Porta Aberta para a Loucura

Estou à beira de um colapso. Não sei mais o que é real ou imaginação. Um passo da paranoia. Da loucura. Falar sobre essas coisas é difícil. Na verdade, não é suficiente. E agora com essa chuva caindo, a melancolia ficou maior ainda. Vejo pessoas mortas todos os dias, porém elas ainda caminham, conversam, comem, dormem. Como todo mundo. Eu sou um deles. Sou um morto que ainda perambula pelo mundo em busca de algo que já me foi tomado: A Alegria de Viver. Por mais que minha família esteja bem e feliz, eu não consigo estar. Não mesmo. Ao contrário. Parece que quanto mais gente alegre ao meu redor, mais fico deprimido. Dá vontade de matá-las, enfiar a faca, sorte que a minha loucura passou por esse nível sem eu perceber. Você era minha única saída, porém se afastou de mim, me deixou perambulando por essa vida cruel. É minha vez de te deixar. Deixar todos. Adeus.

Esse é o texto que Pretty acaba de receber no seu smartphone. Por alguns instantes apenas se lembra de tudo que eles passaram juntos. Todas as brincadeiras, brigas, confusões, abraços. Lágrimas escorrem dos seus olhos. Mas um arqueiro de Deus que está ali perto solta uma flecha de esperança em seu coração e num rápido momento de lucidez em meio a um turbilhão de pensamento. Pretty lembra que está a apenas algumas ruas do apartamento onde Greg está. Pega sua bolsa e sai correndo em direção a Rua 64, que é onde Greg mora. Ela está na Rua 54. Com uma respiração acelerada e ofegante chegou a Rua 57. Abrindo espaço entre a multidão que caminha na calçada. Pretty tenta se focar apenas em seu destino, mas não consegue ignorar a mensagem que acabara de receber. Greg podia estar morto. Ou então estar em outro lugar. Por que estaria em casa? Pensou. Tenta afastar esses pensamentos, porém todas as tentativas em vão. Tira o celular do bolso e disca para Greg. Chama. Chama. Chama.

Greg está olhando pela janela de seu apartamento. Foi até a sacada e avista tudo lá abaixo. Carros e uma multidão de pessoas. Várias pessoas tristes, várias alegres, várias desesperadas, várias calmas. Impressionante como as pessoas conseguem e tentam disfarçar todos seus sentimentos perante o seu semelhante. Ouve um som vindo de dentro do apartamento, mas ignora completamente.

Pretty se arrepende amargamente de ter ligado. Ela o conhecia muito bem e sabia que não iria atender. Apenas perdeu tempo. Porém não aguenta mais correr e entra em um táxi. Mesmo sem nenhum dinheiro no bolso, mas precisa chegar a tempo no apartamento.

- Rua 64. Rápido – Grita Pretty. Assustando o motorista do Táxi.

- Calma menina. Por que você não vai andando já que não é tão longe? – Os olhos de Pretty pegaram fogo, o motorista entende o recado e acelera o mais rápido que pode. Porém o sinal fecha. Pretty ofegante e com a cabeça doendo começa a chorar.

Greg entra novamente ao apartamento e vê o seu celular com uma chamada perdida, porém ignora totalmente e segue para a cozinha. Pega um copo e o enche, com água, pela metade.

- Meio cheio ou meio vazio? Para mim só mais um copo e meu último gole de água – Disse em voz alta para que todas as paredes pudessem ouvir aquela confissão. Coloca o copo na pia e vai até o banheiro para pegar uma gilete.

O sinal abre e o táxi consegue chegar sem problemas até a Rua 60. Porém algo acontece mais a frente e uma fila enorme forma-se.

- O que houve. Por que parou? – Pretty em meio às lágrimas. Está em um estado lastimável. Não consegue mais conter suas emoções. Motorista está tenso.

- Aconteceu alguma coisa mais a frente. Está tudo parado – O coração de Pretty veio parar na boca. Assim como o almoço e o café da manhã também. Abriu a porta do carro e sente toda aquela comida subindo e chegando a garganta. Vomita. Tenta limpar com a manga da blusa e sai correndo, o motorista nem tenta impedir. Até acha melhor assim. Está na Rua 60. Mais quatro ruas apenas. Olha para o prédio ao longe e pensa em tudo que já fizeram juntos. Todas as vezes que saíram para comer fora. Todas as vezes que conversaram até de madrugada. Todas as conversas por telefone e pelo skype. O dia em que ele disse “Te Amo” e ela toda sem graça pra responder. Tenho um grande amigo, pensou. E está prestes a perder ele por que se afastou um pouco depois que arrumou um namorado. Namoro é uma das melhores coisas do mundo, desde que não atrapalhe uma sincera amizade. Pretty está com os calcanhares doendo, mas não desiste. Chegou a Rua 63.

Greg leva a gilete para a sala. Senta no sofá e olha para o pulso. É, está na hora de acabar com tudo, pensa. Grita.

- Está na hora de eu ir embora daqui. – Passa a gilete pelos pulsos. De leve, só para sentir que está afiado o suficiente para matar. A sensação do metal afiado e cortante passando por cima do pulso é quase que anestésico para sua alma. E agora em êxtase e com um sorriso no rosto.

Pretty chega ao apartamento. Chorando ela implora para que o porteiro abra a porta. É caso de vida ou morte, grita ela. O porteiro assustado não sabe se abre ou chama a polícia, está sem reação, fica assim por uns dez segundos, o que obviamente parece uma eternidade para Pretty. Até que resolve deixá-la entrar. Sem tempo para agradecer, ela corre até a escada.

Greg nunca havia sorrido daquela forma. Está realmente fazendo o que já começara a pensar em fazer meses atrás. Quando sua vida se transformou em um verdadeiro inferno. Suspirou uma última vez. Ouve um grito vindo da escada que fica em frente a sua porta, mas não liga. Pega a gilete. É meu amigo, dessa vez iria ser forte.

Várias coisas passam pela cabeça de Pretty. Que agora angustiante sobe a escada. Pensa sobre o momento que decidiu se afastar um pouco de Greg por ele ser “pra baixo” demais e também por causar ciúmes bobos em seu namorado. Porém agora ela enxerga que Greg é especial. É diferente. Ela está tentando salvar ele agora, mas ele é uma pessoa que merece ser salva todos os dias. Pretty cai e dá um grito de dor, mas logo se levanta. E chega finalmente a seu destino. Chuta a porta. Correndo para a sala do apartamento. Grita.

- Não.

Você já salvou o seu Greg hoje?

Willpsk
Enviado por Willpsk em 25/07/2014
Reeditado em 25/07/2014
Código do texto: T4896163
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