Os caminhos da morte.

Hoje caminhava distraidamente pela rua mais movimentada da minha cidade, quando observei uma menina que atravessava a rua, distraidamente, com fone nos ouvidos, sem se preocupar em olhar para os lados. Avistei um palio prata, vindo velozmente em sua direção, sem ter tempo de frear o motorista atropelou e arrastou a pobre menina por uns dez metros antes de conseguir frear.

O choque foi imenso: gritos e lamentos desesperados das pessoas que estavam próximas ao local, ninguém parecia acreditar no que tinha acontecido, o próprio motorista do carro parecia estar em choque, saiu do carro com as mãos na cabeça, aparentava ter uns vinte anos.

O carro havia parado de lado no meio da rua, havia um grande rastro de sangue e miolos espalhados pelo caminho que a menina havia sido arrastada, o corpo dela estava próximo ao pneu dianteiro do palio, estava caída de bruços.

O pé direito ainda estava calçado com uma melissa rosa o pé esquerdo estava descalço e havia um ralado no peito do pé. A Parte esquerda da cabeça estava totalmente destruída, o tampão da cabeça havia estourado empurrando o olho esquerdo para fora, o que sobrou dos seus belos cachos loiros agora tinha uma tonalidade vermelho sangue.

O motorista dizia baixinho quase que para ele mesmo: - Não tive culpa, ela apareceu de repente na rua...

Algumas pessoas choravam, outras vomitavam, algumas queriam agredir o motorista, mas eu não fiz nada disso, minha atenção estava toda voltada para aquele cadáver, qual seria a musica que ela estava ouvindo no seu momento final? O que ela estava pensando?

Reparei, que alguns metros atrás havia uma bolsa de mercado, a bolsa que a jovem carregava, havia uma barra de chocolate que saiu pra fora da bolsa com o impacto da batida, dentro da sacola havia uma garrafa de dois litros de coca que agora vazava no asfalto, um biscoito recheado e um rolo de papel higiênico.

Comecei a pensar como aquilo era triste, como deixar coisas por fazer para trás me incomodavam, um filme incompleto? Sair de casa para fazer comprar e nunca mais voltar?

Decidir ser o senhor do meu destino, controlar todos os meus passos, a dona morte era muito sacana, mas eu estaria um passo a frente dela, ela parecia ter algum tipo de humor negro sempre pegando as pessoas com coisas incompletas por fazer, decidindo quando e como elas partiriam. Eu não podia aceitar isso.

Fui para a minha casa e arrumei todo o meu quarto, deixei tudo em ordem. Vi os filmes que queria ver, escutei as musicas que queria escutar, telefonei para as pessoas que eu queria conversar.

Tomei um banho demorado repetindo para mim mesmo que eu estava no controle, vesti minha melhor roupa, peguei uma faca na cozinha e me olhei no espelho, ao meu lado eu pude ver a menina morta, ela estava linda. Abraçou-me por trás colocando sua cabeça em meu ombro, sem pensar duas vezes enfiei a faca no meu coração.

Cai no chão. Enquanto dava meus últimos suspiros, olhei para a menina que me olhava de pé, seu rosto agora havia mudado, era o rosto do cadáver que ela havia se tornado, em sua boca havia um sorriso de deboche, eu não estava no controle, não havia planejado minha morte nem me tornado o senhor do meu destino, fui enganado! Realmente a morte possui um humor negro.