Amor e desencontros na Estação da Luz

O inverno de 1999 traria grandes surpresas para aquela jovem apressada, estudante de direito.

Na estação da Luz, centro velho de São Paulo ela aguardava pelo último trem, o qual a levaria para o bairro da Moóca.

Em meio àquela plataforma deserta, avistou um homem de meia idade, muito bem vestido.

Aquela figura inesperada parecia ter surgido do nada. Seus passos eram enfeitados pelo brilho de seus sapados muito bem lustrados. Aproximando-se perguntou-lhe qualquer coisa sobre o último trem. Um pouco assustada, a bela moça de cabelos lisos, curtos e um vestido vermelho respondeu-lhe prontamente, desejando em seu coração que o tal homem se afastasse o mais rápido possível.

Como demonstração de gratidão, entregou-lhe uma pequena flor, que trazia dentro de seu paletó e se afastou para a extremidade da plataforma, após um sorriso simpático.

A moça acompanhou seu deslocamento, olhando-se os passos até vê-lo sumir na escuridão, por detrás de uma escada secular. Logo o trem se aproximou e ela embarcou ruma à sua casa, que ficava na antiga Rua dos Trilhos.

No caminho não conseguia esquecer aquela figura. Seu sorriso e simpatia, um agradável perfume e aquela flor. De repente, a figura daquele homem de meia idade se confundia com a de um homem elegante e a de uma figura masculina paterna, pois seu pai deixara sua mãe quanto ela tinha apenas um ano de idade, jamais regressando.

No dia seguinte, uma sexta-feira novamente estava lá aquela garota, no mesmo horário, voltando da faculdade. O frio intenso tendia a afastar cada vez mais as pessoas por aquelas bandas.

Por um momento lembrou-se daquela figura intrigante, desejando no seu íntimo vê-lo novamente. Para sua surpresa, ao virar-se à outra extremidade, lá estava ele novamente, de pé e com a mesma elegância da última vez.

Um sorriso surgiu no seu rosto e no dele também, como que ambos se lembrando um do outro. Iniciar uma conversa fora algo inevitável.

Ele lhe perguntava sobre os estudos, seu nome, aqueles assuntos básicos, que normalmente conversamos ao acabarmos de conhecer alguém.

No momento que o trem chegou despediu-se cordialmente da moça, entregando-lhe outra flor. Quando entrou no trem, foi até a janela para avistá-lo, mas estranhamente não o viu mais. A cada momento, a moça ficava cada vez mais intrigada e ao mesmo tempo encantada com aquela figura madura. O fim de semana representaria um longo período sem ver mais aquele jovem senhor.

Segunda-feira, a volta à rotina proporcionou um novo encontro. Mais uma conversa, até que a garota se atreveu a perguntar onde ele morava e por que estava todos os dias por ali.

Nesta hora o homem de simpatia inigualável, fechou-se e abaixou a cabeça demonstrando certa tristeza. Prontamente, a moça pediu-lhe desculpas, sem entender absolutamente nada.

Ele então se levantou e disse que todos os dias estava naquela estação esperando por sua esposa, que havia viajado mas nunca voltava.

A moça então sem compreender o assunto e também tocada de compaixão resolveu não perguntar mais detalhes, pois havia percebido o quando aquele assunto mexera com ele.

Num novo encontro, o homem aparecera com um semblante muito abatido, diferente dos demais dias. Para estranheza da moça, ele agora estava sentado num banco da estação e não a procurara para puxar assunto.

Mesmo assim, a simpática estudante dirigiu-se até o banco para falar com ele. Havia algo muito estranho. Ao mesmo tempo que falava, o homem não esboçava qualquer reação. Parecia que a garota estava falando com as paredes.

Decepcionada, se levantou e colocou-se a aguardar seu trem. Por um momento, a garota sentiu uma grande revolta em seu coração. Era estranho, mas parecia estar apaixonada por aquele homem maduro, com idade suficiente para ser seu pai.

Na noite seguinte estava decidida a se declarar para ele. Se ele estava ali todas as noites, aguardando pela esposa que nunca chegava, talvez estivesse sendo traído. Mas era estranha a sensação de se declarar para um homem com uma aliança nos dedos, e ainda muito mais velho. O que sua mãe, suas amigas achariam?

Mesmo assim não exitou-se, e na noite seguinte tentou novamente falar com ele, mas para sua surpresa, naquele dia o homem não estava na plataforma.

Procurou-o por quase toda a estação da Luz e não achou. Teria sua esposa finalmente chego? Como ficaria agora, com essa paixão toda em seu coração?

De repente, avistou um casal se aproximando. A roupa era idêntica a que aquele homem sempre usava, mas sua aparência era mais jovem. Muito esquisito. Seria aquele rapaz filho daquele senhor? Não, não era filho, era ele mesmo!

A moça ao seu lado usava um vestido vermelho, cabelos curtos e lisos. Seu rosto, estranhamente não podia ser visto. Por um instante, a garota sentiu algo muito esquisito. Suas mãos e pés começaram a transparecer-se e uma forte dor tomou conta de seu corpo. Parecia rasgar-lhe ao meio de tão forte, até que ouviu o forte som da buzina de seu trem se aproximando. A luz dos faróis cegavam-lhe as vistas, até sentir-se puxada para baixo do trem, sendo atropelada e cortada ao meio.

O trem partiu, e seu sangue se aspergiu por aquela antiga e centenária plataforma, ficando por ali anos e anos. No mesmo dia da tragédia, seu amado, ao ver o corpo da esposa e todo aquele sangue, lançou-se na frente de um outro trem, morrendo também.

Vinte e seis anos após a morte, ambos estavam na mesma estação, tentando se encontrar, mas sem nunca reconhecer-se.

Paulo Farias
Enviado por Paulo Farias em 28/12/2012
Código do texto: T4056565
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