?

Pediu, e foi-lhe, prontamente estendida uma caneta.

As mãos trêmulas preenchiam, de forma rápida,traços ansiosos, cada pré-requesito pedido ali na ficha. A última pergunta, lhe deixou um tanto intrigado, mas não exitou, respondeu sabendo que agradaria áquela senhora que o recrutava.

- Não tenho concorrentes?

- Sim, tinha, muitos. Foram reprovados, demos uma semana ao candidato, caso não se comporte como desejamos, mandamos embora, quer dizer, a maioria se demite. Não podemos deixar o cemitério sem um vigia noturno à noite, ou mesmo durante o dia temos invasões de drogados, ou de ladrões de túmulos.

- Violam os túmulos?

Indagou, com espanto.

-Sim, temos ladrões de todos os tipos numa cidade como São Paulo, senhor...Diogo ...deixe ver, Batista de Andrade. Hum, o senhor não é natural daqui, é nordestino, da Bahia.

- Sim, de Feira de Santana, uma cidade que fica há pouco mais de 100 Km de salvador. Moro aqui ha pouco mais de dois anos, perdi o meu último emprego faz alguns meses. Estou vivendo do seguro desemprego e de alguns bicos que faço para a vizinhança, até a namorada foi embora.

-Interessante. Gostamos de gente da Bahia, são alegres e festivos. Os mortos, talvez, se agradem do senhor. Quando o homem está sem grana, senhor Diogo, o amor da mulher sai pela janela, e ela pela porta.

Quem gosta de homem é viado, mulher gosta mesmo é de dinheiro, peço-lhe desculpas pela intimidade, porém, acho que seremos bons amigos. Poderia começar hoje?

- Claro, claro, devo voltar á noite?

- Esteja aqui ás sete horas em ponto, é o horário que o jardinheiro vai embora junto com os coveiros, o cemitério não pode ficar sozinho.

Quando Diogo estava indo embora, após terem se levantado e cumprimentado-se, num aperto de mãos, ela o levou ao lado do escirtório.

- Ali está a torneira e o balde, caso precise de água, estou te indicando, agora, porque poderia esquecer de te avisar - talvez precise de água quando estiver no seu turno. Talvez, ainda esteja aqui quando retornar, caso eu não esteja, o senhor José estará te esperando e te dará as recomendações. Amanhã, estarei providenciando o registro de sua carteira. Vai estar precisando de um adiantamento?

Ele, esperto confirmou, ela sacou da sua bolsa uma carteira vistosa, sacou cerca de trezentos Reias - valor que o deixou bastante feliz.

- Vai para que lado mesmo o senhor, talvez, possa te dar uma carona.

- Pensando bem, são mais de cinco horas da tarde, acho que prefiro ficar por aqui, ou talvez, se não permitir, poderá me deixar numa praça, onde poderei matar o tempo até dar o meu horário.

- Imagina, ir para uma praça, a violência urbana está a cada dia pior, poderá ser assaltado, ou ser assediado pelos pequenos traficantes que infestam ás praças. Pode ficar, sim, venha comigo, mostrarei o refeitório, o almoxarifado, a floricultura, e demais dependências dos nossos funcionários.

Ela tinha uma voz grave, anasalada, o corpo era esguio, Os cabelos tinham um corte moderno, uma franjinha lhe cobria a testa. A saia era curta, exibindo um par de coxas medianas, nem grossas, nem finas. usava um par de sapatos, de saltos medianos. Seguiu o trâmite legal com o seu novo funcionário. despediu-se dele e o apresentou a um senhor gordo, careca, baixinho que lhe daria novas instruções. Ela entrou no seu carro e foi embora. Antes de ir-se, lhe lançou um olhar enigmático, que o deixou intrigado. " Será que se interessou por mim?"

Perguntou-se, com um sorriso na sua face. A fome ressurgiu do nada, comunicou isso ao senhor José, que o levou para o pequeno refeitório. Foi providenciado um prato com pão, presunto, queijo e dois ovos mais café - com leite. Comeram à vontade.

A noite havia chegado com um céu repleto de nuvens carregadas, eram escuras. Uma trovoada se anunciava. Talvez, chovesse por toda á noite. O ambiente do cemitério não era nada iluminado - isso aumentava a tensão, parecia alimentar a fantasia que se manifesta no consciente da mente humana ligada ao sobrenatural - nunca na verdade, acreditamos que os mortos repousam o sono dos justos, mas, que a qualquer momento, resolvem se manifestar.

- Que azar o meu, logo na primeira noite de serviços vai chuver.

- Azar? Sorte sua que cairá agua dos céus.

Falou José, enquanto se preparava para ir embora. Deu a última recomendação, caso precise de uma ajuda extra, o zelador mora logo depois das criptas da burguesia, ele não gosta de ser importunado, vive com uma mulher mais jovem do que ele, é ciumento - caso não possa resolver sozinho o que se sucede, o procure.

Pôde ouvir o pensamento sussurrado do José, enquanto este ia pelo caminho entre os túmulos na saída do cemitério:

- Mais um, duvido que fique...sorte dele que vai chover, se não...

(Continua)

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 30/09/2012
Reeditado em 05/08/2013
Código do texto: T3908315
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