ATESTADO DE ÓBITO (miniconto)
- Não olhe para trás, senão você morre - a voz rouca sussurrou ao seu ouvido.
Naquela tarde de verão o calor entorpecia o corpo e fazia o asfalto ferver, na beira da rodovia ele estacionou o velho caminhão de carga e fez cumprir seu destino rumo à porta pequena e sem letreiro de um bar de estrada.
O senhor de 40 anos entrou para comprar um maço de cigarros, um zumbido fino atormentava sua cabeça há horas, sentia as pálpebras pesadas e as mão dormentes. De costas para porta, o homem se apoiava do velho balcão de madeira, tilintando moedas na mão, pai de dois filhos, esposa bonita... em três dias estaria em casa.
- Não olhe para trás, senão você morre!
Um estampido alto cessou o zumbido por um instante, as moedas se espalhavam pelo balcão de madeira enquanto os tiros chicotearam as paredes e as bebidas em exposição, tudo que o homem conseguia ver era o rosto de seus filhos e seu coração batia tão forte que parecia querer rasgar o peito. Ali parado, sentado, imóvel para o mundo ele parecia divagar, sentia o cheiro fétido das entranhas humanas expostas e um sangue escuro e denso escoria até seus pés... ele não queria acreditar... não podia.
- Não olhe para trás, senão você morre!
Na chacina, quinze pessoas mortas, entre elas uma criança, o homem nunca seria o mesmo, com certeza seria uma pessoa melhor se naquele instante... por impulso... sob a mira certeira de uma pistola, não tivesse, simplesmente, olhado para trás...