A Verdade Oculta

- Tem certeza? – Nicolas perguntou para a garota que o olhava com ansiedade.

- Tenho. Você o trouxe? – ela perguntou. O garoto retirou um frasco do bolso, que continha uns dois fios de cabelo castanho.

- É claro. O peguei quando ele dormiu na sala de aula. – ele respondeu. Estava com medo, mas tinha que fazer aquilo pela sua honra.

- O arrancou da cabeça dele? – a garota perguntou, com receio.

- N-Não... Mas estava na blusa dele. Só pode ser dele. – Nicolas falou. Só podia ser do garoto.

- Então está bem. Vamos começar a arrumar tudo. – a garota falou e ela e Nicolas se dirigiram até o centro da sala, onde, mais cedo, tinham desenhado um círculo com uma estrela de cinco pontas dentro.

Nicolas roubara os fios de cabelo de Denis, um inimigo de classe, que havia dado em cima de sua irmã mais nova, Neide, que recusara o garoto e, por isso, o idiota tinha dado um beijo a força na menina e tentado se aproveitar dela de outra forma, e teria conseguido, não fosse o inspetor da escola ter pego o agressor de sua irmã e o suspendido. Mas Nicolas não estava satisfeito e, por isso, chamara sua namorada, que ele sabia que frequentava um curso noturno de bruxaria, e ela o prometeu ajudar a se vingar de Denis.

Eles acenderam algumas velas em volta de todo o círculo e a menina pegou um boneco de massinha que ela mesma tinha feito certo dia no curso, prenderam os fios de cabelo no boneco com um alfinete e o puseram no centro do círculo. Jogaram, também, em volta das velas, uma espécie de pó avermelhado, como dizia o feitiço no livro negro de sua namorada.

Em seguida sua namorada falou para pensar na pessoa em quem queria ferir e, enquanto ele pensava com todas as forças, a menina dizia algumas palavras que ele não conseguia entender – palavras que ela lia em seu livro. De repente os fios de cabelo que estavam presos no boneco pegaram fogo e logo o fogo se espalhou pelo boneco, chegando em seguida a atingir todo o diâmetro do círculo, chegando em altura até o teto. E do nada, tal como surgira, se apagou, revelando o boneco, com uma aparência metalizada. Ginger, sua namorada, mandou que ele entrasse no círculo e pegasse o boneco e assim ele fez. Não estava quente, como ele esperava, mas frio. E, apesar de estar com aparência de metal, sua textura ainda era de massinha, pois o boneco ainda era flexível.

- Pegue a faca ou o bisturi ou o alfinete e faça o que você tem que fazer. – ela falou. Ele estava indeciso, mas de cara escolheu a faca de quinze centímetros que tinha à sua frente e, com toda a raiva que tinha em seu coração, enfiou-a direto na barriga do boneco.

•••

- Aaaaaaaaaaaaaaah! Aaaaaaaaaaah! Soooocoooorroooooo! – gritava a menina em seu quarto. Seus pais ouviram os berros da filha, no quarto debaixo e desceram correndo. Os gritos dela eram cada vez piores. – Aaaaaaaaah! – ela continuava a gritar.

- Onde está o Nick, Wanda? – perguntou Nando.

- Foi dormir na casa da namorada. Vamos, vamos. – respondeu a mãe de Nicolas, cada vez mais preocupada com os gritos da filha, que só aumentavam em frequência e em altura.

Não puderam acreditar na cena que viam à sua frente. Era inconcebível. A barriga de Neide tinha um corte reto e profundo que sangra rios de sangue. Sua cama estava toda empoçada de líquido escarlate. Mas o pior era que esse não era o único ferimento, mas quanto mais tempo eles olhavam, mas ferimentos iam aparecendo, como cortes de bisturi, alfinetadas diversas. De repente, um corte profundo arrancou-lhe a perna e em seguida um dos braços. Não havia nada que seus pais pudessem fazer, senão olhar aquele acontecimento sobrenatural.

Neide não mais gritava, estava quase desmaiando, quando enfim, seu peito começou a sangrar, bem onde fica o coração e em minutos, tão silenciosos quanto dolorosos, a menina de quatorze anos fechou os olhos e morreu, toda desfigurada.

•••

- E então? Como foi? – Ginger perguntou. – Você sentiu alguma coisa?

- Senti que o desgraçado morreu. Enquanto fazia tudo isso, senti o culpado pela história da minha irmã morreu. – Nicolas falou, sem imaginar que, quem era o verdadeiro culpado por toda aquela história, era ninguém menos do que sua irmã, que numa tentativa infrutífera de seduzir Denis, jogara toda a culpa em cima do rapaz, que sem culpa alguma, ganhou uma bela de uma suspensão.

- Sério? Uau, e foi minha primeira vez com esse feitiço. Muito maneiro. – Ginger falou, e Nicolas apenas balançou a cabeça em sinal de concordância. Não sabia por que, mas seu coração estava apertado.

•••

Nicolas estava acabado. Passara a noite em claro com a namorada, conversando sobre o ritual que tinham feito, mas mais que isso, seu corpo não tinha energias, como se as tivesse transferido para o ritual.

Ele chegou em casa exausto e estava pronto para ir para a cama quando percebeu que a casa estava num silêncio anormal, uma vez que aquela hora Neide estaria assistindo seu programa favorito daquele horário, seu pai cortando a grama e sua mãe, lavando a louça do café. Mas a louça que estava lá não era do café, mas da janta. Ele se sabia que era da janta, pois tinha jantado com os pais antes de ir para a casa de Ginger.

Com aquele sentimento de aperto no peito, seguiu as escadas correndo e foi direto para o quarto dos pais, mas os ouviu dentro do quarto de Neide. Pareciam chorar.

- Mãe... Pa... O quê? O que aconteceu aqui? O que houve com a Neide? – ele começou a berrar, o que só fez seus pais chorarem ainda mais. Ele caminhou até a cama da irmã. A cena à sua frente era horrível de se ver, tal desfigurada estava sua irmã. Foi então que ele entendeu... Entendeu que a verdadeira culpada pela história era ela, sua irmã, quem ele havia tentado defender. Exausto e sem emoções no coração, saiu de dentro de casa. Como se perdoaria por ter matado a própria irmã? E como perdoaria Ginger por tê-lo influenciado com aquela história de bruxaria? Ele tinha ódio de Ginger e seu maldito livro negro, isso sem contar em como ela ficara feliz quando viu que o resultado tinha dado certo. Ele e ela eram dois assassinos.

- Ginger não é a culpada. – falou uma voz que ele bem conhecia, a quatorze anos.

- Neide? – gritou. Não tinha se dado conta que tinha ido para o parque, onde tinha um lago.

- A culpa não é dela. Você sabia dos riscos de namorar aquela menina. – sua irmã falou – Será que você pode me perdoar por ter mentido?

- Você é quem tem que me perdoar Neide. O que você fez não se compara com o que eu fiz. – Ele falou. Enquanto ele chorava, lágrimas de sangue escorriam dos olhos da menina. Ela não falou nada, apenas estendeu-lhe a mão e ele, sem hesitar, a segurou. Nem percebeu que exatamente nessa hora caía dentro do lago. E não imaginava que só sairia dali, morto, quando seus pais encontrassem seu corpo no dia seguinte, ao perceberem o desaparecimento do filho.

Camilla T
Enviado por Camilla T em 24/10/2012
Código do texto: T3950129
Classificação de conteúdo: seguro