Cova rasa

Cova rasa

O cachorro entrou quintal á dentro trazendo algo na boca. Do tanque onde lavava a roupa, a mulher não prestou atenção ao que era. Cães estavam sempre carregando lixo para casa. Essa era a quarta vez na semana que o animal sumia pela manhã e voltava horas depois escondendo alguma coisa. No quinto dia, porém, a mulher percebeu um cheiro de coisa podre vindo da casinha do cachorro. Xingando ela foi averiguar, e assim que puxou para fora o cobertor que servia de cama, fez vômito. O odor de carniça atingiu em cheio suas narinas. Que tipo de bicho o danado do cão trouxe desta vez? Se perguntou. Galinha não era, pois aqueles ossos eram grandes. Sem perda de tempo, juntou tudo em um grande saco de lixo. Ficou no alpendre com um cinto na mão, vigiando a volta do cachorro. Hoje ele iria aprender a não carregar porcarias. Minutos depois o cão vira-lata chegou. Estava com os pelos sujos de sangue, e arrastava alguma coisa esbranquiçada. A mulher esperou que ele fosse guardar aquilo, para depois o exemplar. Quando ela se aproximou, o cachorro rosnou agressivo. A mulher não se intimidou e puxou com força o que o animal começava a comer. Um grito escapou da sua garganta, quando descobriu que o que cachorro trouxera desta vez, era parte de um ser humano. O braço muito branco continha uma mão com unhas esmaltadas. Sem saber o que fazer com a macabra descoberta, ela colocou o braço dentro do mesmo saco onde colocara anteriormente os outros ossos, jogou tudo no buraco onde queimava o lixo, derramou álcool e ateou fogo. Não podia contar aquilo para ninguém. Seu marido era ex-presidiário, e ela teve medo de que de alguma forma o incriminassem. Se pelo menos a sua filha estivesse em casa, poderiam pensar juntas no que fazer, mas a moça estava passando uns dias na companhia de uma amiga. A visão do braço feminino, porém não lhe saia da cabeça, e ela decidiu seguir o cachorro e descobrir de onde ele o desenterrara. Não precisou andar muito, pois o cão parou em um deposito de entulhos próximo dali e começou a fuçar oque parecia ser uma cova. A mulher viera preparada. Afastou com um chute o animal, e munida de uma pá começou a cavar. O que viu diante de si, a fez empalidecer e gemer em desespero. Dentro do buraco estava sua filha completamente nua. Os olhos da garota estavam abertos e de dentro deles larvas entravam e saiam. Partes do corpo haviam sido arrancados, e a pobre mãe soube que foram comidas pelo cachorro. Com esforço ela retirou da cova o que sobrara do corpo da filha, e ignorando os bichos e o mau cheiro, abraçou o embalou cantando. O cachorro de. longe esperava que a mulher se afastasse para retirar mais um pedaço do cadáver. As horas foram passando e a mulher continuava abraçada ao corpo putrefato. A noite caiu e um homem apareceu. Viera ali para se certificar de que o corpo não fora descoberto. Ao se aproximar reconheceu a esposa agarrada aos restos da filha. O medo de que ela descobrisse que fora ele quem matara a enteada, o desnorteou. Sem nenhuma piedade ele pegou a pá que estava por perto, e acertou com força a cabeça da mulher. A pancada a fez desmaiar e em seguida, o homem desferiu vários golpes esfacelando lhe a cabeça. Feito isso ele alargou a antiga cova, e lançou dentro mãe e filha. O cachorro na manhã seguinte encontrou certa dificuldade para alcançar os corpos, mas foi recompensado. Pois os nacos de carne que retirou ainda não estavam em decomposição.